Justiça ordena ação policial em fazenda de maconha para fins medicinais
A sede campestre da Apepi (Associação de Apoio à Pesquisa e a Pacientes de Cannabis Medicinal), onde é produzido extrato de cannabis para mais de mil pacientes, foi alvo na tarde de hoje de operação policial no município de Miguel Pereira (RJ).
Após recurso do advogado da entidade, a juíza Katylene Collyer Pires de Figueiredo, da Comarca de Miguel Pereira, revogou seu despacho e ordenou às 17h30 a retirada dos policiais da fazenda. Durante a ação, sete colaboradores ficaram incomunicáveis por ao menos duas horas.
A ação policial cumpria mandado de busca e apreensão —expedido hoje pela juíza— em crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas. Katylene justifica na decisão que a ação considera "a necessidade permanente de combate à criminalidade na comarca de Miguel Pereira".
Segundo a direção da Apepi, os policiais pularam o portão e recolheram os telefones celulares dos sete colaboradores que trabalham lá. Eles conseguiram contudo enviar à direção um vídeo do início da operação, postado no Instagram da associação.
Os colaboradores contaram ao UOL que a operação contou com sete viaturas, cerca de 20 policiais portando fuzil e cachorros. A abordagem foi contudo respeitosa. "Alguns deles voltaram para casa levando material didático nosso. Acho que conseguimos uma conversão aí", disse um dos cultivadores.
A associação sem fins lucrativos foi fundada em 2014 por mães de crianças com epilepsia, cujo único conforto se dá por meio de remédios à base de cannabis.
O CFM (Conselho Federal de Medicina) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) já reconhecem o uso terapêutico da cannabis desde 2015. A Lei 11.343, de 2006, apelidada "Lei de Drogas", diz que cabe à União autorizar o cultivo de plantas como a cannabis para fins medicinais e científicos. No entanto, esse cultivo segue sem regulação do Ministério da Agricultura, Ministério da Saúde ou Anvisa.
Em razão da ausência de regulação, mais de 250 pacientes e associações têm conseguido salvo-conduto para cultivar maconha com fins medicinais através de ações judiciais.
Dessa forma, a Apepi conseguiu na 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro uma liminar em 15 de julho do ano passado e deu início ao cultivo na sede campestre em Miguel Pereira.
No dia 13 de novembro, a liminar da associação foi contudo cassada no TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) após recurso da Anvisa.
"Apesar de a desembargadora relatora Vera Lúcia Lima ter votado a favor de manter a liminar, o desembargador Guilherme Diefenthaeler decidiu revogá-la, e o desembargador Marcelo Pereira da Silva acompanhou seu voto e foi formada a maioria", disse a entidade em nota na ocasião.
No entanto, segundo o advogado Ladislau Porto, em nenhum momento os desembargadores falaram em busca e apreensão enquanto corria o processo.
"Temos uma discussão na Polícia Federal e temos uma apreensão da Polícia Civil argumentando organização criminosa, tomando conta da localidade. E o que de fato verifica-se é que não foi feito nenhum trabalho de investigação anterior à questão da busca e apreensão, faltaram diversos dados em relação a isso."
Segundo o advogado, a associação foi pega totalmente de surpresa, uma vez que já recorreu da decisão dos desembargadores e o processo está em fase de finalização. "Existe uma discussão na Justiça Federal sobre o assunto. Que investigação é essa?"
Ladislau entrou com recurso contra a decisão da juíza, explicando que ali não se tratava de tráfico, e sim de um cultivo medicinal com processo sob análise da Justiça Federal. Em seguida, a juíza revogou o despacho e determinou a retirada da polícia do local.
Por volta das 18h, os policiais deixaram o local e devolveram os celulares. O diretor da fazenda e mais um cultivador foram levados à delegacia para cumprir formalidades.
A direção da Apepi, que trabalha na sede do Rio, adiantou viagem já marcada para amanhã (27) a Miguel Pereira. Com parte do processo que corre na Justiça Federal, eles já tinham acordado —em reunião com o comandante da PM local— receber amanhã um major do batalhão local para lhe apresentar o cultivo.
Procuradas pelo UOL, a delegacia de Miguel Pereira ainda não se manifestou sobre a ação policial.
Já a assessoria da Polícia Civil afirmou, por meio de nota: "Quem deve se pronunciar quanto ao que motivou a decisão judicial é a Justiça e não a Polícia Civil, que apenas cumpriu a decisão."
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