Carlos Madeiro

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Reportagem

Condomínio gigante põe Lençóis Maranhenses em risco: 'Danos irreversíveis'

A construção de um condomínio clube de alto luxo a apenas 200 metros de dunas do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, no município de Santo Amaro (MA), gerou preocupação de entidades e autoridades, que tentam barrar a obra. O caso foi parar na Justiça.

O projeto "Terra Ville Residence", que iniciou obras este ano, tem 102 mil m² e oferece 232 lotes residenciais em um condomínio com 22 equipamentos de lazer. Cada lote à venda tem o mínimo de 300m² (com preço acima de R$ 180 mil, cada um) e permite a edificação de até dois pavimentos. Além disso, o projeto tem uma construção com três andares com heliponto e equipamentos.

A obra teve licenciamento dos governos municipal e estadual, que são agora questionados pelo MPF (Ministério Público Federal).

A denúncia da ilegalidade da obra foi feita pelo ICMBIo (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) — responsável pelo Parque — e pelo Conselho Municipal do Turismo, que mandou a primeira nota técnica com denúncia em janeiro de 2024.

A consolidação desse empreendimento abrirá precedentes para que toda a margem do campo de dunas, sob a competência do município e dentro da Zona de Amortecimento do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, seja tomada por outros empreendimentos e construções com gabarito de 3 pavimentos ou mais, acarretando na ocorrência de danos ambientais irreversíveis.
Conselho Municipal do Turismo

Localização do projeto ao lado dos Lençós Maranhenses
Localização do projeto ao lado dos Lençós Maranhenses Imagem: Reprodução/Google Earth

Já o ICMBio informou que, por conta do empreendimento estar em área de amortecimento, o órgão deveria ter sido consultado para licenciamento. Uma nota técnica do órgão afirma que haverá especulação imobiliária e ocupação desordenada da área.

A presença de um condomínio com 232 lotes residenciais a pouco mais de 200 metros do campo de dunas irá inviabilizar o controle e monitoramento da visitação. Serão centenas de veículos com acesso descontrolado ao parque, eventualmente conduzidos por motoristas sem treinamento ou sem habilidade necessária para transitar no campo de dunas, aumentando significativamente o risco de acidentes.
ICMBio

Ação na justiça

Diante dos argumentos, o MPF entrou com ação no último dia 18 de outubro pedindo uma liminar para a obra ser parada e a determinação para que seja demolido que já foi feito irregularmente. Ainda não decisão.

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Para o órgão, o condomínio urbaniza uma área que deve ser, por lei, rural.

A implantação do loteamento, com a construção de centenas de unidades habitacionais, arruamentos e infraestrutura urbana característica de um bairro, conduzirá a um estado de coisas de difícil reparação, com custo econômico elevado, a ser suportado pela parte requerida e com impactos a terceiros, medidas de difícil execução.
MPF na ação

Segundo o projeto, o local terá "infraestrutura completa com abastecimento de água, rede de esgoto, eletricidade, pavimentação e iluminação pública."

Heliponto e área de lazer de condomínio projetada para o lado dos Lençóis Maranhenses
Heliponto e área de lazer de condomínio projetada para o lado dos Lençóis Maranhenses Imagem: Divulgação

Na investigação, o MPF aponta que houve ausência de análise de impactos ambientais. O licenciamento do empreendimento foi considerado insuficiente por não descrever os impactos sobre o parque. Além disso, órgãos públicos teriam desconsiderado a zona de amortecimento.

Na ação, o procurador Alexandre Silva Soares alega que o condomínio trará diversos prejuízos ao ecossistema.

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Segundo o MPF, a zona de amortização deve servir como área de transição entre o parque e as áreas urbanizadas. "Essa urbanização comprometeria a função ecológica da zona de amortecimento, que é proteger o parque dos impactos negativos das atividades humanas", diz a ação.

Como o condomínio prevê uma edificação de três andares, isso também causaria uma alteração significativa na paisagem local, impactando negativamente a experiência dos visitantes do Parque.

Além disso, se levado à frente, o condomínio criaria um "ambiente propício para novos empreendimentos semelhantes", o que na visão do MPF poderia levar a um processo de especulação imobiliária e à urbanização descontrolada da zona de amortecimento.

Lençóis Maranhenses
Lençóis Maranhenses Imagem: Arquivo pessoal

Procurada, a Sema (Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Naturais do Maranhão) assegurou que o processo de licenciamento "foi conduzido com rigor e em total conformidade com as legislações ambientais federais e estaduais, de forma a evitar qualquer interpretação equivocada das normas."

Alega que o empreendimento está "fora dos limites do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses" e é classificado como de "médio impacto ambiental, o que exige apenas a comunicação ao ICMBio, procedimento que foi devidamente realizado."

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Procurada, a Prefeitura de Santo Amaro não quis se pronunciar. A certidão de aprovação de loteamento foi dada em agosto de 2023

Lotes de condomínio que deve ser feito ao lado dos Lençóis Maranhenses
Lotes de condomínio que deve ser feito ao lado dos Lençóis Maranhenses Imagem: Divulgação

Chefe do parque preocupada

A chefe do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, Cristiane Ramscheid, diz ver com preocupação o projeto. "Uma zona de amortecimento, dentro da legislação ambiental, não pode ser transformada em uma zona urbana", reforça.

"Esse é um primeiro empreendimento desse porte no entorno dos campos de dunas dos Lençóis Maranhenses em Santo Amaro, em uma região que é área rural. A transformação em área urbana pode causar impactos. A importância do licenciamento ambiental é impedir ou mesmo reduzir as situações negativas", diz.

Cristiane afirma que é possível fazer um condomínio, mas o projeto precisa ser adequado a zona de amortecimento do parque.

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A grande questão desse empreendimento é a intensidade da área ocupada. Seria possível a construção na zona de amortecimento, mas com imóveis de características rurais, não com essa quantidade de lotes, pessoas, veículos, esgotamento sanitário, infraestrutura urbana. É uma ocupação inadequada para a zona onde ela está inserida.
Cristiane Ramscheid

O UOL tentou, pelo contato disponível no Instagram do condomínio, falar com a construtora responsável, mas não obteve resposta. No sistema judicial, não aparece quem está na defesa do caso. O espaço está aberto para manifestação.

Reportagem

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