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Cade condena 11 empresas e 42 pessoas por cartel de trens e metrôs

Divulgação/GOVESP
Imagem: Divulgação/GOVESP

Aiuri Rebello

Do UOL, em São Paulo*

08/07/2019 16h59Atualizada em 09/07/2019 12h37

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) condenou nesta tarde 11 empresas e 42 pessoas por formação de cartel em licitações de trens e metrôs no país. O processo se iniciou com denúncias envolvendo obras em São Paulo, mas descobriu irregularidades também em outras três unidades da federação: Distrito Federal, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

Também foram aplicadas multas de mais de R$ 535 milhões e impostas restrições administrativas (leia mais abaixo) às empresas e pessoas físicas condenadas.

Em seu voto, o relator, João Paulo de Resende, disse que foi montado um esquema nacional para fraudar licitações de trens e material rodante, manutenção de equipamentos e sistemas auxiliares e obras de construção civil.

No início do julgamento, os advogados das empresas condenadas negaram o conluio e afirmaram que não havia provas suficientes para a condenação (leia mais abaixo).

Os investigados ainda podem ser punidos criminalmente pela Justiça, uma vez que o Cade investiga e pune infrações apenas no âmbito das concorrências.

16 empresas investigadas

O processo conduzido pelo Cade investigou pelo menos 27 licitações de trens urbanos no país, em contratos no total de R$ 9,4 bilhões. As multas para as empresas somam R$ 515,59 milhões e para as pessoas físicas, R$ 19,52 milhões.

As empresas Alstom, Bombardier e CAF são consideradas as líderes do esquema que começou a ser investigado no estado de SP. A Siemens era tida como a quarta líder, mas, como fez acordo de leniência e detalhou o esquema, não pagará nada.

Ao todo, 11 empresas foram condenadas, quatro foram inocentadas por falta de provas e uma, a Siemens, fez acordo de leniência --não foi, portanto, julgada por ter colaborado com as investigações.

  • CAF Brasil Indústria e Comércio - R$ 167 milhões
  • Alstom Brasil Energia - multa de R$ 128,6 milhões
  • MGE Equipamentos e Serviços Rodoviários - R$ 80 milhões
  • MPE - Montagens e Projetos Especiais - R$ 35,2 milhões
  • Tejofran de Saneamento e Serviços - R$ 23 milhões
  • Bombardier Transportation Brasil - R$ 22,9 milhões
  • TTrans Sistemas de Transportes - R$ 20,23 milhões
  • TC/BR Tecnologia e Consultoria Brasileira - R$ 17,7 milhões
  • Temoinsa do Brasil - R$ 17,7 milhões
  • Iesa de Projetos Equipamentos e Montagens - R$ 927 mil
  • Mitsui & Co Brasil - R$ 600 mil.

Outras quatro foram inocentadas por falta de provas:

  • Serveng
  • Hyundai
  • RHA
  • Caterpilar

Procint e Constech, que chegaram a ser incluídas na lista do Cade, não foram investigadas, por conta de prescrição de suas partes no caso.

Investigação começou há seis anos em SP

De acordo com a investigação do Cade, a Alstom participou dos dez projetos que teriam sido atingidos pelo cartel. Já a Bombardier atuou em oito, e a CAF, em sete. Empresas como a Hyundai-Rotem, Serveng e TC/BR, por exemplo, estiveram em apenas um projeto cada uma. Cabia às líderes também uma maior participação em cada consórcio formado após as licitações, garantindo a elas um maior faturamento.

O cartel do metrô é investigado há mais de seis anos no Cade.

As empresas teriam iniciado o conluio há mais de 20 anos, atuando entre 1998 e 2013, período em que São Paulo foi governado pelos tucanos Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin. Enquanto o Cade investiga as infrações à concorrência, o Ministério Público apura, na esfera penal, possível crime de corrupção de agentes públicos. Quatorze pessoas foram condenadas em processos relacionados ao caso.

De acordo com a investigação, em 1998 o cartel começou a atuar nos preparativos para a licitação para construção da linha 5 (Lilás) do metrô de São Paulo, orçada à época em R$ 512 milhões. No início dos anos 2000, o esquema foi expandido para licitações de projetos de manutenção de trens da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e para concorrências do órgão que compraram ao todo 384 carros. O conluio, segundo os investigadores, também fraudou contratações para a extensão da linha 2-verde em 2005 e, entre 2008 e 2009, do projeto de reforma das linhas 1-azul e 3-vermelha.

