Jamil Chade

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Reportagem

Brasil líder do Brics, Trump e mundo rachado: a agenda geopolítica de 2025

"E agora damos as boas-vindas ao novo ano. Cheio de coisas que nunca existiram", escreveria Rainer Maria Rilke. De fato, 2025 desembarca repleto de desafios inéditos para a geopolítica. Ou quase. Donald Trump retorna para a Casa Branca, mas num mundo profundamente novo. O Brics, na presidência do Brasil, tenta se consolidar como um ator incontestável, enquanto governos como o da Alemanha atravessam eleições. Guerras sempre existiram. Mas, desta vez, ameaçam redesenhar o mapa.

2025 marca os 80 anos do final da Segunda Guerra Mundial e tudo indica que o mundo vive um dos momentos mais críticos desde o final do Holocausto.

Eis os principais momentos da agenda geopolítica do Ano Novo:

Trump de volta

O ano político global começa com a posse de Trump, no dia 20 de janeiro. E ele promete que não esqueceremos tão cedo da data. Sua equipe prepara uma artilharia de medidas, na forma de ordens executivas. Isso deve incluir ações de deportação em massa de estrangeiros, a elevação de tarifas de importação para produtos chineses e de outros competidores, a desregulamentação de leis ambientais e o fim de processos para os invasores do Capitólio.

Sua presidência tem tudo para mandar onda de choques pelo mundo, seja no aspecto comercial ou na ofensiva contra entidades como a Otan, ONU e diversas alianças.

O novo mandato ainda será um teste para a extrema direita e sua ambição para redefinir conceitos como direitos humanos e a própria democracia. Com Elon Musk no poder ao lado de Trump, o governo americano ainda será acompanhado por todos sobre como tratará as redes sociais e o desenvolvimento de códigos de conduta para a Inteligência Artificial.

Brics, China e a desdolarização

O mandato de Trump, desta vez, não será apenas observado com surpresa pelo resto do mundo. Ao contrário do que ocorreu em seu governo de 2017, governos prepararam cenários e medidas para enfrentar o republicano. A China, por exemplo, diversificou sua rede de abastecimento e de destino de exportações.

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Mas, acima de tudo, vem construindo uma aliança no Brics capaz não apenas de confrontar os americanos nos organismos internacionais, mas também redesenhando o comércio e os fluxos financeiros.

Depois de forçar e obter uma expansão do bloco, a China vem insistindo sobre a necessidade de que haja uma redução da dependência das economias emergentes em relação ao dólar.

O desafio, porém, coincide com a presidência do Brasil no Brics, ao longo do ano de 2025. O Itamaraty ainda examina como conduzir o debate. Mas já sabe que Trump planeja implementar uma barreira comercial de 100% aos países que optarem por reduzir suas reservas em dólar.

Ucrânia

Outro aspecto central de 2025 será a guerra na Ucrânia. Trump já sinalizou que quer um acordo entre Kiev e o Kremlin. Mas a dúvida persiste sobre o que isso vai significar. Os ucranianos insistem que não abrirão mão de seus territórios invadidos. Mas observadores, inclusive da diplomacia brasileira, acreditam que o único caminho viável neste momento seria um acerto pelo qual todos cedem, inclusive Volodymyr Zelensky.

A permanência dos russos em certos territórios, o compromisso proteção à soberania ucraniana, adesão à UE e à Otan estarão sobre a mesa de um eventual futuro acordo.

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A tendência isolacionista de Trump pode ser um incentivo a um acordo. Mas não necessariamente a uma sensação de segurança entre os europeus.

Eleição na Alemanha

Na Europa, a guerra ucraniana não é o único fator de desestabilização. A crise política na Alemanha obrigou o chanceler Olaf Scholz a antecipar a eleição, agora marcada para fevereiro. A centro-direita aparece como a favorita. Mas, pela primeira vez, o movimento de extrema direita Alternativa para Alemanha surge na segunda posição nas intenções de voto, com 18%.

Uma eleição que confirme essa força política para um grupo do qual fazem parte herdeiros intelectuais e mesmo netos de ministros do nazismo transformaria não apenas a Alemanha, mas o próprio debate sobre a ultradireita no mundo.

