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'Bateram nos meninos': pai diz que jovens foram presos em operação enquanto jogavam videogame

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

22/08/2018 14h03

Uma família, moradora da localidade conhecida como Caixa d’Água, no Complexo da Penha --uma das comunidades alvo desde segunda-feira (20) de operações das Forças Armadas na zona norte do Rio de Janeiro-- diz que policiais civis entraram em uma casa na favela, sem autorização judicial, agrediram e prenderam cinco jovens, de idades entre 16 e 22 anos, que estavam jogando videogame.

A mãe havia saído para trabalhar e recomendou que os três filhos, além do primo e do genro, não saíssem de casa devido aos confrontos frequentes na região. Segundo o pai, Luiz Soares, os policiais entraram na residência à procura de armas, drogas e rádios de comunicação.

Soares afirmou que os agentes encontraram em celulares imagens da movimentação dos policiais na favela. As fotos tinham sido enviadas para parentes alertando sobre o risco de confrontos em razão da presença da polícia na região.

“Se matassem ou roubassem, eu seria o primeiro a dizer que iriam presos, mas são inocentes. Eles [policiais] entraram ameaçando, bateram nos meus meninos e algemaram. Minha filha, que estava em casa na hora, me ligou chorando e contando tudo. O máximo que meu filho fez foi me enviar uma foto dizendo que o caveirão [blindado da polícia] estava aqui pegando todo mundo”, contou Soares ao UOL.

A família disse ainda que ficou mais de 24 horas sem saber o paradeiro do grupo. “Na Cidade da Polícia, uns falavam que iam liberar, outros falavam que eles não estavam lá. Só hoje [terça-feira], soubemos que os quatro foram transferidos para Benfica e o menor está separado dos outros por ser menor. Está numa unidade no centro da cidade”. Até as 13h desta quarta-feira (22), eles permaneciam presos.

Os pais dos rapazes afirmaram ainda que a casa ficou revirada e que os vizinhos flagraram os policiais tirando fotos do grupo. “Os policiais falaram que eles estavam indo incendiar ônibus. É mentira. Eles foram presos dentro de casa”, afirmou Luiz. Segundo a família, o mais velho trabalha e os demais jovens são estudantes.

Um vídeo gravado por moradores mostra o momento em que os jovens descem o alto do morro acompanhado dos policiais.

Em protesto contra as prisões, um grupo de 60 pessoas fez uma manifestação no interior no Complexo da Penha na noite de terça-feira (21). Com faixas e cartazes, moradores, parentes e amigos pediam a liberação dos jovens e gritavam por justiça.

Procurada, a Polícia Civil informou que não há registro do caso na delegacia da região. A assessoria de imprensa informou que checa a denúncia junto à Cidade da Polícia, para onde o grupo teria sido levado.

O UOL procurou também o CML (Comando Militar do Leste) que informou "que todas as denúncias devem ser registradas na delegacia policial da área e submetidas ao canal de ouvidoria da intervenção federal (ouvidoria.intervencao@cml.eb.mil.br), sempre acompanhadas de dados que permitam a devida apuração".

Durante os dois dias de operação das Forças de Segurança nos complexos do Alemão, Penha e Maré, 70 pessoas foram presas e 14 armas apreendidas, entra elas cinco fuzis. A ação apreendeu também 554 kg de maconha e 1.045 munições.

Ao menos oito pessoas morreram em decorrência da operação, sendo três deles militares.

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Ainda na segunda, a ONG Redes da Maré divulgou um vídeo em que policiais militares aparecem atirando para dispersar um grupo de mulheres e crianças que tentava impedir que quatro homens fossem revistados pelos PMs em um beco sem que ninguém pudesse ver. O caso ocorreu na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, também na zona norte.

Nas imagens, é possível observar o momento em que policias levam para dentro de um blindado o que aparenta ser um corpo embalado em um plástico ou tecido. O grupo reage, algumas mulheres gritam e gesticulam diante dos policiais, e os agentes efetuam disparos para dispersar o grupo.

A ONG denuncia ainda a morte de um jovem, conhecido como De Belém. As circunstâncias da morte não foram informadas. Ele não tinha parentes na comunidade, na qual morava há um ano. “Pouco se sabe sobre rapaz, inclusive sobre sua morte. O que se sabe, no entanto, causa indignação: seu corpo foi retirado da cena de seu assassinato antes que a perícia pudesse ser feita e sua morte não foi registrada na Delegacia de Homicídios”, afirmou a ONG por meio de sua página na internet.

O UOL encaminhou a denúncia para as polícias Civil e Militar, mas ainda não obteve retorno.

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