Homicídios cometidos pela PM no RJ cresceram em 2014 pela 1ª vez desde 2007
Entre 2005 e 2014, o Estado do Rio de Janeiro registrou 8.466 homicídios decorrentes de intervenção policial. O ano com o maior número de ocorrências neste período foi 2007, com 1.330 mortes. Nos anos seguintes, este índice apresentou sucessivas reduções, chegando a 416 em 2013. No ano passado, no entanto, houve um salto de 39,4% no número dos chamados "autos de resistência" registrados no Rio em relação ao ano anterior --na capital, o aumento foi de 9%.
O dado é uma das diversas observações apresentadas no relatório “Você Matou Meu Filho”, lançado pela Anistia Internacional nesta segunda-feira (3). O documento é resultado de pesquisa e investigação sobre homicídios cometidos pela Polícia Militar na cidade do Rio nos últimos dez anos. A principal conclusão é contundente: a PM fluminense tem usado a força de forma "desnecessária, excessiva e arbitrária", desrespeitando normas e protocolos internacionais sobre o uso da força e armas de fogo.
O relatório também apresenta indícios, a partir do exame de casos, de que o registro de "homicídios decorrente de intervenção policial", os chamados "autos de resistência", é usado frequentemente para encobrir casos de execuções extrajudiciais. O procedimento é classificado no documento como uma “cortina de fumaça”.
Mesmo com a redução dos índices na última década, a Anistia Internacional considera no relatório o número de homicídios “demasiadamente elevados”. As vítimas de homicídios cometidos por PMs, de acordo a pesquisa, são em sua maioria homens, jovens e negros. A organização chegou a este perfil a partir da análise de dados detalhados do ISP (Instituto de Segurança Pública) do Estado, de 2010 a 2013.
Neste período, 99,5% das vítimas foram homens, 79% negros, e 75% jovens entre 15 e 29 anos. “Parcela da população que tem sido historicamente marginalizada e discriminada no país”, aponta o relatório.
Ao se debruçar sobre os dados oficiais disponíveis, a organização estimou que, em média, nos últimos cinco anos, homicídios cometidos por policiais representaram 16% dos assassinatos registrados na capital fluminense.
Para a Anistia, as mortes são resultados da “lógica da guera às drogas e do combate”. O relatório também cita o número de policiais mortos em serviço entre 2005 e 2014: 50 civis e 186 militares --uma média de 23 agentes de segurança assassinados por anos na última década.
A pesquisa também analisou a distribuição geográfica dos homicídios cometidos pela PM e identificou uma concentração de ocorrências nas zonas norte e oeste da cidade, “as áreas mais pobres”.
Ao longo do relatório, também são apresentados relatos de ameaças a moradores, testemunhas e defensores de direitos humanos, alteração das cenas dos crimes, invasões de domicílios, furtos e agressões físicas, entre outras irregularidades.
Para o historiador carioca e diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, o enfrentamento da criminalidade “não pode ser realizado violando o direito essencial à vida, inclusive dos policiais que também morrem nessa guerra”.
“Temos que avançar na construção de uma segurança pública que proteja a sociedade e garanta os direitos de todas as pessoas, independentemente de onde mora, idade ou cor da pele. Uma polícia que executa é incompatível com os princípios fundamentais dos direitos humanos e do estado de direito”, declarou Roque.
As UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), instaladas em favelas da cidade desde o fim de 2008, são consideradas como avanços na política de segurança pública, mas o documento destaca as “inúmeras denúncias de abusos por parte dos policiais militares dessas unidades, incluindo uso desnecessário e excessivo da força e execuções extrajudiciais”. A morte sob tortura do ajudante pedreiro Amarildo de Souza, na favela da Rocinha, em julho de 2013, é citada como um exemplo negativo.
Impunidade
O relatório critica a impunidade dos autores dos homicídios e classifica como omissa, falha e morosa a investigação dos homicídios decorrentes de intervenções policiais.
A pesquisa aponta, por exemplo, que dos 202 procedimentos administrativos dos homicídios decorrentes de intervenções policiais abertos pela Polícia Civil em 2011, apenas um resultou em denúncia por parte do MP-RJ (Ministério Público do Rio) contra os PMs envolvidos. Deste total, 183 ainda estavam em andamento em abril deste ano --"no limbo"-- e 12 foram arquivados.
Segundo a Anistia, os dados foram obtidos por meio de uma fonte da própria corporação e o ano de 2011 foi escolhido por se considerar que quatro anos seria tempo suficiente para que os casos fossem levados à Justiça.
O documento também apresenta 20 recomendações para combater a violência policial, direcionadas aos governos estadual e federal, ao Congresso Nacional e ao MP-RJ. As orientações também embasam petição internacional que reivindica medidas urgentes da instituição e do governo do Estado.
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