1 em cada 3 presos não é condenado à cadeia ao fim do processo, diz estudo
As prisões provisórias, feitas durante a fase de inquérito e/ou trâmite do processo penal, decretadas por juízes não são garantia de cadeia ao final do processo e, muitas vezes, acabam revelando-se injustas. Essa é uma das principais conclusões da pesquisa “A aplicação de penas e medidas alternativas no Brasil”, divulgado nesta quinta-feira (27) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e pelo Ministério da Justiça.
Há dois tipos de prisões decretadas antes do julgamento. A prisão temporária, que só existe para a fase de inquérito policial e pode durar no máximo cinco dias, ou 30 dias para caso crimes hediondos --ambas podendo ser renovadas por igual período. Já as prisões preventivas são aquelas em que o preso fica detido até o julgamento ou até uma nova ordem judicial que o liberte.
Segundo o levantamento, em 37,2% dos casos pesquisados em que os réus estiveram presos provisoriamente não houve condenação à prisão ao final do processo. Os pesquisadores consideraram "gravíssima" a constatação e alegam que falta a aplicação de penas e medidas alternativas para evitar o cárcere antecipado.
“Projetando esse achado para o gritante número de presos provisórios no país, que ultrapassou a marca de 240 mil pessoas em dezembro de 2013, é provável que tenhamos cerca de 90 mil homens e mulheres encarcerados que, por diversas razões, não serão condenados à prisão, na maior parte dos casos com sentenças de absolvição ou condenação a penas alternativas”, revela o estudo.
A pesquisa foi feita nas unidades da federação mais populosas e naqueles com maior taxa de homicídios: Alagoas, Distrito Federal, Espírito Santo, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo.
"Os dados colhidos nos processos de Varas Criminais atestam claramente que a prisão é a categoria central que estrutura o funcionamento do sistema de justiça criminal brasileiro. Inclusive, o alto número de prisões em flagrante convertidas em prisão provisória indica a importância de se implementar a Lei de Cautelares, que reafirmou a excepcionalidade da prisão preventiva", afirma o documento.
Tipos de condenação
Segundo o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública 2014, o número de presos no sistema prisional aguardando julgamento é de 215 mil, 40,1% do total de pessoas detidas. Não são levadas em contas as prisões sob custódia das polícias em delegacias.
Dos réus presos julgados, segundo a pesquisa do Ipea, 62,8% foram condenados a penas privativas de liberdade, enquanto 17,3% foram absolvidos. Os demais tiveram penas e medidas alternativas, além de prescrição.
O número de condenações à prisão é bem menor nos casos em que o réu não está preso: apenas um em cada quatro não são condenados à cadeia. De acordo com o estudo, a prisão provisória ocorre também por falta de estrutura e de assistência jurídica a muitos dos presos. “Verificou-se que a falta de uma defensoria ativa é um dos motivos que levam a que sejam mantidas as prisões cautelares, muitas vezes por delitos menores, como furtos simples, como furto de alicates de unha em lojas de departamento”, diz o relatório.
Cultura de prisão entre juízes
Para o pós-doutor em Justiça Penal Internacional da Universidade de Pavia, na Itália, e professor de direito processual penal da Universidade Federal de Alagoas Welton Roberto, apesar de a lei dar essa opção, os magistrados criaram um hábito de prender as pessoas suspeitas de crimes no país.
“O juiz criou essa cultura. Eles acham que são partes do aparato de segurança, quando na verdade não são. Aí tentam fazer das prisões um modelo de segurança pública. Assim, burlam garantias processuais, praticam atos contra a Constituição. Os juízes precisam se amoldar à lei, que passou por mudanças em 2008 e 2010, mas eles continuam aplicando a prisão como a regra primeira”, explicou.
O professor alega que as prisões cautelares que não terminam com penas de detenção acabam por criar um legião de excluídos "condenados" pela sociedade. “Você mexe na vida de mais de 200 mil famílias, o sujeito perde o emprego e depois disso dificilmente arruma outro. Com isso, você cria um universo de marginalizados, e que depois não têm pena no direito penal, mas tem a pena da própria sociedade”, afirmou.
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