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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Extremistas tentam ligar PCC a PT e Lula, cujo governo combate o PCC!!!

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Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

22/03/2023 16h53

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É nauseante, mas não surpreendente, que a extrema direita — e isso inclui Jair Bolsonaro, Deltan Dallagnol e o próprio Sergio Moro — busquem associar, de forma direta (Bolsonaro e Dallagnol) ou indireta (o próprio ex-juiz), o tal plano do PCC para matar e sequestrar autoridades. Entre os alvos, estariam o agora senador do União Brasil (PR) e Lincoln Gakiya, promotor de Justiça de SP. O alerta inicial foi feito pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo, no fim de janeiro. E a Polícia Federal entrou no caso.

A "Operação Sequaz" busca cumprir 24 mandados de busca e apreensão, sete de prisão preventiva e quatro de prisão temporária em Mato Grosso do Sul, Rondônia, São Paulo e Paraná. Enquanto escrevo, nove já foram presos — seis homens e três mulheres. Até agora, não foram divulgados outros supostos alvos, além de Moro e Gakiya. No que respeita ao político do Paraná, o ataque seria uma retaliação a transferências de um presídio para outro de líderes da facção, que ele teria determinado quando ministro da Justiça, ainda em 2019.

No Twitter, Bolsonaro tentou pegar carona, como vítima, na operação. Estabeleceu uma suposta conexão entre a morte de Celso Daniel, a facada que levou e a operação de agora, batizada de Sequaz. E concluiu que tudo isso compõe uma conspiração da esquerda. Dallagnol, com espantosa irresponsabilidade —, demonstrando que, como deputado, adota o padrão moral e ético que exibia como procurador —, também associa de maneira explícita o plano atribuído ao PCC a supostos vínculos do PT com a organização criminosa.

E, no entanto, a verdade está precisamente no avesso. A Polícia Federal tem autonomia, mas é subordinada ao Ministério da Justiça. A deflagração da operação no dia seguinte a uma frase infeliz de Lula — disse que, quando preso, ainda ressentido, pensava em "foder Moro" — prova justamente o contrário do que os extremistas estão afirmando. Que se note, e já tratei especificamente no caso no programa "O É da Coisa", a fala do presidente evidenciava justamente que ele havia superado, na própria cadeia, a fase do rancor. Inferir qualquer vínculo entre aquela fala e o dito plano é de uma canalhice inominável. É coisa de quem não se importa, se preciso, em incendiar o país e empurrá-lo para uma crise. Esse espírito, no fim das contas, está na raiz dos ataques de 8 de janeiro.

E não que a fala de Lula tenha sido prudente, ainda que seu ressentimento fosse justificável. Foi condenado sem provas, o que o impediu de se candidatar. Mesmo na cadeia, liderava as pesquisas de opinião. A atuação conjugada da força-tarefa, em que Dallagnol dava as cartas, com um juiz incompetente e parcial preparou o terreno para a ascensão de Bolsonaro. A reação de Dallagnol, nesse caso, explana, mais uma vez, o rigor profissional com que ele cumpria a sua tarefa de agente do Estado. Revela-se com nitidez incontrastável que se tratava de uma ação de cunho político, como noticiou a Vaza Jato. Não por acaso, o juiz do caso é hoje senador, depois de ter servido de ministro da Justiça àquele que só se elegeu porque o então magistrado condenou o concorrente. E o procurador que dava as cartas na operação é deputado federal. Nessa condição, segue tendo a mesma seriedade exibida como procurador...

O ministro Flávio Dino, da Justiça, diz que soube das ameaças há 45 dias. Ao participar de um evento na Associação dos Advogados de São Paulo, afirmou a respeito da exploração política do caso:
"Fico espantado com o nível de mau-caratismo de quem tenta politizar uma investigação séria, que é tão séria que foi feita em defesa da vida e da integridade de um senador que é oposição ao nosso governo". Segundo o ministro, e isto é óbvio, a ação demonstra que "não há nenhum aparelhamento do Estado, nem a favor, nem contra ninguém".

O ministro diz ainda que as acusações levianas acabam colaborando com a organização criminosa. E ele tem razão. Observem: segundo o que se sabe até agora, Moro era um dos alvos, não "o" alvo. Além do senador e do promotor Lincoln Gakiya, várias autoridades e pessoas ligadas à repressão ao crime estavam entre os alvos.

MUDANÇA DE PADRÃO
Se tudo se deu e se dá como se anuncia até agora, o país pode estar diante de uma escalada das ações do PCC que busca atingir o Estado. Notem: ações criminosas e seus autores, como sabem as polícias, têm um padrão. E esse caso não se encaixa nos métodos conhecidos do PCC.

