Topo

Mineração da Braskem fez bairros de Maceió afundarem, aponta laudo

Prédios do bairro do Pinheiro, em Maceió, tem rachaduras - Beto Macário/UOL
Prédios do bairro do Pinheiro, em Maceió, tem rachaduras Imagem: Beto Macário/UOL

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

08/05/2019 12h17Atualizada em 21/05/2019 14h01

Relatório apresentado hoje pelo Serviço Geológico Brasileiro aponta que a mineração causou os problemas no solo que levaram ao afundamento e a rachaduras de dezenas de imóveis e ruas em três bairros de Maceió. Ao todo, 2.000 famílias foram desalojadas desde o ano passado e deixaram suas residências nos bairros do Bebedouro, Mutange e Pinheiro.

Segundo o documento, o problema foi causado pela extração da salgema (misto de cloreto de sódio, de potássio e de magnésio) do subsolo, feita pela empresa Braskem há mais de 40 anos na região. Ao todo, 35 poços operaram ou operam nos bairros.

A Braskem disse, em nota, que "analisará os resultados apresentados frente aos dados coletados por geólogos e especialistas independentes" e continuará com as ações emergenciais (leia mais ao final do texto).

O relatório é conclusivo e diz que o problema foi causado pela "desestabilização das cavidades provenientes da extração de salgema, provocando halocinese [movimentação do sal], e criando uma situação dinâmica com reativação de estruturas geológicas antigas, subsidência [afundamento] do terreno e deformações rúpteis na superfície [trincas no solo e nas edificações]".

Segundo o assessor de Hidrologia e Gestão Territorial do Serviço Geológico Nacional, Thales Queiroz Sampaio, questões como o ordenamento urbano e a retirada de água subterrânea foram descartadas durante os estudos como o que contribuiu para o problema. "Não é um problema de geotécnica, existem causas diferenciadas. E os aquíferos suportam perfeitamente, não existem indícios de superexploração", diz.

Segundo ele, existia um conjunto de falhas na região, que foram reativadas pela mineração e fizeram movimentar o solo. "Alguns poços de sal interceptam a zona de falha, indicando que as deformações estão relacionadas com o processo de reativação das atividades", diz.

Segundo ele, há uma diferença significativa dos poços em inatividade. "Essas cavidades deveriam estar estáveis, mas estão desestabilizadas", aponta.

Uma das minas citadas é a de número 7, que teria entrado em colapso. A retirada de salgema do local foi paralisada em junho de 1987. "De lá para cá essa cavidade se elevou 200 metros. É algo anormal", afirma.

Tremores incomuns

Ainda segundo ele, a falha do Mutange, como é conhecida, é profunda e está até 1.500 metros. Ele ainda explicou que o problema não começou com o tremor de 2,8 na escala Ritcher de março de 2018, mas antes, ainda por volta de 2016, quando o solo começou a afundar.

Rachadura no bairro Pinheiro, em Maceió - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Imagem: Beto Macário/UOL
Segundo estudos, em menos de dois anos foram notadas áreas com rebaixamentos superiores a 40 centímetros. "O tremor de março de 2018 não se tratou de uma falha tectônica. Ele não foi responsável pelos quebramentos existentes no terreno, já que a energia liberada não teve força para causar danos", diz.

Mesmo assim, uma rede de sismologia foi instalada no Pinheiro para medir os sismos que ocorrem na região. "A região tem registrado muitos sismos, com liberação lenta, mas que apresentam caraterísticas tradicionais sísmicas, semelhante a deslizamento de dois blocos ou múltiplos rompimentos entre blocos", aponta.

Ainda segundo o especialista, é preciso ainda saber a quantidade de cavidades vazias. "Conhecendo elas, acredito que haja suporte de engenharia para transformar esse processo."

Hoje a Braskem está com as atividades de mineração suspensas por conta de ordem do governo do Estado. A empresa também teve R$ 2,67 bilhões impedidos de serem divididos entre os acionistas para pagar eventuais danos materiais a moradores da área.

O Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública informaram que vão pedir urgência para que a Justiça bloqueie os valores pedidos, e não só impeça a distribuição dos lucros com os sócios.

O que diz a Braskem?

Em nota enviada na noite de hoje, após a publicação da reportagem, a Braskem afirmou que recebeu o laudo e "analisará os resultados apresentados frente aos dados coletados por geólogos e especialistas independentes".

"Desde o início do agravamento das rachaduras e fissuras no bairro, em março de 2018, a Braskem vem colaborando com as autoridades na identificação das causas e informando com transparência e responsabilidade os estudos realizados por empresas de renome internacional."

A empresa ainda afirmou que vai continuar com as ações emergenciais, "o que inclui a inspeção dos sistemas subterrâneos de drenagem, a instalação de estação meteorológica e de equipamentos de GPS de alta precisão para detecção da movimentação do solo, entre outras medidas, a fim de evitar o agravamento dos problemas no bairro frente ao ciclo chuvoso e com vistas a proteger a segurança das pessoas".

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado na reportagem, a escala Ritcher não é medida em graus. O texto foi corrigido