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EUA: Preso é executado após promotoria dizer que ele poderia ser inocente

O detento condenado por homicídio Marcellus Williams, 55, morreu após aplicação de injeção letal no Missouri (EUA) nesta terça-feira (24). A morte ocorreu poucas horas depois que a Suprema Corte dos Estados Unidos negou a última apelação da defesa dele e da própria promotoria, que apontou que ele poderia ser inocente.

O que aconteceu

Marcellus foi condenado pelo assassinato de Felicia Gayle. A ex-repórter foi encontrada morta a facadas em sua casa em 1998. O homem e sua defesa sempre disseram que ele era inocente. Ele foi condenado pelo crime em 2001.

A aplicação da injeção letal no condenado estava prevista para ocorrer nesta terça, às 18h (horário local; 20h horário de Brasília). Segundo a CNN Internacional e a NBC News, ele foi declarado morto às 18h10 em uma prisão estadual na cidade de Bonne Terre, no Missouri.

Antes da aplicação da injeção, um conselheiro espiritual estava sentado ao lado de Marcellus e pareceu conversar com ele. O filho do condenado e dois advogados assistiram à ação de outra sala, informou a ABC News. Anteriormente, a defesa informou que a equipe jurídica e a família veriam Marcellus antes da condução para a execução.

Com menos de 24 horas para a execução, o destino do preso estava nas mãos da Suprema Corte dos EUA. A Justiça poderia decidir manter ou alterar a pena capital até o último minuto antes do horário previsto para a execução de Marcellus. O tribunal superior não informou o porquê decidiu manter a condenação do homem, o que é comum para casos pautados com emergência na Corte.

Além da Suprema Corte dos EUA, o homem recebeu outras negativas. Na segunda-feira (23), a Suprema Corte do Missouri e o governador do estado, o republicano Mike Parson, mantiveram a aplicação da pena capital ao condenado.

A execução ocorreu mesmo após a própria família da vítima pedir que ele fosse poupado da morte.

Antes da execução, uma das advogadas do preso lamentou que o Estado matasse um "homem inocente". "Eles farão isso mesmo que o promotor não queira que ele [Marcellus] seja executado, os jurados que o sentenciaram à morte não queiram e os próprios familiares da vítima não queiram que ele seja executado", disse uma das advogadas de Williams, Tricia Rojo Bushnell, à CNN.

Temos um sistema que valoriza a finalidade em vez da justiça e este é o resultado que obteremos disso. É novidade para todos nós, e acho que deveria ser uma vergonha para todos nós, que temos um sistema que permite que um homem seja executado apesar de tudo isso. Realmente não é um sistema de justiça.
Tricia Rojo Bushnell, advogada de Marcellus

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Tentativas de apelação

Os promotores do condado e os advogados de defesa defenderam que as evidências do crime foram adulteradas e que o preconceito racial contaminou a investigação do caso. Recentemente, a promotoria do Saint Louis — a mesma que conduziu o julgamento e pediu a condenação do homem em 2001 — tentou tirar Marcellus, que o próprio órgão acredita ser inocente, do corredor da morte e anular a condenação dele por assassinato.

Na segunda-feira (23), a Suprema Corte estadual decidiu por unanimidade não interromper a execução. O governador também manteve a condenação e afirmou que Marcellus "esgotou" todo o devido processo e vias judiciais, incluindo mais de 15 audiências, para argumentar sua inocência e anular a condenação.

Nenhum júri ou tribunal, incluindo os níveis de julgamento, apelação e Suprema Corte, jamais encontraram mérito nas alegações de inocência do Sr. Williams. No final das contas, seu veredito de culpado e sentença de pena capital foram mantidos. Nada dos fatos reais deste caso me levou a acreditar na inocência dele, como tal, a punição dele será executada conforme ordenado pela Suprema Corte estadual.
Governador do Missouri, Mike Parson

No início deste mês, um juiz estadual já havia negado o pedido do preso para anular a sua condenação por assassinato. Segundo a revista People, o magistrado Bruce F. Hilton argumentou que "não havia base para um tribunal considerá-lo inocente". Os promotores do condado e os defensores do homem apontaram que a decisão foi "errada".

A defensora Tricia Rojo Bushnell disse anteriormente à CNN Internacional que os "tribunais deveriam intervir para evitar essa injustiça irreparável". Já o promotor público do condado Wesley Bell declarou que ele e outros defensores continuriam lutando até o fim para salvar a vida do condenado. "Mesmo para aqueles que discordam da pena de morte, quando há uma sombra de dúvida sobre a culpa de qualquer réu, a punição irreversível da execução não deve ser uma opção", falou.

