R$ 10 mil só em guarda-chuva: por que peça é moda nos bailes funk de SP

A música começa e os guarda-chuvas já estão abertos. Mas não pensa que eles são para se proteger da chuva —os objetos são moda nos bailes funk de São Paulo. Aliás, ponto importante: não se fala guarda-chuva, mas umbrella (versão em inglês da palavra).

São itens caros, de marcas famosas entre os frequentadores dos bailes. Os preços costumam partir de R$ 100, normalmente réplicas, mas há originais de até R$ 10 mil.

"Já gastei uns R$ 5.000 só em guarda-chuva", conta o operador de máquinas Mateus de Araújo, 24, conhecido nas redes sociais como o "Brabo da umbrella", depois que viralizou mostrando os acessórios.

"Uns amigos meus tinham. Aí peguei, gostei e comprei. Não achei estranho, achei diferente e quis." A umbrella de estreia chegou em 2019, uma réplica de R$ 300. A primeira original, de R$ 1.000, veio em 2022.

Tem gente que critica, mas é o que eu gosto. Tem quem gasta horrores com coisas de marca, com tênis. Eu compro guarda-chuva. Se tem dinheiro, vai lá e compra. Mateus de Araújo, conhecido como o 'Brabo da umbrella'

"Tem as umbrellas falsas e as verdadeiras, mas hoje em dia até as réplicas estão caras. Como foi pegando moda, os caras sobem o preço", diz Mateus. Essa alta no valor dificulta o acesso, por isso as umbrellas são menos frequentes agora do que em anos anteriores, sobretudo nos pré-pandemia.

Por que usar? Status, para completar o "kit" e até dançar

Umbrellas para o alto em foto de 2019, no baile da DZ17, em Paraisópolis
Umbrellas para o alto em foto de 2019, no baile da DZ17, em Paraisópolis Imagem: Marlene Bergamo/Folhapress

O costume foi copiado de raves dos EUA, onde as pessoas usam o objeto por uma função prática: se proteger do sol e da chuva, já que os eventos duram dias.

Continua após a publicidade

Em São Paulo, a umbrella segue o vestuário dos bailes, chamado de "kit", ou seja, o conjunto de roupas e acessórios de uma mesma marca. "Eu vou com a umbrella da mesma marca da roupa. Tem gente que não combina, mas eu prefiro", diz Mateus. Os "kits" são um símbolo de ostentação, cultura marcante no funk, em que usar itens caros é um desejo da maioria (também como forma de mostrar status).

Além disso, reconhecer a umbrella de longe, principalmente versões chamativas, é uma forma de identificar o seu grupo. "Marco com os amigos, falo que tô chegando e já abro logo para eles me acharem pelo guarda-chuva", conta Mateus.

Mas não é só estética. O movimento dos acessórios faz vento e refresca, em caso de calor. Além disso, usá-los para dançar já é tendência —são as umbrellas "de manobra", explica Mateus. Inclusive, alguns funks pedem na letra para "balançar o guarda-chuva".

Tudo começa por uma função prática, útil na vida, como nas raves americanas. Mas não se exclui o lado estético, lembrando que a ostentação está presente na cultura do funk de uma forma geral. O uso dos guarda-chuvas é interessante e é uma característica do funk em São Paulo. Thiago de Souza, do Canal do Thiagson (YouTube) e doutorando em funk na USP

'Umbrella é mais famosa que eu'

Mateus deseja uma umbrella de R$ 2.500. "Tô para comprar", diz. A mais cara que ele tem é um modelo de R$ 1.000, a sua primeira original e que diz ter poucas unidades no Brasil. Pela raridade, o guarda-chuva virou uma atração.

Continua após a publicidade

Chamava a atenção, porque era quase a única. Todo mundo queria ver, estar perto. Sempre que me veem com ela, todo mundo já fala, quer tirar foto, balançar a umbrella. Ela é mais famosa que eu. Mateus de Araújo, o 'Brabo da umbrella'

Mateus evita sair com as umbrellas originais por medo de roubo e gastos com manutenção --que também é cara
Mateus evita sair com as umbrellas originais por medo de roubo e gastos com manutenção --que também é cara Imagem: Arquivo pessoal

O sucesso gera cuidado. Mateus conta que evita sair com essa umbrella rara por receio de roubos. Ele nunca foi roubado, mas amigos já. "Pegaram o guarda-chuva fechado na mão dele. Os caras veem e roubam mesmo."

Há outro motivo para evitar as versões originais: o risco de estragá-las. O sucesso das umbrellas nos bailes alimentou o mercado de manutenção dos acessórios, que cobra caro. Não é raro varetas quebrarem, e Mateus já pagou R$ 60 em apenas uma unidade original. "Eu aprendi a arrumar, mas antes disso era mais R$ 60 só de mão de obra."

"Se eu conservar, consigo vender pelo mesmo preço que eu paguei. Mas, se trocar detalhes originais por peças falsas, o preço abaixa", explica ele.

Deixe seu comentário

Só para assinantes