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Chanceler de Bolsonaro critica alarmismo climático e pautas anticristãs

14.nov.2018 - O futuro ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Fraga Araújo - Valter Campanato/Agência Brasil
14.nov.2018 - O futuro ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Fraga Araújo Imagem: Valter Campanato/Agência Brasil

Marcelo Freire

Do UOL, em São Paulo

27/11/2018 12h01

O embaixador Ernesto Araújo, escolhido pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) para chefiar o Ministério das Relações Exteriores do Brasil a partir de janeiro, escreveu um artigo para o jornal Gazeta do Povo no qual indica suas diretrizes no comando do Itamaraty.

No texto intitulado "Mandato popular na política externa", Araújo afirma que seguirá as orientações de Bolsonaro de "libertar o Itamaraty" e combater o que ele chamou de "ideologia marxista" que está presente no órgão de diplomacia brasileiro.

Dentre os elementos criticados por Araújo, estão o que ele chamou de "alarmismo climático", "a adesão às pautas abortistas e anticristãs nos foros multilaterais" e "a destruição da identidade dos povos por meio da imigração ilimitada". Araújo não se aprofunda em nenhum desses temas, mas enumera o que chama de "elementos da 'ideologia do PT', ou seja, do marxismo, que ainda estão muito presentes no Itamaraty".

O texto também aponta uma postura defensiva do novo chanceler, com críticas à imprensa, a diplomatas e a pessoas que pedem o combate à "ideologia do PT" no Itamaraty mas que não concordam com o ataque ao "marxismo cultural" definido por Araújo. O futuro ministro também se mostra alinhado com os conceitos defendidos por Bolsonaro na política externa do novo governo.

"Queriam um ministro das Relações Envergonhadas"

Logo no primeiro parágrafo do artigo, Araújo se coloca ao lado do novo presidente e ataca aqueles "que gostariam que que o presidente eleito Jair Bolsonaro tivesse escolhido um chanceler que saísse pelo mundo pedindo desculpas".

O texto também dá sinais do tom que o futuro chanceler dará às relações exteriores:

Queriam uma espécie de Ministro das Relações Envergonhadas que chegasse aos parceiros dizendo algo como 'Olhem, os brasileiros elegeram Bolsonaro. Não posso fazer nada, é a democracia. Sabem como é, o povo não entende nada. Mas fiquem tranquilos, pois aqui, na frente externa, nada vai mudar'

"Alguém desse tipo é o chanceler que os comentaristas da imprensa tradicional – nutridos pela convivência com diplomatas pretensiosos – gostariam de ver. Alguém que enquadrasse o novo presidente, pasteurizasse as suas ideias, freasse o seu ímpeto de regeneração nacional, sob a desculpa de que política externa é algo demasiado técnico para ser entendido por um simples presidente da República, muito menos por seus eleitores."

Em seguida, ele cita a prevalência de uma tese, "nesses meios", "de que um presidente pode mudar tudo, menos a política externa. Para eles, a política externa seria uma região fechada ao mandato popular, uma espécie de no-go zone fechada ao povo; o Itamaraty seria um Estado dentro do Estado, onde o Presidente só aparece como um convidado ilustre nos jantares oficiais, mas não tem voz efetiva".

"Isso é um gigantesco equívoco", prossegue. "Em uma democracia, a vontade do povo deve penetrar em todas as políticas. Mas as pessoas daquele sistema midiático-burocrático, que gostam tanto de falar em democracia, não sabem disso. Perguntam-se, assustadas: 'O que vão pensar de mim os funcionários da ONU, o que vai dizer de mim o New York Times, o que vai dizer o The Guardian, o Le Monde?'", escreve o novo ministro, citando jornais da imprensa internacional.

Na sequência, Araújo diz que a política externa do país precisa se relacionar com "o sofrimento, a paixão e a fibra" da população do Brasil. "E o povo brasileiro? Vocês não se preocupam com o que o povo brasileiro vai pensar de vocês? Sabem quem é o povo brasileiro? Já viram? Já viram a moça que espera o ônibus às 4 horas da manhã para ir trabalhar, com medo de ser assaltada ou estuprada? A mulher que leva a filha doente numa cadeira de rodas precária, empurrando-a de hospital em hospital sem conseguir atendimento?"

"Alguns jornalistas estão escandalizados, alguns colegas diplomatas estão revoltados. Revoltados por quê? Porque pela primeira vez terão de olhar o seu próprio povo na cara e escutar a sua voz?", enfatiza.

"Ideologia do PT", "marxismo cultural" e política externa

A segunda parte do texto está na explicação do novo chanceler sobre seu próprio pensamento em torno da "libertação do Itamaraty". Ele direciona seus argumentos, segundo ele, a quem "quer extirpar" a "ideologia do PT" da política externa brasileira sem entender que isso se trata de um combate ao marxismo"".

"Você, leitor, diz que quer acabar com a ideologia em política externa? Eu também quero. Essa é a principal missão que o presidente Bolsonaro me confiou: 'libertar o Itamaraty' (...) Mas você sabe em que consiste a ideologia que diz ser preciso eliminar? Você diz que é contra a ideologia, mas, quando eu digo que sou contra o marxismo em todas as suas formas, você reclama. Quando me posiciono, por exemplo, contra a ideologia de gênero, contra o materialismo, contra o cerceamento da liberdade de pensar e falar, você me chama de maluco. Mas, se isso não é o marxismo, com estes e outros de seus muitos desdobramentos, então qual é a ideologia que você quer extirpar da política externa?"

"As coisas que eu critico, critico-as porque sei que são parte e continuação da ideologia que você diz repudiar. O alarmismo climático (sobre o qual falarei em outra oportunidade), o terceiro-mundismo automático e outros arranjos falsamente anti-hegemônicos, a adesão às pautas abortistas e anticristãs nos foros multilaterais, a destruição da identidade dos povos por meio da imigração ilimitada, a transferência brutal de poder econômico em favor de países não democráticos e marxistas, a suavização no tratamento dado à ditadura venezuelana, tudo isso são elementos da 'ideologia do PT', ou seja, do marxismo, que ainda estão muito presentes no Itamaraty."

"Se você repudia a 'ideologia do PT', mas não sabe o que ela é, desculpe, mas você não está capacitado para combatê-la e retirá-la do Itamaraty ou de onde quer que seja. Ao contrário, você está ajudando a perpetuá-la sob novas formas", sugere.

No fim, ele diz que "para curar uma doença, não basta dizer que a detestamos, é preciso conhecer suas causas e manifestações, suas estratégias e seus disfarces." "Você é contra a ideologia? Então é preciso alguém que entenda de ideologia. (...) Você é a favor da democracia? Então deixe o povo brasileiro entrar na política externa."