Gaza, Israel e a formalização do estado palestino

Em 2025, a guerra em Gaza também entrará em um momento de definição. Trump insiste que quer a paz. Mas sinalizou de forma evidente que estará ao lado de Benjamin Netanyahu para dar uma "solução" ao Hamas.

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A paciência das famílias dos israelenses sequestrados também dá sinais de exaustão e a pressão sobre o primeiro-ministro deve aumentar. O mandado internacional de prisão contra Netanyahu por crimes contra a humanidade ainda vigora.

A questão é o destino da causa palestina. Para o ano, uma conferência internacional está sendo convocada para julho com o objetivo de selar um reconhecimento do estado palestino. O objetivo é o de blindar sua existência, diante de riscos de que áreas inteiras sejam incorporadas por Israel.

Síria, Irã e Líbano

Fundamental para o Oriente Médio será a transição na Síria, depois de décadas do regime da família Assad. O novo governo garantiu que respeitará minorias. Mas sua chegada ao poder é resultado de um enfraquecimento do Hezbollah, do Irã e de uma mudança de postura dos russos.

A ausência de um acordo político que inclua todas as facções pode, segundo diplomatas, fazer eclodir o estado sírio e resultar numa guerra civil ainda mais sangrenta que a que o país viu durante uma década.

Venezuela e o futuro de Maduro

Incerteza é também o que marca o cenário político venezuelano. Ignorando apelos internacionais, Nicolás Maduro anunciou que irá tomar posse para mais um mandato, em janeiro. A oposição, que denuncia uma fraude na eleição de julho, promete continuar lutando e espera uma intervenção de Donald Trump, que montou um serviço diplomático explicitamente anti-Maduro.

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Trump, em seu primeiro mandato, já descobriu que a aplicação de uma pressão total sobre Caracas apenas jogou Maduro nos braços dos investimentos e interesses russos e chineses.

Ao Brasil, por sua vez, o destino da Venezuela é determinante para o futuro de seu projeto de integração regional.

Mercosul e a encruzilhada de Milei

2025 será também o ano de uma encruzilhada para o Mercosul. Presidido por Javier Milei, o bloco estará sob a pressão do argentino para que suas regras sejam modificadas. Ele quer o fim da união aduaneira e que cada país tenha a liberdade para fechar acordos comerciais com quem quer que seja, sem passar pelos demais parceiros.

Na prática, o Brasil vê o modelo como uma ameaça e uma fragilização de sua grande aposta de política externa ao longo de anos.

Haiti, Moçambique

Ainda na região, o Haiti continuará a colocar um desafio diante da violência e do colapso do estado. Tentativas sucessivas de permitir uma estabilização fracassaram, enquanto a ONU se vê em um impasse sobre como resgatar o país mais pobre do Hemisfério Ocidental.

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Quem ainda caminha para se transformar num espelho do Haiti é Moçambique, país que atravessa sua pior crise em 50 anos e um profundo impasse político. O resultado tem sido violência e destruição.

Ambos padecem do mesmo problema: o abandono por parte da comunidade internacional.

COP30 em Belém: Trump irá?

Na agenda de 2025 está ainda a Conferência da ONU para Mudanças Climáticas, que ocorrerá em Belém no final do ano. A cúpula será um teste para a ambição brasileira de liderar o debate sobre meio ambiente e clima no mundo.

Se o tema já divide o mundo, a agenda da COP30 pode ser ainda mais abalada se Donald Trump confirmar sua intenção de abandonar o Acordo de Paris.

Sem o governo americano, Belém terá o desafio de se manter relevante e de ser um marco no combate contra as mudanças climáticas.

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Reforma da ONU e um triste aniversário de 80 anos

Diante de um mundo dividido, a ONU enfrenta seu aniversário de 80 anos em 2025 em uma situação de profunda crise. A entidade espera marcar a data com eventos e discursos. Mas, com um Conselho de Segurança paralisado, uma crise financeira e sem credibilidade, a organização espera dar passos no sentido de manter na agenda a ideia de uma reforma ampla que possa resgatar sua legitimidade.

O Brasil tenta convocar uma espécie de assembleia constituinte, com o objetivo de repensar toda a estrutura da ONU e refundar a organização. Mas, diante de uma disputa entre potências, conta ainda com poucos apoios para transformar essa estratégia em ação.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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