"Não foi esfaqueada? Então foi um casamento normal", diz juiz em sentença
Uma conversa anexada a uma sentença de um processo de divórcio gerou indignação em Joinville (SC), a 182 km de distância de Florianópolis. O material expõe uma troca de mensagens do juiz Gustavo Schwingel, da 1ª Vara da Família da cidade, com uma assessora, que não teve o nome revelado.
"São aborrecimentos. Separação é triste. Casamento é feliz. E vice-versa! É a vida. Não foi espancada. Não foi estuprada. Não foi morta. Não foi esfaqueada? (risos da assessora) Então foi um casamento normal. Sofreu psicologicamente?", disse o magistrado, sendo interrompido pela assessoria que observa que iria fazer um quadro com as frases.
"Todos passam por isso por conta da natureza do evento em si, sem que isso configure ato ilícito e dano moral ressarcível. Bota (o quadro com as frases) no fundo da sala da audiência", complementa o magistrado. Questionado pela presidente da subseção da OAB de Joinville, Maria de Lourdes Zimath, sobre a mensagem, Schwingel alegou que houve um "equívoco" com a inclusão de "uma minuta/rascunho" no processo.
A troca de mensagens ocorreu em 25 de março e ganhou repercussão após ser compartilhada pelo advogado Cristiano Alves Garcia, que defende a mulher no processo de divórcio, em sessão da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Santa Catarina na última sexta-feira (16).
Garcia acredita que as mensagens foram colocadas para embasar a sentença, mas o trecho acabou sendo esquecido e vindo a público ao ser colocado no sistema do TJ-SC (Tribunal de Justiça de Santa Catarina). O processo de divórcio corre em segredo de justiça, segundo o advogado.
"A conversa é chocante, assustadora, expõe as convicções do magistrado em relação à situação de uma mulher que está vivenciando o estresse do divórcio litigioso, com deboche, ironia. Ele é magistrado da Vara da Família, sujeitam-se a ele milhares de processos, um magistrado tratar dessa forma sentimento dessa pessoa é um absurdo", salienta o advogado ao UOL.
Em 5 de abril, a presidente da subseção da OAB de Joinville, Maria de Lourdes Zimath, solicitou esclarecimentos ao magistrado. Na última quinta-feira (15), Schwingel respondeu e disse que houve um "equívoco de movimentação no sistema e-proc uma minuta/rascunho foi publicada nos autos".
"Constatada a situação, houve sua exclusão dos autos e em seguida foi proferida a sentença propriamente dita com os requisitos e observâncias legais. A matéria concernente ao rascunho equivocadamente lançado aos autos foi objeto de um contato direto com o representante da parte tão logo o fato foi constatado", complementou o magistrado.
Na sequência, ele disse que as medidas administrativas e pessoais foram tomadas para a "melhoria na prestação jurisdicional".
Corregedoria apura conduta do juiz; servidora é exonerada
Em nota, o TJ-SC informou que a servidora pediu a exoneração do cargo e que a CGJ (Corregedoria-Geral da Justiça) determinou a instauração de procedimento para apurar os fatos em relação ao magistrado. O tribunal disse que a conversa era um "documento interno" que foi "equivocadamente publicizado nos autos".
A presidência do TJ-SC também vai instaurar procedimento disciplinar para investigar a servidora. "Providências no âmbito da unidade judiciária também já foram adotadas para evitar a reiteração do ocorrido", complementou o órgão.
"Importante destacar que, após a correção necessária, a sentença foi lançada nos autos do processo com seus próprios fundamentos. Eventual descontentamento em relação a esta situação pode e deve ser levado aos órgãos competentes para apuração", salientou o tribunal.
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