Reinaldo Azevedo

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Opinião

Os bruxos e as bruxas vão se jogar no caldeirão: Moody's eleva nota do país

A agência de classificação de risco Moody's colocou o Brasil a meio degrau do chamado "grau de investimento". Vamos ver.

Se você quiser uma amostra do apocalipse, não vai passar vontade. Basta se dedicar à leitura de parte considerável do jornalismo econômico, notadamente os colunistas enfezados — que contam sempre, na sua lista de consultores, com operadores de mercado de empresas de nomes esquisitos, algumas fundindo inglês, latim e idiomas ocultos —, que tentarão provar que o Brasil é governado por um idiota presunçoso e por um ministro da Fazenda cheio de esperanças vãs.

Mesmo quando fica claro que o país vai, por exemplo, alcançar a meta fiscal neste ano, que tem variação de 0,25 ponto para cima ou para baixo, esse clube de gênios decreta: "Mas não é assim que queremos". E lá vem uma entrevista com algum medalhão enricado, que posa de braços cruzados, ar severo, como a dizer: "Aqui está um homem seguro; comigo é batata: enforco aposentado com a tripa do trabalhador que ganha o salário mínimo. E chamarei de populista e ignaro qualquer um que discorde de mim". Além de severos, são sábios.

REMEMORO
1 - Lula tem, concluídos, um ano e nove meses de governo. As agências de classificação de risco já mexeram da nota de crédito do país quatro vezes, para melancolia dos anunciadores do caos. Querem apostar que haverá entrevistas nesta quarta de especialistas na própria opinião atacando a Moody's? Quem liga para o que dizem? Os que os ouvem... Em julho de 2023, a Fitch elevou a nota BB- para BB, com perspectiva estável.

O país estava encaminhando a reforma fiscal. Observou, então, a agência:
"A atualização [da nota do] do Brasil reflete um desempenho macroeconômico e fiscal melhor do que o esperado, em meio a sucessivos choques nos últimos anos, políticas proativas e reformas que a apoiaram e a expectativa da Fitch de que o novo governo trabalhará para melhorias adicionais".

2 - Em dezembro daquele ano, foi a vez de a S&P Global fazer a mesma coisa, com a mesma nomenclatura: de BB- para BB, também com trajetória estável. Justificou-se:
"Elevamos os ratings de longo prazo em escala global do Brasil após a recente aprovação de uma reforma tributária. Embora seja implementada gradualmente, a reforma representa uma revisão significativa do sistema fiscal e traduzir-se-á provavelmente em ganhos de produtividade a longo prazo". E apontou que as reformas estruturais refletem "um quadro institucional cada vez mais pragmático que ajuda a ancorar a estabilidade macroeconômica".

3 - Em maio deste ano, a Moody's surpreendeu os preditores do desastre colocando a nota em perspectiva positiva. E a grita começou. Observei à época que não tinha visto nada parecido. As agências reconhecendo os esforços que estavam sendo feitos pelo governo, e os sabichões daqui a gritar contra as agências. Escrevi neste UOL:
"Quando se leem os relatórios, todas elas apontam, sim, a preocupação com a questão fiscal, mas relevam também a importância do crescimento -- este mesmo que deriva de algumas medidas que os valentes daqui execram e tomam como exemplos do que não deve ser feito. Atentem para o crescimento do mercado imobiliário, com a retomada do Minha Casa Minha Vida -- aquele programa para o qual Bolsonaro havia reservado miseráveis R$ 36 milhões em 2023. A barbaridade foi corrigida a tempo.

Pare, Reinaldo, de usar a Fitch, a S&P Global e a Moody's como prova adicional de que se está no bom caminho..." É mesmo? Pesará sobre os ombros desses três entes menos responsabilidade do que sobre os dos furiosos nativos? Elas têm clientes do capitalismo global mundo afora; estes outros atendem a quem?"

Fez-se um verdadeiro lobby contra a Moody's, apontando que ela havia sido generosa demais; que o país não merecia o reconhecimento; que tudo não passava de um erro de análise etc. Um troço patético de gente patética.

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4 - A agência deu tanta bola para esses sábios que, nesta terça, decidiu elevar a nota do país, que passou de Ba2 para Ba1. O país está, pois, segundo essa classificação, a apenas um degrau de se tornar grau de investimento. Ou a meio, já que, junto com a elevação, veio a perspectiva positiva. Há uma boa chance de Lula repetir o seu próprio feito: na S&P e na Fitch, o país ganhou o selo de bom pagador, pela primeira vez na história, em 2008; na Moody's, em 2009. Perdeu essa condição nas três em 2015. Embora, é bom notar, nunca tenha havido o menor risco de calote nesse tempo. Mas essa é outra história.

