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40 milicianos entram em favela no RJ; como funciona organização criminosa?

Colaboração para o UOL*

21/10/2024 12h07

Uma ação do Bope (Batalhão de Operações Especiais) da Polícia Militar do Rio de Janeiro frustrou um plano da facção criminosa CV (Comando Vermelho) na última quarta-feira (16), em uma missão que acabou abrindo espaço para que milicianos retomassem a favela da Muzema, na zona oeste da cidade.

O que são e como funcionam as milícias?

Grupos começaram a se formar na década de 1980 e, atualmente, possuem forte atuação em comunidades do Rio de Janeiro. As milícias se tornaram organizações criminosas que exploram atividades econômicas nas comunidades periféricas, com auxílio ou protagonismo de policiais e bombeiros, que se organizam para combater os traficantes locais e, eventualmente, ocuparem seu lugar.

Na estrutura e na atuação de um grupo miliciano, algumas características podem ser observadas. São elas: controle de um território e da população que nele habita por parte de um grupo armado irregular; caráter coativo desse controle; objetivo de lucro individual como motivação central; participação ativa e reconhecida dos agentes do Estado; e discurso de legitimação referido à proteção dos moradores e à instauração de uma ordem.

Milícia domina serviços básicos oferecidos aos moradores das comunidades controladas. Para expandir o poder, a influência e o controle sobre a população local, o grupo passa a comandar a venda de produtos como água, gás de cozinha e TV a cabo, além de outros itens de primeira necessidade das famílias. A milícia lucra, também, com o tráfico de drogas que circula na comunidade em questão. Muitas vezes, os moradores precisam pagar uma taxa aos milicianos que comandam o local.

Segundo especialistas, a atuação das milícias se adaptou ao longo dos anos. "Sempre houve a existência de milícias que traficavam, mas era uma minoria. Ainda há um discurso para dentro das comunidades dominadas. Porém, na medida em que não há mais um discurso público de legitimação, que a alegada 'cruzada contra as drogas' não faz mais sentido, isso reforça a tendência a fazer do tráfico uma das fontes do negócio, já que não há mais essa desculpa de libertação", explica o sociólogo Ignácio Cano, um dos maiores especialistas do país no assunto.

O Estado nunca desenvolveu uma estratégia de recuperação dos territórios dominados pelas milícias, como fez com o tráfico, por exemplo, por meio das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora). O Estado só investiga e, eventualmente, prende, mas nunca desenvolveu uma política capaz de retirar o controle territorial. Ignácio Cano, em entrevista ao UOL em 2018

Milícias continuam ganhando espaço no Rio de Janeiro. Segundo Vinícius George, delegado aposentado e coordenador dos trabalhos da CPI das Milícias em 2008, os partidos políticos não expulsaram os milicianos de seus quadros, não cortaram relações políticas pré-existentes e admitiram, ainda, novos milicianos como filiados. No entanto, de acordo com ele, os milicianos perceberam que a superexposição causada pelos mandatos políticos criou uma "situação ruim para os negócios", atuando, por vezes, de forma mais discreta nas comunidades.

O que aconteceu

Integrantes do CV articularam ataque para dominar Rio das Pedras, reduto da milícia mais antiga da cidade do Rio de Janeiro. O plano, no entanto, foi descoberto pelo setor de inteligência da PM. O Bope descobriu, também, que o armamento que seria utilizado na incursão estaria escondido na favela da Tijuquinha, comunidade dominada por associados ao CV.

Na manhã da última quarta-feira (16), o Bope realizou uma operação para procurar o depósito do CV na Tijuquinha. A facção reagiu sequestrando nove ônibus e posicionando os veículos como barricadas em vias próximas de Itanhangá, Tijuquinha, Muzema e Vila da Paz.

Segundo a PM, o sequestro dos ônibus tinha a intenção de desviar o foco dos policiais. De acordo com oficiais da PM e de policiais civis entrevistados pelo UOL, os criminosos ligados ao CV na região, diante da ação do Bope, decidiram recuar no plano de invasão a Rio das Pedras e, provavelmente, trocaram de lugar o armamento que seria utilizado na invasão.

Recuo do CV abriu espaço para que milicianos retomassem a comunidade da Muzema, que havia sido "perdida" para a facção. Na manhã do último sábado (19), cerca de 40 milicianos entraram na favela e anunciaram aos moradores que o tráfico de drogas não voltaria para o local. Na ocasião, o grupo de milicianos estava fardado de preto e portava armamento pesado.

Interesse de chefes do CV nas áreas dominadas por milicianos na zona oeste ocorre por conta do lucro gerado na região. Assim que tomam as comunidades controladas pela milícia, os faccionados aproveitam a estrutura financeira montada pelos milicianos, dando sequência aos esquemas feitos no local.

*Com informações de matéria publicada em 24/10/2023.

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