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Testemunha relata encontros frequentes entre Mizael e Evandro antes da morte de Mércia

Cláudia e Márcio, irmãos de Mércia (em primeiro plano), chegam para audiência; VEJA MAIS FOTOS - Rivaldo Gomes/Folhapress
Cláudia e Márcio, irmãos de Mércia (em primeiro plano), chegam para audiência; VEJA MAIS FOTOS Imagem: Rivaldo Gomes/Folhapress

Arthur Guimarães

Do UOL Notícias <BR> Em Guarulhos (SP)

18/10/2010 17h44Atualizada em 18/10/2010 19h28

O frentista Jurandi da Silva, testemunha no processo sobre a morte da advogada Mércia Nakashima, afirmou que presenciou diversos encontros entre Evandro Bezerra da Silva e Mizael Bispo de Souza dias antes do desaparecimento da vítima. Os dois são acusados pela morte de Mércia. Jurandi trabalhava com Evandro no posto Auto Posto Rio Real, em Guarulhos (SP), onde os dois supostamente se encontravam.

As afirmações da testemunha foram feitas nesta segunda-feira (18), na primeira audiência judicial sobre a morte de Mércia. Segundo Jurandi, os encontros entre Mizael e Evandro tornaram-se mais frequentes e demorados nas datas mais próximas ao desaparecimento de Mércia.

O frentista relatou que os dois ficavam conversando dentro do carro de Mizael durante até uma hora. Ainda segundo Jurandi, após o sumiço da advogada os encontros nunca mais ocorreram.

Antes do frentista, quem depôs foi Bruno da Silva Oliveira, guardador de carros do hospital geral de Guarulhos. Ele confirmou ter visto Mizael deixar o carro no estacionamento da unidade de saúde por volta de 18h do dia 23 de maio e retirá-lo às 22h. As informações atestam a versão da polícia de que o suspeito teria deixado o carro no hospital, pegado carona em outro veículo e viajado até a represa de Nazaré Paulista (SP), onde Mércia teria sido morta.

Testemunha sigilosa
O primeiro dia de audiência terminou com uma testemunha sigilosa. Por um pedido do interrogado, a sala em que acontecia a audiência foi esvaziada e apenas os advogados permaneceram no local.

Apesar do segredo, tudo indica que a testemunha é o pescador que afirmou às autoridades policiais ter ouvido gritos de uma mulher e ter visto um carro sendo empurrado para dentro da represa onde o corpo de Mércia foi encontrado. O pescador seria a única testemunha ocular do crime, segundo a versão da polícia. A reconstituição do caso, aliás, usou como base os relatos do pescador.

Depoimento da irmã
A primeira pessoa a ser ouvida nesta segunda-feira foi a irmã de Mércia, Cláudia Nakashima. Ela pediu que Mizael e Evandro deixassem a sala durante seu depoimento.

Convocada pela acusação, Cláudia contou que sua irmã vivia um relacionamento repleto de atritos com Mizael. “Ele era muito ciumento, não deixava a Mércia conversar com ninguém. Era muito grosso”, disse.

Segundo ela, depois que o réu perdeu a eleição de 2008, na qual disputava um cargo de vereador em Guarulhos (SP), o desgaste entre o casal piorou. Cláudia disse não saber o motivo de tal mudança, pois sua irmã era muito “reservada” e tinha “medo” de falar de seus problemas com o então namorado, mas afirmou que a derrota teria sido um marco para os problemas na relação. “Desde então, ela tinha ódio dele. No final, só piorou”, relatou ao juiz Leandro Jorge Bittencourt Cano.

Ameaças
Foi ouvido também o irmão de Mércia, Márcio Nakashima, que ressaltou que sua família vem recebendo uma série de ameaças.

“É um excesso de coincidências”, disse, ao afirmar que seus parentes recebem telefonemas anônimos com ameaças e enfrentam outros acontecimentos suspeitos. Ele contou, por exemplo, que recentemente bateram em seu carro quando ele andava por Guarulhos (Grande São Paulo) e, na ocasião, o motorista do outro veículo foi agressivo. Mais tarde, Márcio descobriu que o rapaz era um policial militar que trabalhava na cidade, assim como Mizael.

Além disso, o irmão lembrou que seu tio, que tem uma barraca em uma feira de Guarulhos, teve sua banca revirada e destruída por desconhecidos. “Agrediram meu tio e não levaram nenhuma moeda”, disse ele, insinuando que tais acontecimentos seriam uma tentativa de calá-lo e desincentivá-lo a prosseguir investigando a causa da morte da irmã.

Ele assumiu que não concordava com o relacionamento de Mércia com Mizael, mas disse que respeitava a posição da irmã. Ele explicou ao júri que Mizael era extremamente ciumento e tratava sua irmã com tom ríspido.

Márcio disse ainda que, apesar da inimizade com Mizael, inicialmente não queria acreditar que o ex-namorado de sua irmã poderia ser o autor do crime. “Achava que era um sequestro”, contou ele. Por conta disso, a família chegou a circular por favelas da região pedindo informações para pessoas que se identificavam como traficantes líderes do crime organizado nesses bolsões. Com o tempo, as evidências o fizeram mudar de opinião, afirma.

Mostrando que tem convicção de que Mizael foi o autor da execução de sua irmã, Márcio usou de ironia para responder ao advogado do réu, Samir Haddad Jr.Samir, que perguntou: “Você já ficou algum tempo sem conversar com a Mércia por causa de algum problema relacionado com o Mizael?”. Márcio respondeu: “Sim, desde o dia 23 de maio”, dia em quem ela desapareceu.

O advogado chegou a reclamar da ironia para o juiz, que pediu que ele refizesse as perguntas.

Depoimento do investigador
O investigador Alexandre S. Silva, policial do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), que também depôs nesta segunda-feira, revelou detalhes e bastidores de todo rastreamento telefônico feito nos celulares de Mizael e Evandro Bezerra da Silva.

Uma das informações mais importantes relatadas é a de que nas semanas anteriores ao desaparecimento de Mércia, das 41 ligações que aconteceram entre ela e Mizael, a maioria foi feita pela advogada. A informação difere da afirmação da família da vítima, que diz que era ele quem a procurava constantemente.

O caso
Mércia foi vista pela última vez no dia 23 de maio da casa dos avós em Guarulhos. Foi encontrada morta em 11 de junho na represa de Nazaré Paulista. Segundo a perícia, a advogada foi agredida, baleada, teve a mandíbula quebrada e morreu afogada dentro do próprio carro no mesmo dia em que sumiu.

Para o Ministério Público, Souza matou a ex-namorada movido por ciúmes, e o vigilante Evandro Bezerra Silva o ajudou na empreitada criminosa. O promotor alegou que as provas determinantes para o convencer da autoria do crime foram a quebra do sigilo telefônico e os depoimentos contraditórios de Souza. O ex-policial tinha um celular, registrado em nome de terceiros, em que conversou 16 vezes com o suposto comparsa no dia estimado do crime. Além disso, a polícia descobriu que, sempre que falava com o vigia, voltava a ligar para a ex-namorada.

Um laudo pericial reforça a suspeita sobre Souza ao apontar a presença de uma alga, que seria compatível com alga presente na represa, em seu sapato. Além da alga, foram encontrados na sola do sapato resíduos de chumbo compatíveis com a bala que feriu Mércia, uma mancha de sangue e um pedaço de osso. Souza nega as acusações.