Oficiais da PM do Rio ameaçam entregar os postos após declarações de ministro da Justiça
As declarações do ministro da Justiça, Torquato Jardim, causaram alvoroço entre os oficiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Mais cedo, um grupo foi até o quartel-general da corporação, no centro da capital, exigir uma resposta firme do comandante-geral, Wolney Dias. Alguns oficiais, conforme a reportagem apurou, ameaçaram até entregar os postos.
Torquato afirmou, em entrevista ao blog do jornalista Josias de Souza, do UOL, publicada nesta terça-feira (31), que o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) e o secretário de Segurança do Estado, Roberto Sá, não controlam a Polícia Militar. Para ele, o comando da PM no Rio decorre de "acerto com deputado estadual e o crime organizado." O ministro ainda acrescentou que "comandantes de batalhão são sócios do crime organizado no Rio".
Tanto o governador quanto o secretário de Segurança, Roberto Sá, só se manifestaram, por meio de nota, por volta das 12h30.
Veja também:
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Pezão declarou que "o governo do Estado e o comando da Polícia Militar não negociam com criminosos". Segundo o governador, as escolhas de comandos de batalhões e delegacias fluminenses são decisões técnicas. Ele ainda afirmou que jamais recebeu pedidos de deputados para tais cargos.
Também acusou o ministro de nunca tê-lo procurado para tratar das críticas.
Já Sá se disse “indignado” com as afirmações e reafirmou que as investigações indicam que o tenente-coronel Luiz Gustavo Teixeira, que comandava o 3º BPM (Batalhão da Polícia Militar), foi vítima de tentativa de assalto. O oficial foi atacado a tiros em uma rua do Méier, bairro da zona norte carioca.
Torquato declara-se convencido de que o assassinato do comandante do batalhão não foi resultado de um assalto. ''Esse coronel que foi executado e ninguém me convence que não foi acerto de contas."
O ministro relatou que conversou sobre o assunto com o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) e com o secretário de Segurança. Encontrou-os na última sexta-feira (27), em Rio Branco (AC), numa reunião com governadores de vários Estados. "Eu cobrei do Roberto Sá e do Pezão", relata Torquato.
Procurado pelo UOL, o comando da PM afirmou que não ocorreu nenhuma movimento de oficiais no quartel-general da corporação nesta terça-feira (31).
Com a morte do tenente-coronel, o Estado chegou a 113 PMs assassinados em 2017. Segundo policiais ouvidas pelo UOL, a insatisfação é geral.
A tropa reclama, em especial, das más condições de trabalhos --há relatos de batalhões em que os policiais fazem vaquinhas para abastecer as viaturas e trabalham com coletes a prova de balas vencidos--, e dos atrasos no salário.
“Não há como trabalhar como a polícia trabalha. Trabalhamos 45 dias, mas recebemos 30”, diz o coronel Fernando Belo, presidente da associação de oficiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro, ao referir-se às horas extras trabalhadas pelos policiais sem prazo para serem quitadas. “Não recebemos o 13º salário de 2016, dificilmente vamos receber o de 2017.”
No fim da tarde, o comando da PM publicou uma nota de repúdio às declarações do ministro. “As declarações do Ministro da Justiça, Torquato Jardim, vinculando comandantes de batalhões da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro ao crime organizado, são de uma irresponsabilidade inadmissível e merecem o nosso mais veemente repúdio”, diz o texto.
Para a corporação, “ao generalizar acusações sem qualquer base comprobatória contra uma instituição bicentenária, as declarações do Ministro Jardim revelam, no mínimo, desrespeito e desprezo ao esforço descomunal empreendido por milhares de policiais militares que, não obstante a dificuldades de toda ordem, não têm medido esforços para defender a sociedade do nosso estado”.
Crise na segurança
O Rio passa por uma escalada de violência. Na última quinta-feira (26), o comandante do 3º BPM (Méier), tenente-coronel Luiz Gustavo de Lima Teixeira, 48, foi assassinado a tiros no Méier. Mais cedo, no mesmo dia, uma adolescente de 12 anos foi vítima de bala perdida quando deixava uma festa evangélica na Rocinha, favela na zona sul.
No começo da semana passada, uma turista espanhola morreu depois que um policial militar atirou contra o carro em que ela estava, junto com outros turistas, segundo a Polícia Civil. Os agentes falaram que o veículo furou uma blitz, mas o motorista nega. Momentos antes da morte, dois PMs haviam sido baleados por criminosos na Rocinha.
Desde setembro, traficantes se enfrentam pelo controle da venda de drogas na região da Rocinha. Por uma semana, quase mil homens das Forças Armadas e polícias fizeram um cerco à favela --parte do contingente de cerca de 8.500 militares que reforçam a segurança no Estado desde o fim de julho.
Em agosto, o governo do Rio decidiu reduzir em 30% o efetivo das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) como forma de aumentar o número de policiais nas ruas, movimento que foi considerado um recuo no programa implantado em 2008 para tentar retomar áreas dominadas pelo tráfico de drogas.
Na primeira semana deste mês, pesquisa Datafolha mostrou que, se pudessem, 72% dos moradores iriam embora do Rio por causa da violência. O desejo de deixar a cidade é majoritário em todas as regiões e faixas socioeconômicas --foram ouvidas 812 pessoas, e a margem de erro do levantamento é de quatro pontos percentuais, para mais ou para menos.
Nas últimas semanas, segundo o Datafolha, um terço dos moradores mudou sua rotina e presenciou algum disparo de arma de fogo. O levantamento revela que 67% das pessoas ouviram algum tiro recentemente.
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