MPF investiga se Fraport fragilizou sistema contra cheias de Porto Alegre
O Ministério Público Federal vai investigar uma denúncia do deputado estadual Matheus Gomes (Psol) contra a concessionária Fraport, que administra o Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre. De acordo com o parlamentar, a empresa ignorou pareceres técnicos e fragilizou o Sistema de Contenção de Enchentes para expandir o aeroporto.
O que aconteceu
A empresa Fraport, responsável pela administração do Aeroporto Salgado Filho, realizou obras de ampliação que, segundo a denúncia, ignoraram as normas de segurança. O projeto original previa medidas para evitar sobrecarga no sistema de drenagem da cidade durante as chuvas. No entanto, a Fraport não as executou e ainda barrou a fiscalização das obras, segundo o deputado. A empresa nega.
As obras da Fraport comprometeram o SPCC (Sistema de Proteção Contra Cheias) de Porto Alegre, segundo Gomes. As mudanças no sistema de drenagem do aeroporto criaram um novo caminho para a água da chuva, sobrecarregando o SPCC e aumentando o risco de alagamentos. O deputado que essa situação pode ter contribuído para as inundações que atingiram a zona norte da cidade em maio de 2024.
O parlamentar afirma que o projeto de expansão do aeroporto foi contra as diretrizes do Sistema de Contenção de Enchentes de Porto Alegre. Ele acusa a Prefeitura de Porto Alegre de não ter barrado as obras, mesmo com indícios de prejuízos ao sistema.
O deputado fez denúncia ao Ministério Público Federal sobre o caso. Além do MPF, um ofício foi encaminhado ao ministro Paulo Pimenta, Secretaria Extraordinária de Apoio ao Rio Grande do Sul, à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e à Câmara de Vereadores de Porto Alegre.
MPF vai apurar a representação. O órgão informou que o documento já foi distribuído a um gabinete e aguarda análise inicial. A denúncia foi feita com base em documentos do extinto DEP (Departamento de Esgotos Pluviais), do Dmae (Departamento Municipal de Água e Esgotos) e da Fraport, obtidos pelo parlamentar.
O que dizem os documentos
Segundo os documentos, a administração do aeroporto sabia dos riscos de enchentes na área por conta da localização, próxima ao Rio Gravataí. A Cauge (Comissão de Análise Urbanística e Gerenciamento) destacou que a expansão deveria levar em conta esses problemas.
O deputado diz que a concessionária foi avisada dos riscos. Segundo o parlamentar, foi enfatizado que as obras de ampliação, como a expansão da pista de pouso, iriam aumentar a área afetada pelas cheias. E que essa obra iria contra o Sistema de Contenção.
A Fraport nega o conteúdo da denúncia. A empresa afirma que "o sistema foi devidamente autorizado e acompanhado pelas autoridades". (Veja nota completa abaixo)
"Acelerar obra e lucrar"
Pareceres técnicos para a análise das obras e do Estudo de Viabilidade Urbanística foram iniciados, mas não foram concluídos. Para o deputado, que diz ter consultado técnicos para emitir ofício de denúncia, a Fraport contrariou as recomendações do EVU (Estudo de Viabilidade Urbanística), apresentando dados imprecisos e erros. Mesmo assim, o projeto teria ido para frente - sob conhecimento do poder municipal.
Em meio a tudo isso, disputas sobre a responsabilidade pela manutenção e operação dos sistemas de drenagem entre a Fraport e o poder público municipal surgiram. A Fraport indicou resistência à fiscalização municipal e se responsabilizou pela manutenção interna, enquanto questões sobre o impacto das obras na infraestrutura pública externa não foram completamente resolvidas por parte da prefeitura, de acordo com o deputado.
Em 2019, o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental teria tido seu trabalho interrompido por interferência política. Para o parlamentar, a então gestão permitiu que as obras fossem iniciadas mesmo com a análise incompleta.
