Milícia é uma reação ao "esculacho", diz acusado de fundar Liga da Justiça
Resumo da notícia
- Condenado por fundar a antiga Liga da Justiça, Jerominho quer ser prefeito do Rio
- Ex-policial abre apoio ao presidente Bolsonaro e ao governador do Rio, Witzel
- Jerominho e irmão estiveram entre 226 indiciados pela CPI das Milícias da Alerj
- Ele alega inocência e afirma que querem transformá-lo em "um Pablo Escobar"
Ele é acusado de fundar a antiga Liga da Justiça, grupo paramilitar surgido na zona oeste carioca, que se tornou uma das maiores organizações criminosas do país nos últimos anos.
Condenado na Justiça por formação de quadrilha, cumpriu pena de dez anos de prisão.
De volta às ruas desde outubro de 2018, agora quer ser prefeito do Rio. E diz se inspirar nas ações do presidente Jair Bolsonaro.
Em entrevista ao UOL, o policial civil aposentado e ex-vereador Jerônimo Guimarães Filho, o Jerominho, é favorável à política de abate do governador do Rio, Wilson Witzel. E revela detalhes da sua relação com os moradores de Campo Grande, reduto da milícia. "Quando assaltadas, as pessoas não vão para a delegacia. Elas me procuram".
De bermuda e chinelo, ele aguardava a reportagem sentado na varanda na frente de casa por volta das 11h de quinta-feira (13). Estava acompanhado por um homem de boné, tatuagem no braço e um grosso relógio dourado no pulso. "O senhor é um homem fortíssimo, não tem jeito", comentou o sujeito, ao ver Jerominho na 8ª posição em uma pesquisa sobre a intenção de votos para a Prefeitura do Rio. "Também nem tanto assim", minimizou.
Logo em seguida, o ex-policial civil e ex-deputado estadual Natalino José Guimarães, seu irmão mais novo, que também passou dez anos atrás das grades, chegou ao local. "Tu viu a pesquisa, meu irmão? Se fizessem só na zona oeste, eu estaria em primeiro", disse Jerominho.
Quando uma moradora apareceu no portão para procurá-lo, o dono da casa acenou: "Ô, minha amiga! Vai entrar aí? Vou abrir para você". Um homem, então, se aproximou do portão, com um celular na mão e olhar fixo para a rua.
Com mais de 300.000 habitantes, Campo Grande é o bairro mais populoso do país. Localizado a 48 quilômetros do centro, possui o batalhão da PM-RJ (Polícia Militar do Rio de Janeiro) com o menor efetivo da capital, na relação com o número de moradores.
A região é apontada pelas autoridades como o berço da maior milícia do país, que começou a aterrorizar o Rio há cerca de 15 anos, com extorsões, cobranças por taxa de segurança e execuções no asfalto em plena luz do dia.
"A milícia foi criada num momento em que a população estava acuada. Depois, realmente, a coisa ficou terrível. Hoje, as autoridades querem resolver o problema. Mas é mais difícil", avalia Jerominho.
Os irmãos Guimarães estiveram na lista de 226 pessoas indiciadas pela CPI das Milícias, instalada pela Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), em 2008.
"Aqui é do meu jeito"
Jerominho nega ter tido qualquer tipo de envolvimento com a milícia. "As pessoas hoje são condenadas aqui por 'ouvi dizer'. Vocês já me condenaram só por ouvir dizer. Ouviram dizer que eu era o miliciano, que eu era o brabo, já chegaram aqui com uma ideia formada. Como é que eu vou te convencer agora? Como é que eu vou provar a vocês que eu sou inocente? Querem me transformar em um Pablo Escobar".
O promotor Luiz Antonio Ayres, que atua em processos contra a milícia desde o seu surgimento, rebate os argumentos. Ele lembra quando ofereceu denúncia à Justiça por extorsão da milícia a uma cooperativa da zona oeste do Rio, no fim de 2007. "Em seguida, sairia a denúncia contra Jerominho e Natalino. Não há como negar. Eles eram os chefes da milícia. E, certamente, ainda possuem ligações com os antigos membros do grupo".
A casa de dois andares dos Guimarães destoava em comparação aos outros imóveis em uma rua a cinco quadras do West Shopping, área central de Campo Grande. Até mesmo a calçada, com pedras portuguesas, dois espaços retangulares com grama bem aparada e cercada por plantas tratadas, contrastava com o restante do quarteirão.
