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Vaticano investiga bispo do interior de SP por omissão sobre pedofilia

Bispo dom Tomé Ferreira da Silva administra a diocese de São José do Rio Preto (SP) - Divulgação
Bispo dom Tomé Ferreira da Silva administra a diocese de São José do Rio Preto (SP) Imagem: Divulgação

Carlos Petrocilo

Colaboração para o UOL, de São José do Rio Preto (SP)

17/10/2018 12h52Atualizada em 18/10/2018 14h39

O Vaticano investiga o bispo dom Tomé Ferreira da Silva, que administra a diocese de São José do Rio Preto (SP), que teria sido omisso em casos de pedofilia envolvendo padres e também trocado mensagens de teor sexual com um jovem.

O processo, aberto em agosto com a visita de dom José Negri, enviado pelo papa Francisco à diocese do interior paulista, ainda não foi concluído.

UOL apurou que o bispo tenta renunciar ao cargo e pleiteia uma aposentadoria. A reportagem também teve acesso à denúncia feita por um jovem e encaminhada ao Vaticano. O documento reúne reproduções de conversas pelo WhatsApp com o sacerdote. Na ocasião, o bispo pede para ver partes íntimas do jovem.

Em setembro, dom Tomé renunciou a dois cargos. No dia 21, ele deixou a função de coordenador regional da Arquidiocese de Ribeirão Preto, vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e, uma semana depois, pediu seu desligamento como moderador do Tribunal Eclesiástico Interdiocesano, que atende as cidades paulistas de São José do Rio Preto, Catanduva, Jales e Votuporanga.

Essa não é a primeira vez que o bispo é investigado por ordem do papa. Em 2015, o arcebispo de São Paulo, dom Odílo Scherer, foi enviado à região e após apuração interna inocentou dom Tomé das acusações de ter um relacionamento amoroso com seu ex-motorista e de desvios de dinheiro da diocese.

A situação atual é mais complicada. Desta vez o papa Francisco, preocupado com crimes de pedofilia na igreja, nomeou um dos seus homens de confiança: dom José Negri, bispo da diocese de Santo Amaro, na capital paulista.

Papa Francisco e dom José Negri, bispo da diocese de Santo Amaro, na capital paulista - Divulgação - Divulgação
Papa Francisco e dom José Negri, bispo da diocese de Santo Amaro, na capital paulista
Imagem: Divulgação

Mão sobre a Bíblia

Dom José desembarcou em Rio Preto no dia 13 de agosto e colheu depoimentos de aproximadamente 90 membros da diocese: 70 padres e 20 seminaristas. Todos foram ouvidos no prédio do seminário e, logo no início, foram obrigados a colocar a mão direita sobre a Bíblia e fazer juramento de dizer somente a verdade e manter sigilo. Os interrogatórios a portas fechadas contaram com a presença apenas de dom José, o seu auxiliar, que digitava o relato em um computador, e o padre ou seminarista. “Eu e os padres saímos com a sensação que o dom José Negri sabe de tudo o que acontece, queria apenas saber a nossa opinião sobre o dom Tomé”, disse um dos padres ao UOL.

Dom José elaborou perguntas diferentes para cada um dos interrogados. Em seguida, enviou todo o material para o Vaticano, aos cuidados do papa Francisco. Entre os temas, dom José demonstrou preocupação com casos de pedofilia.

A reportagem entrou em contato com Dom José por telefone, por email e WhatsApp, mas não teve resposta. A CNBB afirmou que o caso não é de sua competência e portanto não se pronunciou.

Fotos no celular

Um dos casos que chamou atenção foi a omissão de dom Tomé após a Polícia Civil prender o padre Manoel Bezerra Lima, de 66 anos, em novembro do ano passado na cidade de Guapiaçu (SP), administrada pela diocese de Rio Preto, acusado de armazenar fotos e vídeos de menores de idade praticando atos sexuais.

“Todo o sacerdócio sabia dos atos do padre Manoel, e dom Tomé já havia sido advertido inúmeras vezes que o padre levava menores para sua casa. Mas Tomé e Manoel são próximos, e o bispo preferiu fazer vistas grossas, só tomou atitude de afastar Manoel poucos dias antes de a polícia prendê-lo”, afirma um dos padres ouvido pela reportagem.

Segundo a Polícia Civil, a denúncia partiu da mãe de um jovem, de 17 anos. A mãe passou a desconfiar da frequente presença do filho na casa de padre Manoel, em um condomínio de luxo na zona rural de Guapiaçu. Ao cumprir o mandado de busca expedido pela Vara da Infância de Juventude de Rio Preto, policiais apreenderam o celular do padre com material pornográfico e ainda preservativos e gel lubrificante. O sacerdote pagou fiança de R$ 3.000 e responde ao crime de pedofilia em liberdade.

Funcionária processou bispado

A gestão de dom Tomé frente à diocese de Rio Preto começou no final de 2012. Além das suspeitas sobre crimes sexuais, o bispo é acusado pelos padres de assédio moral.

No mês passado, a Justiça do Trabalho condenou o bispado de Rio Preto a indenizar uma ex-funcionária, Eliete Cristina Grassi, no valor de R$ 150 mil. Auxiliar de serviços gerais por 13 anos, ela comprovou que trabalhou das 7h30 às 17h30 sem intervalo e, diante do esforço excessivo, sofreu uma tendinopatia. Eliete foi afastada pelo auxílio-doença. A juíza Adriana Fonseca Perin entendeu que o bispado nada fez por Eliete, mesmo ciente do seu estado de saúde, e aplicou uma indenização por danos morais de R$ 30 mil, além de outros R$ 5.000 para reparo por danos estéticos. “A autora possui duas cicatrizes cirúrgicas no ombro direito, capazes de ensejar a indenização postulada”, escreveu a juíza Adriana.