Para o deputado estadual, a concessionária acelerou as obras e tentou economizar no projeto, com o intuito de lucrar. Os técnicos, segundo os documentos, não emitiram permissão para e expansão. A Prefeitura, em suas duas últimas gestões, afirma, teria autorizado o projeto de expansão da pista sem um projeto de drenagem.
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Quero receberO UOL procurou a Prefeitura de Porto Alegre, mas não houve resposta até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestação.
Concessionária diz que investiu R$ 170 milhões no sistema. "O sistema de Micro e Macrodrenagem no aeroporto de Porto Alegre, que trouxe benefícios diretos à população do entorno, foi devidamente autorizado e acompanhado pelas autoridades, tendo como premissas principais manter as condições de projeto do entorno aeroporto e a segurança operacional das atividades aeroportuárias", disse a Fraport.
Eles criaram uma bacia que não tem cálculo de vasão. Um sistema concorrente ao nosso Sistema. O aeroporto está perto do Guaíba, do Gravataí, está num arroio. Qualquer erro, não tem como. Dentro do aeroporto passa uma casa de bombas. Passa um conduto forçado, tem os arroios e tem o dique. As pessoas que moravam ali em cima tiveram que ser removidas para a ampliação do aeroporto. Não tinha que fazer um sistema concorrente, deveria ter sido pensando em prevenção para evitar esses problemas. Havia um risco pela complexidade das obras. (...) Se eles fizessem tudo certinho, seria muito mais caro. Um investimento bem maior. Fizeram grandes obras, mas fizeram erradas. Houve essa opção por economizar.
Deputado Matheus Gomes (Psol)
Outro lado
"A Fraport Brasil informa que o sistema de Micro e Macrodrenagem no aeroporto de Porto Alegre, que trouxe benefícios diretos à população do entorno, foi devidamente autorizado e acompanhado pelas autoridades, tendo como premissas principais manter as condições de projeto do entorno aeroporto e a segurança operacional das atividades aeroportuárias.
O problema de alagamentos na Zona Norte de Porto Alegre, que inclui o aeroporto, é histórico, e existe muito antes de a Fraport assumir a operação do Aeroporto Internacional Salgado Filho - na data de 2 de janeiro de 2018. Tal problemática era conhecida tanto pela concessionária anterior, quanto pelas demais autoridades municipal, estadual e federal.
Era sabido, desde o momento que a Fraport assumiu a gestão do Aeroporto de Porto Alegre, que o sistema de pista apresentava problemas de segurança devido às inundações, causadas pelo mau funcionamento do conduto forçado. Apesar de não fazer parte do escopo do contrato de concessão, a Fraport investiu cerca de R$ 170 milhões em um robusto sistema que atende as normas de drenagem do município.
O novo sistema de drenagem, inaugurado em 2021 é dividido em cinco bacias de acumulação das águas da chuva. A água é amortecida e acumulada nestes reservatórios e, por meio da gravidade e de casas de bombas, é direcionada ou para o Rio Gravataí ou para a Casa de Bombas 6 da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Todas as cinco bacias coletam água da chuva do aeroporto. No entanto, nas bacias 1, 2 e 5, 92% das águas coletadas são provenientes das precipitações que ocorrem nas áreas da cidade de Porto Alegre. Apenas 8% são precipitações coletadas estão na área do Aeroporto. Como mencionado, em apoio a operação deste sistema, existem oito Casas de Bombas (CB) operadas por energia elétrica com redundância por grupos geradores individuais.
De forma prática, o sistema permite um amortecimento das precipitações através das bacias de detenção. A água recebida é então amortecida e liberada em velocidades inferiores às máximas definidas no Manual de Drenagem do Município de Porto Alegre para o escoamento ao Arroio Areia e Rio Gravataí.
Diante de todos os esclarecimentos feitos, pode-se concluir que o sistema de Micro e Macrodrenagem implementado no Aeroporto Internacional Salgado Filho é superior, seguro, e já deu amostras de seu pleno e seguro funcionamento nos últimos quatro anos, tendo contribuído imensamente para a segurança da aviação e qualidade de vida daqueles que vivem nas adjacências do sítio aeroportuário".
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