Exacerbação reacionária: pedido de cassação de Glauber Braga é inaceitável
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Desequilibrado, exagerado e ideológico. E outra penca de adjetivos se poderia juntar ao parecer do deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), que pede a cassação do mandato do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), aprovado no Conselho de Ética por 13 a 5. No dia 16 de abril do ano passado, Braga se desentendeu com Gabriel Costenaro, um militante do MBL, e o chutou nas dependências da Câmara. É evidente que não endosso a reação do deputado.
Acho, sim, que ela é incompatível com o decoro parlamentar. Mas esperem aí: antes da cassação, existem outras punições possíveis, duas bem gravosas: censura verbal ou escrita; suspensão de prerrogativas regimentais e suspensão do exercício do mandato por até seis meses. As duas últimas, a exemplo da cassação, só podem ser aplicadas com o apoio da maioria absoluta da Câmara.
Existem, mesmo quando se trata de aplicar um Código de Ética, os delitos e as penas, não? As transgressões e as sanções devidas. Não é segredo nenhum que Costenaro costumava então — não o acompanho e não sei se continua — assediar pessoas ou militantes de esquerda com provocações, enquanto outra pessoa filmava a abordagem. Acho a prática detestável e incivilizada e sempre a critiquei, também quando empregada, em passado remoto, por militantes de esquerda. De resto, o deputado, que ainda pode recorrer da decisão do Conselho à Comissão de Constituição e Justiça, era um alvo constante desse rapaz.
Costenaro, filiado ao Partido Novo, não conseguiu se eleger vereador no Rio no ano passado. Obteve apenas 12.018 votos. O entrevero com o parlamentar do PSOL se deu no âmbito de sua campanha. A denúncia ao Conselho de Ética foi feita pelo seu partido. Pois é...
O PARTIDO NOVO, A ÉTICA E O CRIME
Em matéria de decoro, o Novo tem dado muitas lições sobre o que não fazer. No dia 27 de março, o deputado Marcel Van Hatten (RS), por exemplo, afirmou o seguinte na tribuna da Câmara:
"Lula é cruel. Alexandre de Moraes é cruel. São covardes. Lula e Alexandre de Moraes são covardes. Digo mais: o que estão fazendo no STF hoje é coisa de mafioso. E não é só o Alexandre de Moraes por isso. A máfia depende de uma organização. E a organização que hoje está no STF é mafiosa..."
Eis aí um exemplo notável de decoro... A despeito da questão de natureza criminal, que não me parece coberta pela imunidade parlamentar (mas o debate fica para outra hora), trata-se de uma transgressão explícita ao Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara.
A sessão de ontem foi tumultuada. Glauber anunciou greve de fome — o que sempre me parece excessivamente dramático e pouco prático — e acusou o deputado Arthur Lira (PP-AL) de articular a cassação, o que o ex-presidente da Casa nega, sugerindo que vai processar o psolista. Vamos ver. Em vez de ficar sem comer, talvez fosse mais efetivo ao deputado do PSOL evidenciar os entreveros anteriores com o tal Costenaro.
Por que vejo, sim, um viés puramente ideológico nessa votação? Alguns dos patriotas que se manifestaram abertamente contra Glauber e que votaram a favor do relatório para cassá-lo são notórios defensores da impunidade para golpistas. Defendem, assim, a anistia para quem depreda as respectivas sedes do Supremo, do Congresso e da Presidência com o intuito de derrubar o presidente, mas acham que merece a cassação de mandato quem se desentende com um notório provocador — ainda que o parlamentar tenha ido além do aceitável, sim, merecendo uma punição, mas não, evidentemente, a cassação.
A propósito: se a questão chegar a plenário para que os deputados decidam, como vocês acham que votará o deputado Gilvan da Federal (PL-ES), por exemplo? É aquele que confessou ter relatado um projeto para desarmar os seguranças do presidente da República, apostando que, assim, aumentam as chances de ele morrer. Admitiu que atua para produzir esse resultado. Nas suas palavras:
"Por mim, eu quero mais é que o Lula morra. Eu quero que ele vá para o quinto dos infernos. É um direito meu. Não vou dizer que eu vou matar o cara, mas eu quero que ele morra, que vá para o quinto dos infernos. Porque nem o diabo quer Lula. É por isso que ele está vivendo aí, superou o câncer... Tomara que tenha um ataque 'cardia" [quis dizer "cardíaco]. Porque nem o diabo quis essa desgraça desse presidente, que está afundando nosso país. E eu quero mais é que ele morra mesmo! E que andem desarmados. Não quer desarmar o cidadão de bem? Que ele ande com o seu segurança desarmado".
Outro valente do PL, Gustavo Gayer, chegou a comparar uma ministra de Estado a garota de programa e especulou sobre um trisal que envolveria seu marido e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União). É nesse ambiente que muitos bravos da República querem cassar o mandato de Glauber Braga.
Advirto, caminhando para o encerramento, que, a depender do que aconteça, a vida dos senhores deputados pode virar um inferno. Se o psolista for cassado — e se trata de uma Câmara, na média, de conservadora para reacionária —, a rotina, quem sabe a reputação, de todos os parlamentares estará em risco. Agentes provocadores podem se multiplicar apostando que o importunado cometerá um erro, como Glauber cometeu.
Cassar o deputado do PSOL será um caminho seguro para que a anarquia se instale na Câmara.
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