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Defesa e promotoria apontam discriminação racial no caso

Um memorando de 73 páginas foi protocolado na Justiça no último fim de semana. Essa foi a tentativa mais recente de impedir a execução do preso com injeção letal. No documento, os promotores e advogados concordam que não há evidências forenses que ligam Marcellus à morte da ex-repórter Felicia Gayle. As pegadas ensanguentadas encontradas na casa da vítima não correspondiam com as do preso, assim como os pelos encontrados perto do corpo da mulher, também não eram dele. A faca de cozinha usada no crime também não tinham as impressões digitais de Marcellus.

No documento, a promotoria e a defesa pediram uma nova audiência para provar que os direitos constitucionais do preso foram supostamente violados em procedimentos anteriores. Eles citaram que havia indícios da "destruição de evidências potencialmente favoráveis (ao preso)", apontaram que a promotoria excluiu inadequadamente jurados negros por conta de sua raça e ressaltou que novos testes não encontraram vestígios do DNA de Williams na arma do crime, informou a Reuters.

O júri em que Marcellus foi condenado era composto por 11 pessoas brancas e somente uma pessoa negra. Todos decidiram condená-lo por homicídio em primeiro grau, roubo em primeiro grau, ação criminosa à mão armada e roubo. Na ocasião, a promotoria usou seis de nove sanções para manter jurados negros fora do caso, de acordo com um processo conjunto.

Promotor da época, Keith Larner, testemunhou no mês passado e diz que impediu a presença de um dos jurados porque achou que ele se parecia com o preso por ser negro. Ele apontou que ambos pareciam "irmãos", em parte por serem negros, jovens e usarem óculos, ressaltando que o jurado em potencial tinha os mesmos "olhos penetrantes" do preso.

"Havia um componente racial nisso", disse o outro advogado do preso, Jonathan Potts, em uma audiência da Suprema Corte do Missouri na segunda-feira. Porém, o Gabinete do Procurador-Geral do Missouri contestou essa interpretação do testemunho do promotor do julgamento.

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Todavia, o Innocence Project apelou à Suprema Corte dos EUA, citando o preconceito racial na seleção do júri e pedindo a suspensão da execução. No memorando, os promotores locais admitiram que o órgão atuou com o preconceito racial com pelo menos um jurado do caso.

Argumentos da defesa foram contestados

Há anos, a defesa tentava impedir a execução do homem, enquanto as solicitações já eram contestadas diversas vezes por autoridades estaduais. Provas que inocentariam Marcellus surgiram pela primeira vez há 7 anos. O ex-governador republicano Eric Greitens suspendeu a execução do preso por tempo indeterminado e formou um conselho para investigar seu caso e decidir se ele deveria receber clemência. Mas, em 2023, o governador republicano que assumiu o cargo dissolveu o conselho de inquérito criado para analisar essas evidências e revogou a suspensão.

DNAs encontrados na arma usada no crime eram do promotor assistente do caso e de um dos investigadores. Em depoimento, eles admitiram que manusearam a faca sem luvas, conforme o processo conjunto. Em 21 de agosto, os promotores do condado e a defesa do homem firmaram um acordo para tentar tirá-lo do corredor da morte. Todavia, pouco tempo depois, o procurador-geral Andrew Bailey impediu a conclusão do acordo.

Procurador-geral disse que as evidências em que o júri se baseou para condenação estavam "intactas". Ele acrescentou que itens pessoais da vítima foram achados no carro do homem após o assassinato e acrescentou que uma testemunha disse que o preso havia vendido o notebook da vítima para ele. Ainda segundo Baily, Marcellus teria confessado o crime para a sua namorada e um detento em uma cadeia municipal. A companheira do homem ainda relatou às autoridades que viu ele se desfazer das roupas ensanguentadas que teriam sido usadas no crime.

Um juiz estadual manteve a condenação no início deste mês, concluindo que a falta de evidências na faca não era suficiente para estabelecer sua inocência.

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Apesar das falas do procurador-geral, em janeiro, os promotores do condado declararam que o depoimento de uma testemunha foi "prejudicado". Eles também acrescentaram que a dupla de testemunhas se conheciam "e não eram confiáveis por mentirem para se ajudar". Eles apontaram que a única evidência física que corroborava a versão da namorada era o notebook da vítima que, segundo o Marcellus, sua companheira havia lhe dado para vender.

Procurados pela People, os gabinetes do governador e do procurador-geral não se manifestaram.

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