Karaokê, bebidas e brigas: o que diz relatório do 'partygate' inglês
Foi publicado hoje o relatório final sobre festas realizadas na sede do governo britânico durante períodos de lockdown pela Covid-19, entre 2020 e 2021. Segundo os achados compilados por Sue Gray, funcionária de alto escalão do gabinete do primeiro-ministro Boris Johson, foram analisados 13 eventos no número 10 da Downing Street — todos "difíceis de justificar" em meio à pandemia e às restrições impostas aos britânicos, descreveu.
"Muitos desses eventos não deveriam ter ocorrido", conclui o relatório de Sue Gray. "Os altos cargos envolvidos, tanto políticos quanto funcionários, devem assumir a responsabilidade por essa cultura", enfatizou.
Entre os presentes em alguns dos eventos, estava Boris Johnson, que fez um discurso perante o Parlamento assumindo "total responsabilidade" pelas festas realizadas em Downing Street. Na segunda-feira (23), fotos de Johnson bebendo com colaboradores em festas realizadas em sua residência oficial foram divulgadas por um canal de TV britânico. Outras imagens compõem o relatório final.
Considerada rigorosa e implacável, Sue Gray começou a investigar há meses várias festas celebradas em Downing Street quando as regras contra a Covid-19 impediam os britânicos de se reunir, inclusive em funerais. A pandemia causou 178.000 mortes no Reino Unido.
Gray terminou seu relatório em janeiro, mas a polícia decidiu abrir sua própria investigação e a parlamentar foi obrigada a publicar uma versão editada das conclusões, omitindo detalhes para não não interferir nas investigações.
A Scotland Yard encerrou a investigação na semana passada, com 126 multas a 83 pessoas por oito festas. Johnson, sua esposa Carrie e o ministro de Finanças, Rishi Sunak, receberam uma única sanção da polícia pelo o menos importante dos encontros: a festa de 56 anos do premiê, celebrada em 19 de junho de 2020, na sala de conselho de ministros.
Detalhes do relatório
A primeira festa ocorre em maio de 2020, quando as regras impostas aos britânicos ainda proibiam encontros na casa de terceiros. Em um e-mail, um funcionário de Downing Street convida os colegas para "alguns drinks com distanciamento social" devido ao bom tempo que se avizinhava. O convite foi enviado a cerca de 200 funcionários no total, devido à circulação entre as listas de distribuição do governo; compareceram cerca de 30.
Na ocasião, os funcionários avisam que o horário combinado para o encontro seria próximo ao final de uma coletiva de imprensa na sede do governo para atualizações sobre a pandemia. Todos foram alertados para tomarem cuidado ao circularem no local com "garrafas de vinho" devido às câmeras.
Outra festa, realizada em junho de 2020 para a despedida de um funcionário que deixava o governo, chegou a contar com um aparelho de karaoke e pizzas. O evento se alongou mais do que o anterior, o suficiente para registros de um funcionário que passou mal pelo consumo excessivo de bebida e de um desentendimento entre outros dois presentes. O último a sair deixou a sala do Secretário de Gabinete de Boris Johnson depois das 3 da manhã.
O primeiro-ministro é citado em duas ocasiões: uma no dia de seu aniversário e outra na despedida de um dos membros da equipe. Para o primeiro encontro, o convite enviado pelo secretário particular de Boris Johnson incluiu o secretário para a Covid-19 e Resposta à Pandemia do Reino Unido, Simon Case, mas Sue Gray pontua que não ficou claro se ele chegou a vê-lo de fato. A festa durou entre 20 e 30 minutos.
"Total responsabilidade"
Nesta quarta-feira (25), o primeiro-ministro declarou ter "total responsabilidade" pelas festas realizadas em Downing Street. Ele insistiu que sua participação nos eventos "infringiu as regras". Mesmo assim, Johnson voltou a rejeitar a possibilidade de renunciar ao cargo. "Mas levando em conta tudo o que está acontecendo, acredito que é minha responsabilidade seguir em frente" com "prioridades" como a guerra da Ucrânia e a crise do custo de vida, disse no discurso.
Johnson se justificou dizendo que, em plena pandemia, seus colaboradores trabalharam muitas horas e era difícil "definir a fronteira entre trabalhar e socializar", mas reconheceu que "muitas destas reuniões se prolongaram mais do que o necessário, infringindo as normas". Segundo ele, desde então, foram realizadas importantes mudanças na gestão de seu gabinete.
A oposição e alguns deputados da maioria conservadora denunciam que ele mentiu conscientemente. Em reação, após a publicação do relatório de Gray, foi aprovada a abertura de uma comissão parlamentar para determinar se Johnson enganou o Parlamento — o que, de acordo com o código de conduta, deveria implicar em sua demissão.
*Com informações da AFP e FRI
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