Pais de menina negra registram BO após filha ser tampada em foto da escola
"É muito triste ver uma filha passar por isso", disse Elenita Ferrari após a imagem da filha V.F.J., de 10 anos, que é negra, ter sido tampada em uma publicação do colégio onde estuda, em Jundiaí (SP). A foto foi tirada pela instituição antes da pandemia do novo coronavírus e mostra a criança com três alunas brancas, que permaneceram na montagem.
De acordo com a advogada da família, Silene Regatieiri, a postagem no Instagram da escola foi vista pela própria criança na sexta-feira (20), Dia da Consciência Negra. De imediato, V.F.J. teria ficado muito triste e disse aos pais que havia sido "excluída" pelo colégio.
A família registrou um boletim de ocorrência e o caso deve ser investigado pela Polícia Civil. Os pais entrarão com uma ação de danos morais contra a escola até que a investigação seja concluída.
"Os pais estavam na casa de amigos, que são padrinhos dela, jantando, quando ela viu a publicação. O grande problema foi esse. Ela ficou indignada, disse que aquilo estava acontecendo só porque ela é negra, justo naquele dia [da Consciência Negra]", relatou a defensora da família no caso.
A mãe da menina contou que ela e o pai da criança estão tentando não demonstrar perto de V.F.J. que estão tristes com o ocorrido, mas a menina passou a ter comportamento introvertido e tem medo de ficar sozinha.
"É muito triste você ver uma filha passar por isso, principalmente em uma instituição que ela já está há algum tempo e que deveria protegê-la. Eu e o pai estamos tentando não demonstrar isso para ela. Mas ela está se sentindo insegura. Não quer ficar sozinha. Muito ao contrário da pessoa que era", disse Elenita.
A advogada explicou que os pais estavam acostumados com o comportamento expansivo e extrovertido da filha, que nos últimos dias deu lugar ao medo. Segundo ela, a criança tem medo que a situação se repita e que ela esteja longe da família para ampará-la.
"Por mais que falem em um padrão de edição, não tiveram o mínimo de sensibilidade e cuidado, como se a aluna fosse apenas mais um número. A ideia da escola é unificar e não dividir. O pior de tudo que fica são os danos psicológicos na criança", argumentou Silene.
Episódios racistas na escola
Silene contou ao UOL que essa não foi a primeira vez em que V.F.J. foi exposta ao racismo dentro da escola. Em uma das vezes a menina se fantasiou de Arlequina, personagem fictícia dos quadrinhos do Batman, e foi chamada de "macaca chita".
"Os pais conversaram na escola e aparentemente o problema foi resolvido na época. O que afetou ela dessa vez é que foi uma publicação da escola, em uma rede social que todo mundo vê. Ela chegou a comentar na postagem que era ela na foto e que tinham coberto", disse.
No dia seguinte, a mãe ligou para a coordenadora da escola e pediu a foto original, que foi repostada no lugar da que V.F.J. foi tampada. Para a advogada, faltou sensibilidade por parte da instituição.
"O discurso deles é que não têm responsabilidade, que é o padrão da escola colocar o quadro do lado direito, mas o que causa grande indignação é que a publicação foi feita no dia 20 de novembro e eles cobriram a única criança negra da foto", ressaltou a advogada.
Silene contou que o pai de V.F.J. que também é negro, ficou muito abalado com a situação, já que sempre buscou conscientizar a filha sobre seus direitos.
"Ele disse que sofreu muito preconceito na época dele e não queria que ela passasse por isso. A V.F.J. sabia da importância do dia da Consciência Negra porque o pai sempre conversava muito com ela. A mãe está extremamente preocupada, porque nas outras situações de discriminação ela não chegou a mudar o comportamento. Sugerimos que ela busque apoio psicológico para que essas sequelas não perdurem."
Escola responsabiliza agência de publicidade
Por meio de nota, a escola informou que as acusações são "injuriosas". A instituição alegou que a agência de publicidade contratada elaborou 41 postagens em pacote, sendo que em "praticamente todas" o lado escolhido para colocação da caixa de texto foi o direito.
"(O padrão sobrepõe) rostos de muitos outros alunos, em outras fotos, inclusive, alunos brancos, com o intuito de seguir padrão estético na diagramação da publicidade (já que as fotos seriam lidas em sequência)", diz trecho do posicionamento.
A direção da escola ainda ressaltou que a escolha não foi "propositalmente por critério racial", mas sim pelo posicionamento da caixa de textos nas fotos divulgadas na rede social.
"O colégio, ao longo de uma trajetória dedicada à inclusão social e à censura de toda e qualquer prática discriminatória, apoia decisivamente as ações visando coibir o racismo e a disseminação de propagandas de ódio e violência", diz a nota.
Confira na íntegra a nota com a posição do colégio:
Ao contrário da interpretação dada pelos usuários em questão e das injuriosas acusações, na data de 20/11/2020 a Agência de Publicidade contratada pelo Colégio elaborou ao todo 41 postagens, em pacote, sendo que em praticamente todas as postagens feitas naquela oportunidade, o lado escolhido para a colocação da caixa de texto é justamente o lado direito da foto, se sobrepondo aos rostos de muitos outros alunos, em outras fotos, inclusive, alunos brancos, com o intuito de seguir padrão estético na diagramação da publicidade (já que as fotos seriam lidas em sequência).
Ou seja, analisando o conteúdo da publicidade feita naquela data, de forma global, e não individualmente a foto em comento, não sobreleva dúvida de que a ocultação da imagem da aluna em questão, não foi propositalmente escolhida por critério racial, e sim, pelo critério geral de posicionamento da caixa de texto nas fotos divulgadas sequencialmente na rede social.
O Colégio, ao longo de uma trajetória dedicada a inclusão social e à censura de toda e qualquer prática discriminatória, apoia decisivamente as ações visando coibir o racismo e a disseminação de propagandas de ódio e violência.
Essa é nossa missão perante a comunidade e na formação de nossos alunos.
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