OS MOTIVOS
E por que elevou? Agência vê:
- melhora importante do crédito;
- crescimento mais robusto do PIB;
- histórico de reformas.

E a tal dívida explosiva? A agência afirma:
"um crescimento mais robusto e uma política fiscal com adesão consistente ao arcabouço fiscal permitirão que a carga da dívida se estabilize no médio prazo, embora em níveis relativamente alto".

Sobre o crescimento, antevê:
"Nos próximos anos, antecipamos que o crescimento continuará abrangente, com a demanda interna impulsionada por um mercado de trabalho relativamente forte - em comparação com o passado do Brasil - e por salários reais mais altos".

Mas isso não vai levar a meta fiscal para o brejo, como dizem os bruxos e as bruxas? Não é o que vê a Moody's:
"O desempenho fiscal e o orçamento do governo apresentado para o próximo ano permaneceram consistentes com as metas fiscais."

A agência aponta ainda um fator para o qual se dá pouquíssima atenção no noticiário: a transição energética será fonte de atração de investimentos no médio e no longo prazos.

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E por que a perspectiva positiva? Porque, afirma, o crescimento econômico e o cumprimento do arcabouço fiscal devem reduzir as incertezas sobre a trajetória da dívida.

Pois é... Outra linha divertida do "articulismo" é a das "ilusões perdidas"; do "poderíamos ter sido e não fomos" porque Lula atrapalha tudo... Mas só com ele o país recebeu o selo de "bom pagador". Fazer o quê?

REAÇÃO DE HADDAD
O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, saiu soltando foguete? Não é o seu estilo. Lembrou que muita coisa há a ser feita; que às vezes há tropeços, mas ponderou:
"O importante é a gente reconhecer que tem um caminho a ser trabalhado e se, porventura, algo sai um pouco do roteiro estabelecido, nós temos toda a liberdade de rever para melhor".

CAMINHANDO PARA A CONCLUSÃO
Estou colecionando artigos, já tenho um monte, anunciando a ruína do país. Todos com a chancela de ditos "especialistas". Como não sou um deles e não tinha nem tenho a tarefa obrigatória de detratar o trabalho que está em curso, tenho apontado avanços em meio a percalços. Como entendo mais de advérbios do que de economia, dou-me o direito de me espantar com o modo em que opera essa turma. E tenho um olhar atento -- como sou ingênuo, coitado de mim! -- para as razões que levaram o país pela terceira vez à elevação da nota.

As agências apontam as reformas, inclusive a tributária, e o arcabouço fiscal. E olhem como foi difícil levar a tarefa adiante, com um Congresso, digamos, "complicado", para ser econômico no adjetivo. Mas não só: também contam o crescimento econômico e o mercado de trabalho, que são ativos num país das dimensões do Brasil. E é precisamente aí que os "gênios" veem um problema muito grave. As agências têm visto a solução... Todas elas serão fechadas. Em seu lugar, entrarão os nossos especialistas em maledicência econômica a serviço de empresas com nomes estranhos...

Numa entrevista brilhante ao podcast "Reconversa", que foi ao ar no dia 28 de maio, o economista Paulo Gala sintetizou:
"O gasto fiscal brasileiro vem porque a carência da sociedade brasileira é tão gigantesca! Mais de R$ 300 bilhões são saúde e educação. Oitenta por cento dos atendimentos médicos do país são do SUS. Oitenta por cento das matrículas do ensino básico e médio são da rede pública. Ou seja: se tirar os R$ 300 bilhões da saúde e da educação, não tem saúde educação no Brasil. No Bolsa Família, 35 milhões de pessoas custam R$ 160 bilhões por ano, mais benefício da prestação continuada... Tudo isso é um gasto social essencial, a meu ver, mas que injeta a pressão e que está fazendo a economia brasileira girar. Se ela está girando, se o país está crescendo, se o desemprego está baixo e se vem pressão de demanda, eventualmente vem inflação. E, se vem inflação, o Banco Central reage. Mas é esse mecanismo que cobra um preço em termos de juros mais alto, não a dívida. Tanto é que o Brasil está prestes a virar grau de investimento".

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E vai virar.

PS: Como é mesmo, Paulo Guedes? Se Lula vencesse, o Brasil seria uma Argentina em seis meses e uma Venezuela em um ano e meio, não é isso?

PS2 - Lula e Haddad se encontraram com as agências em Nova York no último dia 23. Pelo visto, a conversa foi boa. Esse Lula...

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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