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Análise: "Alckmin utiliza PM como instrumento político"

PM publicou selfies em protesto contra Dilma, mas reprimiu ato contra aumento de tarifas - Arte UOL/Fotos Nelson Almeida/AFP e Divulgação/PM-SP
PM publicou selfies em protesto contra Dilma, mas reprimiu ato contra aumento de tarifas Imagem: Arte UOL/Fotos Nelson Almeida/AFP e Divulgação/PM-SP

Fabiana Maranhão e Wellington Ramalhoso

Do UOL, em São Paulo

13/01/2016 18h57Atualizada em 14/01/2016 16h23

A PM (Polícia Militar) lançou bombas e dispersou ainda na concentração, na avenida Paulista, o ato de terça-feira (12) marcado pelo MPL (Movimento Passe Livre) contra o aumento das tarifas de transporte em São Paulo. De acordo com o movimento, 28 pessoas ficaram feridas. A polícia deteve 13 pessoas. Para pesquisadores entrevistados pelo UOL, o governo Geraldo Alckmin (PSDB) usou a polícia como instrumento para reprimir a passeata e o movimento.

"Além de não ser preparada para lidar com protestos, a PM está sendo usada politicamente. Quando as manifestações estão em acordo com os interesses do governo estadual, são autorizadas. Quando não estão, são duramente reprimidas, com o objetivo de assustar as pessoas e matar [as manifestações] pela raiz”, afirma o filósofo Pablo Ortellado, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.

O governo estadual é responsável pelo sistema de transporte sobre trilhos da região metropolitana de São Paulo, composto pelo Metrô e pela CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). As tarifas das duas empresas subiram no último sábado (9) de R$ 3,50 para R$ 3,80, elevação idêntica à tarifa dos ônibus municipais de São Paulo.

Ortellado estuda os movimentos sociais e pesquisou as manifestações realizadas contra o governo Dilma Rousseff (PT) na avenida Paulista em 2015. Para ele, a PM trata os atos contra o aumento das tarifas de transporte de forma “profundamente diferente” de outras manifestações que acontecem na cidade.

Como exemplo de caso em que a Polícia Militar teve atitude amistosa com manifestações, o professor cita justamente os atos contra Dilma. Na ocasião, a própria Polícia Militar publicou selfies tiradas na rua com manifestantes, gesto que poderia ser visto como de simpatia pelo movimento.

No protesto contra as tarifas, ao contrário, o clima era de intimidação. Policiais militares revistavam manifestantes que se dirigiam para a concentração do ato e fizeram um cerco à multidão. Quem conseguiu chegar à concentração, na praça do Ciclista, ficou encurralado. Fora do cerco, havia outros policiais armados.

“Foi uma ação muito abusiva, um festival de violações de direitos humanos. Reiteradamente, a PM, quando identifica uma conduta que julga inapropriada, ao invés de atuar localmente, ela dispersa e impede a manifestação. Ontem nem isso [uma conduta inapropriada dos manifestantes] aconteceu. Foi um ataque indiscriminado, um festival de violência, com gente ferida”, diz Ortellado.

Na opinião de Roberto Romano, professor de ética e filosofia política da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), houve abuso na atuação da PM, com "uso desnecessário da força". "E isso não é culpa diretamente da polícia. A polícia foi um instrumento; o policial estava servindo à vontade do governo".

Romano avalia que o governo estadual ultrapassou "o limite da legitimidade de sua ação repressiva" e atribui aos "administradores públicos" a responsabilidade pela ação policial. "Entre os manifestantes, tinha pessoas que tendiam para a violência, para o desregramento. Mas sempre, nessas situações, quem deve manter o equilíbrio, o respeito e a legitimidade é o agente do Estado", diz.

 

"Contra os protocolos"

"Considero que houve uma ação desproporcional e que fere nossa Constituição, fere protocolos de atuação da própria polícia, documentos internacionais e resoluções das Nações Unidas" , opina Adilson Paes de Souza, coronel reformado da PM paulista. Mestre pela USP, Souza publicou em 2013 um livro sobre violência policial.

A PM lançou bombas contra os manifestantes quando havia um impasse sobre o trajeto da passeata. O MPL pretendia caminhar pela avenida Rebouças e chegar ao largo da Batata, na zona oeste da capital paulista. A PM queria que os participantes seguissem pela rua da Consolação, no sentido do centro da cidade.

Para Paes de Souza, não há como estipular o percurso de uma manifestação. "Limitar o trajeto de um protesto é limitar o direito de expressão. A amplitude do direito constitucional de manifestação não comporta essa restrição. O direito de manifestação é um dos basilares da democracia, inserido na liberdade de expressão".

“Isso é uma violação dos direitos em precedentes, é abusivo. Ainda que se entenda que não houve notificação [do trajeto], isso não autoriza a PM a agredir as pessoas ou impedir que sigam determinado caminho. O direito de manifestação deve prevalecer”, declara Ortellado.

Para Vladimir Safatle, professor de filosofia da USP (Universidade de São Paulo), a decisão da polícia de impedir que os participantes do ato seguissem por onde planejavam foi uma "provocação deliberada como estratégia de intervenção".

"A PM tem um comportamento padrão de provocação do manifestante. Ela intervém de uma forma tal para acirrar os ânimos. A partir da provocação, ela começa a mostrar todo o seu aparato de repressão completamente desproporcional", critica Safatle.

 

Secretário diz que só ouviu elogios

O secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, apresentou sua versão na noite de terça. Embora a negociação sobre o trajeto da passeata ainda estivesse em andamento quando a PM começou a lançar bombas, ele declarou que a intervenção foi necessária porque "os manifestantes e black blocs tentaram romper com violência o cordão de isolamento da polícia”. “A Consolação estava interditada para a manifestação, mas para causar baderna resolveram investir contra a polícia e tentar invadir a Rebouças". 

Moraes também disse ter recebido "só elogios à atuação da polícia" e que o governador Alckmin achou "ótima a alteração da estratégia" para conter os manifestantes.

As organizações Anistia Internacional e Conectas criticaram a ação da polícia paulista. “É muito grave que a Polícia Militar de São Paulo continue reprimindo protestos pacíficos com uso excessivo e desnecessário da força e detenções arbitrárias”, afirmou a Anistia.

A ativista da Anistia Rebeca Lerer esteve na concentração do ato e disse que a PM impediu o direito democrático de manifestação. “O que a gente viu foi o Estado reprimindo violentamente o direito das pessoas de se reunirem e manifestarem legitimamente. Protesto não é crime. Todo mundo que se diz defensor da democracia tem que cobrar do Estado a garantia do direito de livre de manifestação”.

Outro lado

Segundo nota enviada ao UOL, pelo governo estadual, "a Polícia existe exatamente para garantir que as pessoas possam protestar de forma segura e pacífica, informando e seguindo o trajeto preestabelecido, sem vandalismo e sem violência, como funciona em todos os países civilizados do mundo". 
 
Ainda de acordo com a nota, "o direito à manifestação não pode impedir o direito de ir e vir da população. O Governo do Estado de São Paulo é totalmente aberto ao diálogo. Prova disto e, se o UOL tiver interesse, pode acompanhar nesta quinta-feira (14/1), às 9h, na sede da Secretaria de Segurança Pública, a reunião prévia com representantes do Movimento Passe Livre e do Ministério Público sobre a manifestação marcada para este mesmo dia".
 
Depois, a Secretaria da Segurança Pública avisou que a reunião acontecerá na sede do Ministério Público de São Paulo, às 10h.
 

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