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Criminosos contra ordem democrática não permanecerão impunes, diz Alexandre
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O ministro do STF Alexandre de Moraes, presidente do TSE, deu um recado muito claro na solenidade de diplomação de Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin, respectivamente presidente e vice-presidente eleitos: os golpistas não permanecerão impunes. Aqueles que atentaram e atentam contra a ordem democrática serão devidamente responsabilizados. Foi muito aplaudido.
Em um discurso sem ambiguidades, o magistrado disse o que tinha de ser dito: o regime não pode tolerar aqueles tentam solapá-lo. Observou, com correção, que as hordas fascistoides -- a expressão é minha -- começaram o seu trabalho de ataque às instituições pondo em descrédito a "mídia tradicional". Afirmou:
"Fruto de um pensamento antidemocrático e extremista, a utilização em massa das redes sociais foi subvertida para disseminar a "desinformação", o discurso de ódio, as notícias fraudulentas, as fake News. A utilização das redes sociais como instrumento democrático de acesso a livre manifestação de pensamento - surgido principalmente nas famosas 'primaveras democráticas' - foi desvirtuada por extremistas, no intuito de desacreditar as notícias veiculadas pela mídia tradicional. Os extremistas criminosos atacam a mídia tradicional para, desacreditando-a, substituir o livre debate de ideias garantido pela liberdade de expressão e pela liberdade de imprensa por suas mentiras autoritárias e discriminatórias. Coube à Justiça Eleitoral, estudar, planejar e se preparar para atuar de maneira séria e firme no sentido de impedir que a "desinformação" maculasse a liberdade de escolha das eleitoras e eleitores e a lisura do pleito eleitoral."
O diagnóstico está absolutamente correto. O ataque ao jornalismo profissional se constituiu num dos pilares de sustentação das milícias digitais. Assim é no Brasil e mundo afora. Põe-se em descrédito a apuração jornalística para que se possam, então, vender fantasias no ambiente do vale-tudo das redes sociais. O mais desastroso é que, dados os propósitos a que se destina esse trabalho criminoso, ele pode ser acusado de tudo, menos de ineficaz.
A Justiça Eleitoral, com efeito, atuou dentro do que lhe era possível fazer. Coibiu muita sujeira. Mas também muita coisa ficou por ser feita porque é preciso dotar o sistema de mais instrumentos para coibir o crime.
ATAQUE AO JUDICIÁRIO
Disse ainda o ministro:
"Os ataques à Democracia e ao pleito eleitoral não se resumiram aos dois grandes pilares do Estado de Direito - liberdade de imprensa e sistema eleitoral. Concentraram-se de maneira vil e torpe nos ataques, ameaças e todo tipo de coação institucionais ao Poder Judiciário e pessoais aos seus membros, em especial no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal Superior Eleitoral. Seguindo a cartilha autoritária e extremista daqueles que, no mundo todo não respeitam a Democracia e o Estado de Direito, também no Brasil grupos organizados atacaram a independência do Poder Judiciário; disseminando "desinformação" e discurso de ódio contra seus membros e familiares, inclusive, ameaçando-os verbal e fisicamente. Esses extremistas, autoritários, criminosos não conhecem o Poder Judiciário brasileiro. O Poder Judiciário brasileiro tem coragem. O Poder Judiciário brasileiro tem força. O Poder Judiciário tem serenidade e altivez e manteve sua independência e imparcialidade, garantindo o respeito ao Estado de Direito e realização de eleições limpas, transparentes e seguras, concretizando mais uma etapa na construção de nossa Democracia."
Os cães digitais não avançaram apenas contra a imprensa e o sistema eleitoral. Desde o princípio, e isso remonta ainda à campanha eleitoral de 2018, o Poder Judiciário foi transformado em alvo, especialmente o Supremo Tribunal Federal. Convém lembrar que Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, na campanha eleitoral de há quatro anos, especulou sobre a fechamento da Corte, afirmando que bastavam para tanto um cabo e um soldado, sem nem precisar de um jipe. E indagava se o tribunal teria a coragem de pôr freios em Bolsonaro. Mais: a primeira manifestação escancaradamente golpista, que já cobrava o fechamento do Supremo, data de maio de 2019. O Inquérito 4.781, corretamente aberto de ofício, é de março daquele ano. A indústria de difamação do Poder Judiciário estava já em plena atividade.
E Moraes, então, deixou claro: não haverá impunidade:
"Nas eleições de 2022, a presente diplomação tem um duplo significado, pois, além do reconhecimento da regularidade e da legitimidade da vitória da chapa do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do vice-Presidente Geraldo Alckmin; essa diplomação atesta a vitória plena e incontestável da Democracia e do Estado de Direito contra os ataques antidemocráticos, contra a desinformação e contra o discurso de ódio proferidos por diversos grupos organizados que, já identificados, garanto serão integralmente responsabilizados. Para que isso não retorne nas próximas eleições. Senhor presidente eleito, a atividade política deve ser realizada sem ódio, sem discriminação e sem violência. A consequência do ódio e da violência é o 'vazio e a mágoa', como alertou Martin Luther King em seu famoso discurso 'O Nascimento de uma nova Nação', proferido em Montgomery, em abril de 1957, e festejando que 'a consequência da não-violência é a criação de uma comunidade querida. A consequência da não-violência é a redenção. A consequência da não-violência é a reconciliação".
Impecável. O custo da impunidade é vermos as cenas grotescas contra a institucionalidade e em favor do golpe se repetirem. Deixar impunes os criminosos corresponde a normalizar a arruação, a pregação golpista e a sabotagem ao regime de liberdades.
A reconciliação de que fala o ministro — e que tem de ser buscada pelos homens públicos — não passa pela condescendência com o banditismo. Ela pressupõe, de maneira inegociável, o reconhecimento das regras do jogo, que estão definidas no texto constitucional.
Na democracia, não existe o direito de delinquir. Os que escolhem esse caminho têm de arcar com as consequências. Tolerância não se confunde com irresponsabilidade e com impunidade.