Rio de Janeiro tem ao menos 9 pessoas baleadas por dia na cidade
Fernanda Adriana Caparica Pinheiro, 7, brincava com uma amiga no terraço de sua casa, na favela Parque União, parte do Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, na noite da última quarta-feira (15), quando foi atingida por uma bala perdida no tórax. Menos de um mês antes, no dia 21 de janeiro, Sofia Lara Braga, 2, também brincava sobre o olhar dos pais no parquinho de uma lanchonete no bairro de Irajá quando foi atingida por um disparo na cabeça. Ambas foram socorridas e levadas a hospitais próximos, mas não resistiram aos ferimentos.
As mortes de Fernanda e Sofia somam-se à rotina de violência presenciada pelos cariocas e fluminenses. Em 2016, ao menos nove pessoas baleadas foram atendidas diariamente nas principais emergências da cidade. Em média, 14 tiroteios foram registrados por dia no último semestre.
Entre janeiro e dezembro de 2016, as quatro principais emergências municipais e a cinco principais emergências estaduais da cidade do Rio de Janeiro atenderam, juntas, 3.244 casos de pessoas vítimas de ferimentos causados por armas de fogo, segundo dados das secretarias de saúde do município e do Estado -- cerca de nove atendimentos por dia.
Considerando apenas as emergências atendidas em hospitais municipais da capital fluminense ao longo de 2016, o número é 57,4% maior que o registrado no ano anterior, quando 720 pessoas procuraram as emergências devido a ferimentos causados por armas de fogo. Foram 1.133 atendimentos realizados em 2016. O total de atendimentos em 2015 não foi informado.
De acordo com o aplicativo Fogo Cruzado, ocorreram, em média, 14 tiroteios por dia na cidade entre 5 de julho de 2016 e 5 de janeiro de 2017. Criado pela Anistia Internacional, o aplicativo cruza informações sobre tiroteios e/ou disparos de arma de fogo na capital fluminense e na região metropolitana recebidas por moradores com dados das forças policiais.
Para a assessora de direitos humanos da organização, Renata Neder, a frequência de tiroteios no Rio de Janeiro “é chocante” e os casos de balas perdidas acabam impactando mais as áreas mais pobres. “O impacto dessa violência, especialmente favelas e periferias, é enorme. Além das vidas perdidas, os moradores dessas áreas têm seu direito de ir e vir cerceados e sofrem com a interrupção dos serviços de saúde e educação quando há tiroteios”, afirma.
O sociólogo Ignacio Cano, pesquisador do Laboratório de Análise de Violência da da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), considera que número "não é surpresa" frente ao crescimento geral da violência na cidade e chama atenção para a falta de dados oficiais a respeito. O ISP (Instituto de Segurança Pública) deixou de divulgar ao público os casos de balas perdidas no Estado --o último relatório é de 2012. “É um dado fundamental para a política de segurança”, diz.
O ISP informou que as ocorrências de balas perdidas continuam sendo estudadas, mas com uma abordagem diferente. Segundo o Instituto, há um “esforço maciço de georreferenciamento de todos os casos de letalidade violenta no Rio”. Segundo o Instituto, esse estudo "aponta a necessidade de criação de políticas públicas voltadas para o tráfico de armas".
Procurada pela reportagem, a Polícia Militar informou que não poderia comentar o dado uma vez que não havia o registro exato de como as pessoas foram atingidas pelos disparos de armas de fogo. Já a Secretaria de Segurança afirmou que “o Estado vem tomando as providências necessárias para a diminuição da violência na cidade”.
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