Boate Kiss: Justiça do RS recua e cancela data de novo julgamento
Horas após pautar para 20 de novembro o início do novo julgamento dos réus do caso boate Kiss, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul recuou e informou que a data ainda não está definida. O incêndio matou 242 pessoas e deixou mais de 600 feridas em janeiro de 2013.
"Para a confirmação da data se faz necessário o aval de áreas técnicas. Suspendo, assim, a decisão anterior, que designara o júri para 20 de novembro próximo. Haverá a definição da data o mais breve possível", relatou o Juiz de Direito Francisco Luis Morsch, da 1ª Vara do Júri, em novo despacho
A decisão foi tomada após o STJ (Superior Tribunal de Justiça) validar, por 4 votos a 1, a anulação do tribunal do júri anterior por irregularidades na condução do processo.
Ministério Público mantém promotora
Em nota, o Ministério Público do Rio Grande do Sul afirmou que a promotora Lúcia Helena Callegari atuará mais uma vez no julgamento.
"Tão logo houve a decisão do Superior Tribunal de Justiça mantendo a anulação, houve uma preocupação do Ministério Público de que o julgamento acontecesse da forma mais breve possível", afirmou a promotoria gaúcha.
Nós estamos num processo que se arrasta por dez anos e precisamos de uma resposta pra que todos possam descansar e para que a gente possa finalmente dizer que a sociedade está julgando e decidindo e tomando um rumo para esse processo"
Lúcia Helena Callegari, promotora do caso Boate Kiss
STJ anulou condenações
Mais cedo, a Sexta Turma do STJ rejeitou um recurso do Ministério Público e manteve a anulação do tribunal do júri, que em dezembro de 2021 condenou dois sócios e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira. As penas variavam de 18 a 22 anos de prisão.
O entendimento do tribunal é que houve irregularidades na condução do processo. Os advogados questionaram a escolha dos jurados e uma reunião reservada entre o grupo e o juiz presidente do tribunal, Orlando Faccini Neto, sem a participação da defesa e do Ministério Público.
O relator do recurso no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, votou em junho para acolher o recurso e restabelecer o tribunal do júri e as condenações impostas aos réus da Boate Kiss. Para ele, a defesa não apresentou elementos que mostrassem prejuízo causado aos réus.
Prevaleceu o entendimento do ministro Antonio Saldanha Pinheiro, que divergiu do relator. Pinheiro avaliou que a reunião do juiz Orlando Faccini Neto com os jurados desperta "uma preocupada suspeita" de possível influência.
Uma opinião do magistrado traz uma influência que não tem como salvar o procedimento. A própria incomunicabilidade dos jurados fica comprometida
Antonio Saldanha Pinheiro, ministro do STJ
O desembargador convocado Jesuíno Rissato também criticou a reunião entre o juiz e os jurados. Para ele, o caso é de "extrema gravidade" e abriria um precedente "perigosíssimo".
"Neste caso não se sabe, ninguém sabe, o que foi tratado nesta reunião secreta. O fato de que o juiz, a certa altura da madrugada, resolveu suspender a reunião do júri e fazer essa reunião secreta com apenas com os jurados. O que foi dito nessa reunião? Ninguém sabe", disse.
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Quero receberA ministra Laurita Vaz também votou para rejeitar o recurso, fechando o placar em 4 votos a 1.
Em nota, a AVTSM (Associação de Familiares das Vítimas da Tragédia de Santa Maria) criticou a decisão do STJ. Para a entidade, o resultado do julgamento é "mais uma decepção com o judiciário brasileiro".
Até quando a impunidade vai servir à injustiça? Foram 242 vidas roubadas, 636 jovens que sobreviveram àquela noite marcada pela ganância e horror. São famílias destruídas, pais e mães que 10 anos depois ainda lutam e esperam pela justiça
Trecho de nota da Associação de Familiares das Vítimas da Tragédia de Santa Maria
Boate Kiss: 10 anos sem solução
O incêndio na casa noturna deixou 242 pessoas mortas e mais de 600 feridas em janeiro de 2013 na cidade de Santa Maria (RS). As chamas tiveram início após o uso de fogos de artifício no interior do estabelecimento e atingiram espumas usadas no teto para isolamento acústico, se espalhando pelo ambiente.
O julgamento dos réus levou nove anos para acontecer e durou dez dias em dezembro de 2021. Foi o Tribunal do Júri mais longo da história do Rio Grande do Sul.
Na ocasião, dois sócios da boate e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira foram condenados por dolo eventual — quando, mesmo sem desejar o resultado, se assume o risco de matar.
As penas haviam sido definidas assim:
Elissandro Spohr, sócio da boate - 22 anos e 6 meses de prisão
Mauro Londero Hoffmann, sócio da boate - 19 anos e 6 meses de prisão
Luciano Bonilha, produtor da banda Gurizada Fandangueira - 18 anos de prisão
Marcelo de Jesus, vocalista da banda Gurizada Fandangueira - 18 anos de prisão.
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