'Perdi recurso': carioca que teve filhos levados acusa irlandês de cárcere
Há seis dias, a nutricionista Raquel Cantarelli, de 34 anos, vive o que descreve como os piores momentos da sua vida. Na última quarta-feira (14) ela teve as duas filhas retirada da casa onde mora no Rio de Janeiro após uma decisão judicial que dá a guarda das meninas de 4 e 6 anos ao ex-marido de Raquel e pai das crianças, Trevor Maloney.
Trevor é irlandês e mora no país europeu, onde Raquel o conheceu, em 2017. A nutricionista havia se mudado para o país um ano antes para fazer serviços voluntários em uma ONG (Organização Não Governamental). Os dois foram casados por pouco mais de dois anos. Mas há quatro anos a relação acabou e a nutricionista voltou com as filhas para o Brasil, sem a autorização do pai.
"Foi um término difícil. Sofri violência doméstica, eu e minhas filhas fomos mantidas em cárcere privado e tivemos nossos documentos confiscados por ele. Precisei da ajuda da embaixada brasileira para conseguir sair de casa e deixar o país", afirma Raquel.
A defesa do ex-marido nega todas as acusações. "As declarações dadas pela mãe das crianças são inverídicas", afirmaram os advogados de Trevor (leia abaixo o posicionamento).
Na denúncia feita à embaixada brasileira na Irlanda, além do cárcere privado, Raquel acusa o pai das meninas de abuso sexual contra a filha mais velha do casal. Segundo a nutricionista, ela flagrou cenas estranhas envolvendo o homem e a filha — a defesa de Trevor nega e diz que as acusações não foram comprovadas pela Justiça irlandesa.
"Quando minha filha mais velha fez um ano eu percebi que ele mudou o comportamento com ela. Passou a se interessar mais e querer estar com ela a sós. Ele aproveitava o momento de trocar as fraldas para tocar a minha filha e não era carinho, tinha malícia", afirma a nutricionista.
Apesar da denúncia, a nutricionista afirma que Trevor foi absolvido pela Justiça irlandesa e o processo foi encerrado.
"A Justiça de lá considera estupro apenas quando há o ato em si e não houve", explica ela.
Mudança para o Brasil
Raquel relata ainda que ao chegar no Brasil, em 2019, ela entrou com pedido da guarda das filhas. Ela ganhou em primeira instância, mas Trevor teria recorrido e ganhado em segunda instância.
"Eu não sabia do recurso e com isso perdemos os prazos de recorrer em terceira instância. Só fiquei sabendo de como estava o processo quando acordei com os policiais na minha casa para buscar minhas filhas", detalha a mãe.
A nutricionista afirma que as filhas tiveram pouco contato com o pai, principalmente a mais nova, que deixou a Europa ainda bebê, aos oito meses de vida.
"Elas não falam inglês e estão tendo que conviver com muita gente estranha. Elas tinham uma rotina, uma vida aqui e do dia para a noite tudo mudou. O pai não conhece nada da rotina delas. Tiraram minhas filhas de casa como se elas fossem um pedaço de papel", lamenta Raquel.
"Eu vivia por elas e minhas filhas foram arrancadas dos meus braços. Se isso realmente tivesse que ser feito, que fosse de uma forma mais humana porque elas foram arrancadas de casa, dos meus braços", diz a mãe.
O que diz a defesa de Trevor
Os advogados de Trevor Maloney afirmam que as declarações feitas por Raquel são inverídicas. "Ela alega falsamente abuso e violência, sendo que suas acusações são infundadas."
Segundo a defesa de Trevor, uma das crianças, que segundo a mãe teria sido vítima de abuso, foi submetida a exame de corpo de delito "que nada apontou", e Trevor "foi inocentado de todas as acusações falsas".
Os advogados argumentam ainda que a mãe trouxe as crianças ilegalmente para o Brasil, após o término do casamento.
A defesa cita uma decisão do TRF-2 (Tribunal Regional Federal), que determinou o retorno imediato das crianças para a Irlanda, país onde nasceram.
"Por conta das falsas denúncias feitas por Raquel, o nosso cliente sofreu uma série de investigações na Irlanda, teve a vida devassada, e absolutamente nada foi comprovado."
A defesa também diz que é mentirosa a alegação de Raquel de que cumpre as decisões judiciais. "Muito pelo contrário: ela sempre descumpriu todas as determinações judiciais, inclusive de contato remoto do pai com as filhas."
O que é a Convenção Internacional de Haia
A decisão da Justiça Federal que fez com que as crianças fossem levadas para a Irlanda é baseada na Convenção Internacional de Haia, um acordo internacional no qual o Brasil faz parte e que busca proteger de crianças em situação de ruptura familiar que tenham sido retirados de seu país de residência.
"As filhas da Raquel, certamente, tinham residência habitual na Irlanda. E a mãe teria trazido as crianças sem consentimento do pai, o que caracteriza, segundo a Convenção de Haia, sequestro internacional. Dessa forma, foi instaurado processo na Justiça Irlandesa que, certamente, demonstrou a característica de sequestro internacional", explica Gloria Caixeta, advogada especialista em direito internacional.
Além de respeitar a convenção, a retirada das meninas da mãe também atende um pedido da Justiça da Irlanda, que afirma que as menores deixaram o país europeu sem a autorização do pai.
"Embora a mãe seja brasileira, o processo de guarda não é sobre a mãe e sim, sobre os filhos. Uma vez que as filhas tiveram seu relacionamento com o pai prejudicado, ainda que durante o processo de guarda, isso não garante que as crianças fiquem no Brasil", acrescenta a advogada.
Além disso, quem decidirá sobre a guarda das crianças, nesse caso, será a Justiça irlandesa, uma vez que as crianças moravam no país europeu.
"Embora as filhas menores tenham sido levadas de volta à Irlanda, é importante analisar o caso concreto, pois há exceções em restituições de filhos, essas exceções se dão se houver comprovação de danos físicos ou psíquicos ao menor", acrescenta a advogada.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.