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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Moraes manda substituir delegado de inquérito da PF que investiga Bolsonaro

Paulo Maiurino, diretor-geral da PF, e Felipe Leal, que conduzia inquérito que apura suposta interferência de Bolsonaro na PF. Investigação não se confunde com expedição especulativa - Reprodução
Paulo Maiurino, diretor-geral da PF, e Felipe Leal, que conduzia inquérito que apura suposta interferência de Bolsonaro na PF. Investigação não se confunde com expedição especulativa Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

27/08/2021 16h55

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Ai, ai, ai...

Atenção para o que vem agora porque estamos diante de um resquício da pré-história que nos jogou no buraco em que estamos. E há uma grande possibilidade de boa parte do que se noticiar a respeito sair pelo avesso.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito que apura supostas interferências do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal, conforme acusação feita pelo ex-ministro Sergio Moro, acaba de tornar sem efeito decisões tomadas pelo delegado Felipe Alcantara de Barros Leal, que conduzia a investigação, e de determinar a remessa dos autos a Paulo Maiurino, diretor-geral da PF, para que este designe um novo titular do caso.

Atenção! A decisão é de Moraes. Sem interferência de Maiurino. Tampouco, como se deve suspeitar, de Jair Bolsonaro.

MAS QUE DIABOS ACONTECEU?
O delegado Felipe Leal, como já chegou a ser noticiado na imprensa, aproveitou o inquérito para, ora vejam!, sem causa conhecida, promover uma espécie de devassa na gestão de Maiurino. "Mas de que tipo, Reinaldo? Alguma causa aparente para tal atitude?" Nenhuma!

Ele resolveu investigar por que o diretor-geral tomou decisões — como a substituição de determinados cargos de chefia — que fazem parte das atribuições normais de um... diretor-geral.

Ao determinar a devolução do inquérito, o ministro observou que ao menos 6 de 10 providências determinadas pelo delegado referem-se a fatos sem qualquer relação com o objeto inquérito, até porque posteriores às razões que determinaram a investigação original.

Então decide o ministro:
"Diante do exposto, TORNO SEM EFEITO o despacho nº 3630329/2021, e DETERMINO a imediata remessa dos autos ao Diretor Geral da Polícia Federal, PAULO MAIURINO, para, nos termos da Portaria nº 75/2015 - DICOR/PF, DESIGNAR nova autoridade policial e equipe, dentro do Grupo de Inquéritos do STF (GINQ/STF/DICOR), para assumir a continuidade das investigações objeto do presente inquérito".

É GRAVE E TEM DE ACABAR
É grave o que aconteceu. Estamos diante de ecos de batalhas passadas -- com desdobramentos ainda ativos --, que fizeram muito mal à PF, ao Ministério Público e ao Brasil.

O delegado Leal pertence às hostes do lavajatismo. Ele é, por exemplo, o autor de uma leitura muito, digamos, pessoal da perícia feita pela PF no material recolhido pela Operação Spoofing — que apreendeu as conversas hackeadas entre os procuradores da República e de um deles, Deltan Dallagnol, com Sergio Moro.

A perícia não encontrou sinal de adulteração. Num estranho relatório, Leal — que era, então, chefe do SINQ (Serviço de Inquéritos da Polícia Federal), preferiu afirmar que não se podia provar a autenticidade dos diálogos e ainda aproveitou para fazer digressões sobre o uso do que chamou de "provas ilegais", indo muito além de suas sandálias. Falou como se juiz fosse.

O SINQ é subordinado à Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado, que, depois da ascensão de Maiurino, passou para o comando do delegado Luiz Flávio Zampronha, um dos mais respeitados da PF. Ele substituiu o também lavajatista Igor Romário de Paula, íntimo de Sergio Moro e estrela da Lava Jato.

Para o lugar de Leal, então, Zampronha nomeou Leopoldo Lacerda, também visto na instituição como um nome técnico, sem vinculações de natureza política.

PRESTEM ATENÇÃO!
Fica muito fácil, nesse imbróglio, misturar alhos com bugalhos. Um inquérito não pode ser a porta aberta para o vale-tudo. É preciso que se tome muito cuidado, sobretudo, para que não sirva de instrumento para vinganças pessoais, para acerto de contas de grupos que se engalfinham nas corporações e para que não atenda a interesses oportunistas.

Fiquemos nesse caso: Moro acusou Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal. Uma investigação há de apurar ações do presidente, até a data da denúncia, que apontem — ou não — tal interferência.

Se, depois daquela acusação, houve mudanças na cúpula da PF, é um despropósito que se submetam as decisões do diretor-geral a um escrutínio para tentar justificar a acusação de Moro, ainda que tais ações não tenham relação com o que está sob investigação.

Há uma expressão latina para justificar esse tipo de comportamento, que designa um erro de lógica: "post hoc ergo propter hoc" — "depois disso, logo por causa disso". No caso em questão, como se vê, o que se buscava era submeter decisões do diretor-geral a especulações para ver se conseguiam pescar alguma coisa.

É uma variante do procedimento designado em linguagem penal de "fishing expedition". Trata-se de uma pesca predatória de supostas provas para tentar justificar uma tese que se tem de antemão.

Mais uma vez, Moraes toma a decisão correta.