A facção patrocina atos violentos contra rivais de ofício, dentro de seu esforço de verticalizar o mundo do crime, reivindicando, vamos dizer, a governança última das organizações de sua mesma natureza. Também há acertos de conta, estes mais raros, com policiais, mas nunca da hierarquia das polícias, ainda que ameaças existam. Para tanto, podem, como se diz, tocar o terror. Já vimos isso em São Paulo. E, tudo indica, no Rio Grande do Norte. No mais, que se saiba, a facção impõe uma espécie de "ordem do crime" em áreas em que atua para tentar manter distantes as forças policiais.

Se tudo for como se noticia agora, a maior e mais organizada e enraizada facção criminosa do país estaria optando por cruzar uma linha e atingir, de maneira deliberada, o Estado como ente. "Vinculação com o PT?" Ora, é o governo petista que está fazendo o enfrentamento. A propósito: no Rio Grande do Norte, consta, o PCC se uniu a um tal Sindicato do Crime para tocar o terror no Estado, governado, diga-se, pelo PT — o que, obviamente, bom para o partido não é.

DIFERENÇA ENTRE REPÚDIO E CANALHICE
Que adversários de Lula repudiassem a fala desta terça em entrevista ao vivo à TV 247, vá lá. É do jogo. O meu rancor, já afirmei, não teria passado. O de Lula, segundo ele me disse em abril de 2021, foi superado ainda na cadeia. A frase foi imprópria e imprudente, até porque seria tomada isoladamente e explorada ao limite. E isso começou a ser feito ainda ontem.

No dia seguinte — aí, sim, uma coincidência e tanto —, uma investigação de meses resultou na Operação "Sequaz", que apura ações que estariam sendo planejadas contra um grupo de pessoas, e Moro é um delas. Se o repúdio era parte do jogo democrático — com um caráter que suponho didático ao próprio Lula —, a tentativa de ligar o presidente e o PT à arquitetura criminosa deixa claro em que buraco foi jogado o país.

Reitero: sendo como se diz, a coisa é muito grave. Não obstante, Bolsonaro aproveita o caso para tentar fugir do escândalo dos diamantes, e Moro e Dallagnol usam a operação deflagrada pela Polícia Federal no governo Lula para atacar... Lula e seu partido. Estão ocupados em combater os criminosos ou em levar adiante, eles sim, uma vingança de natureza política?

A VÍTIMA DO ESTADO CONTAMINADO
Dadas todas as personagens que aparecem neste texto, a única que realmente foi vítima de grupos que se apoderaram do poder do Estado, seja na Justiça, seja no Ministério Público, foi Lula. Ele foi preso sem provas por um juiz incompetente e suspeito. Ele passou 580 dias na cadeia. Ele teve de lutar contra 18 procedimentos de investigação, que brotavam em cascata. Para registro: as anulações decididas pelo STF impactaram apenas quatro processos. Nos demais casos, ou foi absolvido, ou a investigação se extinguiu por falta de provas.

A verdade irrespondível, pois, é que é o governo Lula a enfrentar, então, o PCC, sendo tudo como dizem, na operação de agora. E também se confronta com a facção, no momento, no Rio Grande do Norte.

LEMBRANÇA FINAL A BOLSONARO
Quanto a Bolsonaro, uma lembrança para finalizar o texto: o ex-presidente e seu entorno mantiveram, sim, relações de amizade, quando menos, com o crime organizado. O miliciano Adriano da Nóbrega, condecorado pelo então deputado Flávio Bolsonaro, teve mãe e mulher empregadas no gabinete do chamado Filho Zero Um. Márcia, mulher de Fabrício -- o amigão do ex-presidente -- foi a Minas se encontrar pessoalmente com Raimunda Magalhães Veras, a mãe de Adriano.

Não consta que Marcola tenha sido condecorado por Lula ou alguém do seu entorno, não é mesmo?

O episódio só evidencia a máxima de Brecht, segundo quem "a cadela do fascismo está sempre no cio". Basta uma frase infeliz para que essa gente proponha de novo o vale-tudo. Não custa lembrar que, horas antes do ataque de 8 de janeiro, Moro acusou o governo Lula de perseguir seus opositores. E se referia precisamente àqueles que atacaram as respectivas sedes dos Três Poderes.

Que se investigue tudo. Até o fim. Que os criminosos paguem muito caro, nos limites da lei. E que a canalha que faz a exploração política do caso, também respondam por suas acusações mentirosas e irresponsáveis.