Após 3 enchentes em 1 ano, morador teme por futuro de cidades no RS

O funcionário público de Muçum (RS) Ari José Bordignon, 61 anos, estava dormindo com a mulher quando estranhou seu cachorro, que estava preso do lado de fora da casa, latir incessantemente durante uma chuva que atingia a região onde ele mora, em Vespasiano Corrêa (RS).

Ao abrir a porta, se surpreendeu ao ver que a água de um rio que beira sua casa estava na altura do pescoço do cachorro. Bordignon correu, salvou seu animal de estimação, mas, quando olhou para o seu terreno, viu que suas plantações haviam sido arruinadas.

"Aqui a gente plantava fruta, aipim, batata, repolho, couve-flor e frutas", relembra, com tristeza. Hoje, o terreno está vazio. Toda a parte onde havia alimentos que ele cultivava para consumo próprio sumiu.

Ele conta que foram 8 horas de chuva ininterrupta. "Aqui, a altura da água chegou a quase um metro", diz.

"Princesa das pontes"

Bordignon nasceu em Muçum, cidade afetada por três enchentes em nove meses. "Na primeira, morreram mais de 20 pessoas aqui no Muçum, inclusive umas tão desaparecidas até hoje. O bom é que nessa última, se preveniram, então não morreu ninguém. Só que agora levou mais casas embora", diz.

Ele teme pelo futuro da cidade. "Vai ser muito difícil conseguir moradia para quem perdeu tudo. Adquirir terreno, construir casa e emprego também. Não sei se as firmas vão abrir, porque Muçum é uma cidade bem baixinha, paralela ao rio. Qualquer enchente leva embora", reflete.

Muçum é uma cidade com uma grande colônia italiana. Orgulhoso das raízes do local, o funcionário público relembra que Muçum era tratada como a "Princesa das pontes, um lugar lindo".

Aqui tem o maior viaduto da América Latina, que pertence a Vespasiano, mas tem passagem para Muçum. Então, era turismo. Ia ter agora o Trem dos Vales, só que agora não sei se vai ter esse novo turismo aqui no Rio Grande do Sul
Ari José Bordignon

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Suspeita de leptospirose

Com a água da enchente que invadiu sua casa, Bordignon está com as mãos muito inchadas. Ele afirma que tinha algumas feridas nas mãos e que, depois da inundação, os ferimentos ficaram roxos e doloridos.

"Sou funcionário público, operador de máquina. Eu trabalho com um trator que tem aquela bomba que pega água e leva nas casas para estocar. Aí eu pego na mangueira e mexo na água, na lama. Eu tenho que trabalhar no meio da lama, com as mãos sem luva", explica.

Ele disse que passou por tratamento médico. E recebeu como diagnóstico a suspeita de leptospirose, uma doença infecciosa causada pela bactéria do gênero Leptospira, comumente adquirida através do contato com água ou solo contaminados pela urina de animais infectados.

O Ministério da Saúde recomentou que casos suspeitos de leptospirose no Rio Grande do Sul devem iniciar o tratamento contra a doença imediatamente, sem a necessidade de confirmação laboratorial.

Quintal da casa de Ari José Bordignon, em Vespasiano Correa, no Rio Grande do Sul, durante enchente
Quintal da casa de Ari José Bordignon, em Vespasiano Correa, no Rio Grande do Sul, durante enchente Imagem: Arquivo pessoal
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Aquecimento global

Ele afirma que, antes das enchentes, Muçum sobreviveu a três anos de seca. Para o morador, não é correto afirmar que ocorreu um desastre natural: "Não é a natureza. A natureza é sábia, ela é forte. Os culpados somos nós, os seres humanos. As consequências a gente está vivendo agora."

Para que fizeram pontes? Tráfico, contrabando, sonegação? Pequenos lagos são barrados para baixo da terra para o progresso? Por isso eu chorei minhas barreiras para morro abaixo, levando tudo que está me sufocando com a poluição e a contaminação do meio ambiente
Ari José Bordignon

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