Em 2005, o Cade afirma que o cartel atuou para fraudar contratos de manutenção do metrô doo Distrito Federal. Em 2012, o cartel teria atuado para vencer e determinar os preços em licitações da Trensurb (Empresa de Trens Urbanos) e pela CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), destinadas à aquisição de trens para os metrôs de Porto Alegre e Belo Horizonte, respectivamente.

Além da aplicação de multas, o Conselho determinou à Alstom pena de proibição de participação em licitações públicas, nos ramos de atividade afetados pela conduta, realizadas pela Administração Pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal e por entidades da administração indireta, pelo prazo de cinco anos.

Além disso, o Tribunal recomendou aos órgãos públicos competentes para que não seja concedido às empresas Alstom, Bombardier e CAF, pelo prazo de cinco anos, parcelamento de tributos federais devidos ou para que sejam cancelados, no todo ou em parte, incentivos fiscais ou subsídios públicos, nos termos da alínea 'b' do inciso 4º do artigo 38 da Lei 12.529/11.

Relator queria multa maior

Por lei, as punições em casos de cartel no Cade vão de 0,1% até 20% do faturamento da empresa no ano anterior à instauração do processo (2013), no ramo da atividade empresarial em que ocorreu a infração. O porcentual aplicado é definido pelos conselheiros e, tradicionalmente, leva em consideração a gravidade da conduta e o conjunto de provas contra cada acusado.

O valor ficou abaixo do sugerido pelo relator do processo, João Paulo de Resende, que votou por multas que somavam R$ 991,1 milhões. Apenas para a Alstom, Resende sugeriu multa de R$ 530,7 milhões.

Outro lado

Em nota enviada ao UOL, a assessoria de imprensa da CAF afirma que a empresa respeita o trabalho do Cade, mas considera a decisão injusta e vai tomar as medidas administrativas e judiciais cabíveis para revertê-la. "A empresa confia no restabelecimento dos fatos e, consequentemente, na reversão da decisão ora tomada pelo Cade", afirma a nota.

Durante o julgamento a advogada da Bombardier, Paola Pugliese, questionou as provas e disse que indícios de fraudes documentais foram "esfregados na cara" da superintendência-geral do Cade e que nada foi feito. "Esse julgamento já aconteceu, a portas fechadas", reclamou.

A empresa disse que vai contestar a decisão. "A Bombardier discorda fortemente das conclusões do órgão, que são baseadas em uma leitura parcial das evidências, em um processo admnistrativo caracterizado por violações flagrantes de princípios constitucionais, incluindo o devido processo legal", afirmou em nota.

"Como uma empresa global, seguiremos trabalhando regularmente com os nossos clientes em países em desenvolvimento para criar soluções de mobilidade confiáveis, seguras e sustentáveis. Confiamos no nosso time, em nossos processos e em nossos esforços contínuos para melhorar o nosso programa interno de compliance, a fim de garantir que todos os desafios sejam gerenciados."

O advogado da CAF, Pedro Zanota, disse que a empresa teve comportamento "individual, independente e competitivo e não merece punição". Priscila Broglio, advogada da Hyundai-Rotem, alegou que a acusação não era respaldada em provas. "Não tem nenhum elemento que ligue a empresa ao cartel", afirmou.

Em nota, a Alstom diz que respeita a legislação dos países em que atua e que, quando notificada, vai analisar opções judiciais para proteger os interesses da empresa. "A empresa reforça que opera de acordo com um Código de Ética a fim de cumprir todas as leis e regulamentos dos países onde atua. A proibição de quaisquer práticas de concorrência desleal é expressamente estabelecida nas regras internas da Alstom. A empresa constantemente busca aprimorar seu programa de compliance e implementar as melhores regras e processos."

A representante da MGE, Viviane Fraga, disse que a empresa era apenas prestadora de serviços e não participou de nenhum cartel. Eduardo Caminati, representante da RHA, disse que a empresa foi confundida com outra e não firmou contratos investigados.

Os representantes da Serveng, da Tejofran e da MPE também negaram participação das empresas no conluio.

A reportagem ainda não conseguiu contato com representantes de Iesa, Mitsui, TC/BR, TTrans e Temoinsa.

* (com informações da Agência Estado)