Trump usa tática 'golden shower' ao cutucar Canadá, Panamá e Groenlândia
Ao afirmar que o Canadá poderia se tornar o 51º estado norte-americano, que o Golfo do México vai se chamar Golfo da América e que tomaria à força o canal que liga o Atlântico ao Pacífico do Panamá e a Groenlândia da Dinamarca, Donald Trump causa alvoroço e se mantém como centro do debate público e onipresente para seus seguidores. Alerta de spoiler: vão ser, pelo menos, quatro anos disso, com ameaças que ele não vai cumprir.
Separar o que é realidade do que é apenas estratégia negocial ou de marketing político será o grande desafio para o jornalismo, a academia e a sociedade civil.
Não será fácil. Anúncios e entrevistas de presidentes dos Estados Unidos costumam ser globalmente relevantes, podendo derrubar mercados e acirrar conflitos. Não raro, declarações de assuntos complexos eram construídas para parecerem comentários fortuitos e discretos. Agora, estamos em um mundo em que o oposto disso acontece: bobagens podem se transformar em grandes discursos.
Manter o canal de comunicação é, não raro, mais importante que a mensagem em si. Se ela puder embutir uma teoria da conspiração ou um gatilho para disparar reação de extremistas, melhor ainda, porque vai manter seguidores e analistas entretidos por mais tempo. E esse burburinho ajuda a pressionar o que ele quer de fato — que, nestes casos, não é ocupar países vizinhos.
O pano de boa parte das ameaças feitas pelo presidente eleito é a tensão diante da expansão da China, que é real. Pode escalar ao nível de "deu ruim"? Pode. Mas não é tão simples, uma vez que os dois países são economicamente interdependentes - da gigantesca base industrial de carros e celulares para as norte-americanas Tesla e Apple até o imenso estoque de títulos do Tesouro Americano pelo governo de Pequim.
Separar o joio do trigo discursivo é difícil, mas necessário para não fazermos parte do jogo dele. Até porque ele indica que não se importará com o impacto de suas declarações se o resultado for favorável a ele.
No Brasil, vivemos quatro anos disso também, com o presidente Jair Bolsonaro sequestrando o debate público tanto para se manter no foco de atenção quanto para jogar fumaça em assuntos que não interessavam a ele. Como denúncias de rachadinhas ou acusações de que ajudou o coronavírus a se espalhar na pandemia.
Apesar de Bolsonaro ter usado a autocracia de Nicolás Maduro, na Venezuela, para produzir factóides e chamar a atenção, nos acostumamos a vê-lo comer frango com farofa de forma desagradável, divertir-se de jet ski enquanto cidadãos morriam por covid-19 ou em inundações ou compartilhar vídeo com um homem urinando sobre o outro no carnaval, perguntando sobre "golden shower" — prática de sentir prazer ao lançar ou receber do parceiro jatos de urina.
Trump também abraça a tática "golden shower". Mas, por enquanto está usando geopolítica para isso. Cada um tem a extrema direita que merece.