Uma cozinheira preparava uma feijoada de mão cheia para as mais de 20 pessoas que apareceriam para beijar a mão do patriarca do clã. Entre elas, dois políticos de uma cidade da Baixada Fluminense em busca de apoio nas eleições municipais deste ano.
A equipe do UOL foi ao local e montou um cenário para a gravação da entrevista, retirando a mesa do lugar. Alertado por um dos homens que observava a movimentação dos profissionais, Jerominho levantou da sua cadeira e caminhou até os fundos do imóvel para mostrar como as coisas funcionam ali: "Vocês estão na minha casa. Aqui é do meu jeito".
Como tudo começou
Jerominho lembrou do surgimento dos chamados "grupos de autodefesa", formados por policiais que moravam na região, que se uniram para enfrentar o tráfico de drogas.
Uns polícia [sic] têm umas armas. Aí, tem embate. Tem morte, tem tudo. E os traficantes acabam fugindo. A família não vai mais ser esculachada, o comerciante não vai mais ser esculachado. Pronto, conseguiram formar uma milícia. Eu ouvi dizer que foi assim que começou tudo.
Embora também negue ter participado desse movimento que antecedeu a criação da milícia nos moldes violentos de hoje, Jerominho diz que ele e o irmão eram respeitados em Campo Grande pelo enfrentamento aos criminosos. E defende o movimento criado por policiais para expulsar o tráfico.
Jerominho diz, inclusive, que participaria de uma força-tarefa para acabar de vez com a milícia. "Mas tem que fazer o jogo da inteligência. É preciso criar, também, anistia. Se o governo quiser, tem que dar contrapartidas e anistiar quem está no crime", sugere.
Fama de matador
Em um dos casos, presenciou a filha, a ex-vereadora Carminha Jerominho, ser vítima de uma tentativa de assalto em frente ao portão de casa. Armado, se aproximou do local, dando início a um confronto.
Os caras atiraram em mim. 'Pá, pá'. Eu atirei nos caras. Não mirei, não. Mas acertei os três, porra! Entendeu? Os bandidos largaram a arma e saíram correndo. A polícia veio e prendeu. Mas fui eu que acertei os bandidos.
Episódios como esse, relembra, fizeram com que a sua fama se espalhasse por Campo Grande. Mas, segundo ele, com uma certa dose de exagero.
"A população dizia: 'O Jerominho matou dez'. Os caras aumentam. Aí, criam um clima. No princípio, eu até gostava disso. Mas depois, eu vi que isso era um prejuízo tremendo", disse, se referindo à acusação de que fundou a maior milícia do Rio, ao lado do irmão Natalino.
De volta às ruas, Jerominho quer que a população deixe de vê-lo como o homem acusado de fundar a maior milícia do país para voltar ao cenário político.
"Eu sou Bolsonaro"
Jerominho se exaltou ao ser questionado sobre manifestações nas redes sociais de pessoas ligadas à esquerda, que acusam Jair Bolsonaro de ser miliciano.
"Tentaram matar o Bolsonaro. Agora, dizem que ele é miliciano. Quer que eu te diga? Eu sou Bolsonaro! Eu quero o bem do Brasil. Ele quer o bem do Brasil. E não acredito que ele tenha envolvimento nenhum com milícia", disse, dando socos na mesa em meio às afirmações, em voz alta.
Ele apoiou, ainda, a flexibilização do uso e porte de armas, uma das medidas defendidas por Bolsonaro. "É uma ideia vitoriosa no mundo todo. A população também tem que se defender". E elogiou a política de segurança pública do governador do Rio, Wilson Witzel, que defende o abate a criminosos portando armas de grosso calibre.
Se você vê um camarada com fuzil na mão, é pra abater o cara. É bala nele, pô!
Encontro com Fernandinho Beira-Mar
Na cadeia, diz ter lido mais de 2 mil livros e escrito, de próprio punho, 22 obras ficcionais. Atrás das grades, conta ter vivido os momentos mais difíceis da sua vida. Lá, revela um improvável encontro com Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, apontado como o chefão do Comando Vermelho, uma das maiores facções criminosas do país.
"Ele disse: 'você deve resistir, deve ter força. Existe um Deus, acima de tudo'. Esperava encontrar um Fernandinho cheio de ódio. Encontrei um cara que teve a preocupação de dar um aconchego ao coração da gente pela dor que a gente tava sentindo".
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