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Ministério da Justiça escolhe presídio federal de Campo Grande (MS) para receber Cabral

Gustavo Maia

Do UOL, em Brasília

24/10/2017 13h59

Órgão ligado ao Ministério da Justiça, o Depen (Departamento Penitenciário Nacional) escolheu a penitenciária federal de Campo Grande para receber o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB), caso a transferência determinada nesta segunda-feira (23) pelo juiz federal Marcelo Bretas seja realizada.

A reportagem do UOL apurou que o presídio do Mato Grosso do Sul foi escolhido porque tem uma ala separada da que reúne chefes do crime organizado. A unidade é uma das quatro penitenciárias federais do país. A decisão foi tomada pelo diretor-geral do Depen, Jefferson de Almeida, mas, até as 14h desta terça-feira (24), o órgão não havia sido notificado sobre a decisão de Bretas.

Responsável pelas ações em 1ª instância da Operação Lava Jato no Rio, Bretas autorizou a transferência de Cabral para um presídio federal, atendendo a pedido do MPF (Ministério Público Federal).

Em ofício ao Depen, o magistrado pediu que o órgão informasse, em até 24 horas, “o estabelecimento penitenciário federal adequado para o recebimento do custodiado”. As outras unidades ficam em Mossoró (RN), Catanduvas (PR) e Porto Velho (RO).

A defesa do ex-governador afirma que a decisão é arbitrária e entrou com um recurso para manter Cabral no Rio, que deve ser julgado nesta terça pelo TRF (Tribunal Regional Federal) 2, a segunda instância da Justiça Federal no Rio de Janeiro e no Espírito Santo.

Detido desde novembro passado, o ex-governador ficou preso no Complexo de Gericinó, em Bangu, zona oeste do Rio, e hoje se encontra na Cadeia Pública Frederico Marques --antigo BEP (Batalhão Especial Prisional)--, localizado no bairro de Benfica, zona norte da capital fluminense.

O pedido do MPF foi feito após Cabral ter mencionado, durante interrogatório realizado hoje na 7ª Vara Criminal, informações pessoais a respeito de Bretas.

O juiz explicou em sua decisão que um decreto que regulamenta a lei sobre a transferência para estabelecimentos penais federais de segurança máxima permite a inclusão e transferência do preso em casos de “justificada situação de extrema necessidade”, como a de Cabral.

O UOL apurou que o Depen tem dúvidas sobre a competência legal de Bretas para aplicar a medida contra Cabral.

Cada presídio federal tem capacidade para abrigar 208 presos em celas individuais. O de Campo Grande foi inaugurado em 2006 e está situado na zona rural da capital sul-mato-grossense. Nos presídios federais, os presos passam 22 das 24 horas do dia sozinhos em suas celas.

Discussão em interrogatório

Na audiência da ação penal referente a acusação de lavagem de dinheiro por meio de compra de joias, Cabral afirmou que a família do juiz Bretas teria entrosamento com joias porque “vendia bijuterias”. O magistrado repreendeu a defesa de Cabral, dizendo que se sentia ameaçado pela afirmação.

O advogado de Cabral pediu, então, um recesso de cinco minutos para orientar o cliente.

Segundo o procurador Sergio Luiz Pinel Dias, o que motivou o pedido de transferência "foi a questão de [Cabral] receber informações dentro da cadeia, informações dadas de fora da cadeia". "Foi no momento em que ele mencionou a família do magistrado", disse.

No entanto, o procurador evitou categorizar as falas de Cabral como ameaças. "O que ficou claro é que ele vinha recebendo informações de fora do presídio", reforçou. "Absolutamente normal ele receber informações dos processos a que responde. O que não é normal é ele saber da vida dos familiares do magistrado", completou Dias.

Perfil sobre Bretas publicado pelo jornal "Folha de S.Paulo" em fevereiro traz a informação de que os pais do juiz criaram os filhos na igreja evangélica e "trabalhando em uma loja de bijuterias no Saara, mercado popular do centro do Rio".

O UOL procurou a assessoria de imprensa do Ministério Público Federal, que ainda não se manifestou.

O advogado de Cabral, Rodrigo Roca, classificou a decisão da transferência como “grave”. “O que ele [Cabral] fez foi trazer um desabafo --verdadeiro, mentiroso, não importa. A questão é que foi um ato conhecido através de interrogatório, um ato dele para que ele se defendesse. Para ele dizer o que bem entender em sua defesa”, disse o advogado.

“Não vou dizer nem que foi um comentário infeliz, foi um comentário desnecessário. E, por ser desnecessário, não deveria nem ter sido levado em conta para uma sanção tão grave quanto esta [transferência para o presídio federal], que vai prejudicar o exercício da defesa”, declarou.

À reportagem, Roca informou que Cabral não tem acesso aos jornais dentro do presídio. “Não, ele não tem acesso. Mas o problema não é este, uma vez que, estando nos jornais, qualquer pessoa alfabetizada teria acesso à informação e pode passar para ele: familiares, pessoas que estão acompanhando”, disse.

Esta foi a primeira vez que o ex-governador se encontrou com Bretas após suas duas primeiras condenações da Lava Jato no Rio. Em agosto, o juiz federal negou hoje pedido dos advogados de Cabral para conceder entrevista a dois veículos de comunicação --a defesa do ex-governador alega que ele queria apresentar sua versão dos fatos.

Durante o interrogatório, Cabral discutiu com Bretas, fazendo críticas aos processos do qual é réu. Para Cabral, que também teceu críticas ao magistrado ao longo do depoimento, o juiz Bretas faz uma “projeção pessoal para o meu calvário”.

“Vossa Excelência já me condenou em duas ocasiões, uma em 45 anos e outra em 13 anos. Percebe-se, a partir dessas condenações, que vossa excelência não acredita em mim”, declarou Cabral. “Comprei joias para minha mulher em datas comemorativas”, continuou.

Bretas perguntou se Adriana Ancelmo teria usado joias mais baratas como parte do pagamento de joias mais caras. Cabral respondeu que tal prática é de “praxe” ao se comprar joias, e classificou a denúncia como um “teatro” do Ministério Público.

“Eu leio meus processos. Você olha e percebe que há um ‘recorta e cola’ de um processo ao outro.”