Diante de Putin, Lula diz que é crucial evitar escalada de Rússia x Ucrânia
O presidente Lula (PT) disse, em discurso por vídeo transmitido na cúpula do Brics, que é preciso evitar a escalada na guerra entre Rússia e Ucrânia. O encontro do Brics ocorre na Rússia, e a fala de Lula foi assistida pelo presidente Vladimir Putin.
O que aconteceu
Lula dedicou parte de seu discurso para repudiar as guerras, com críticas principalmente a Israel. O líder brasileiro parafraseou o presidente turco Recep Tayyip Erdogan ao dizer que Israel tornou a Faixa de Gaza no "maior cemitério de crianças e mulheres do mundo".
Depois citou brevemente o conflito entre Rússia e Ucrânia, sem mencionar Putin. "Evitar uma escalada e iniciar negociações de paz também é crucial no conflito entre Ucrânia e Rússia."
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Putin, anfitrião do encontro, assistiu à fala de Lula. Já o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, não estava, já que seu país não faz parte do Brics. Ele tem sido crítico à postura do governo brasileiro em relação à guerra. Em agosto, afirmou que Lula "vive narrativas da União Soviética" sobre guerra (veja mais abaixo).
Lula pediu união aos colegas "no momento em que enfrentamos duas guerras com potencial de se tornarem globais". "É fundamental resgatar nossa capacidade de trabalhar juntos em prol de objetivos comuns", disse. Outras autoridades estavam presentes, caso dos líderes da China, Xi Jinping, e do Irã, Masoud Pezeshkian.
O presidente do Brasil afirmou que as guerras não interessam aos pobres. "Muitos insistem em dividir o mundo entre amigos e inimigos. Mas os mais vulneráveis não estão interessados em dicotomias simplistas", afirmou.
O que eles [mais vulneráveis] querem é comida farta, trabalho digno, escolas e hospitais públicos de acesso universal e de qualidade (...) É uma vida de paz, sem armas que vitimam inocentes.
Lula, em discurso na cúpula do Brics
Críticas aos países ricos
Lula reforçou a importância dos Brics como contraponto aos países ricos. "Queremos reafirmar a vocação do bloco na luta por um mundo multipolar e por relações menos assimétricas entre os países", afirmou.
Ele responsabilizou os países ricos pelas crises climáticas. "Não há dúvida de que a maior responsabilidade recai sobre os países ricos, cujo histórico de emissões culminou na crise climática que nos aflige hoje", disse o presidente.
Lula também cobrou compromissos de países emergentes. "O planeta é um só e seu futuro depende da ação coletiva. Também cabe aos países emergentes fazer sua parte para limitar o aumento da temperatura global", disse.
O presidente criticou a concentração de poder entre os ricos. Falou em "acesso igualitário a vacinas e ferramentas de inteligência artificial". "Não podemos aceitar a imposição de 'apartheids' no acesso a vacinas e medicamentos, como ocorreu na pandemia, nem no desenvolvimento da Inteligência Artificial, que caminha para tornar-se privilégio de pouco", afirmou.
Lula participou de reunião por videoconferência porque sofreu um acidente doméstico no fim de semana. Ao cair no banheiro, bateu a cabeça e cortou a nuca. Ele cancelou a viagem à Rússia por recomendação médica.
Putin elogiou proposta de Brasil e China
Na semana passada, Putin afirmou que considera a proposta do Brasil e China para encontrar uma solução pacífica para a guerra na Ucrânia como "uma boa base". Contudo, lamentou que o governo ucraniano não esteja interessado em negociar. A fala do líder russo ocorreu antes do início da cúpula do Brics. Em setembro, os governos de Lula e Xi Jinping anunciaram a criação de um grupo de países para trabalhar em uma iniciativa diplomática que permita que uma eventual negociação possa ocorrer entre Moscou e Kiev.
O trabalho foi estabelecido a partir de uma proposta de Brasília e Pequim, costurada em maio e que prevê seis princípios. Um deles seria a convocação de uma conferência mundial com a participação de ucranianos e russos para que acordo seja estabelecido. Até hoje, todas as iniciativas de mediação envolvem ucranianos ou russos, mas não os dois países juntos.
Putin afirmou que os diplomatas de Brasil e China não consultaram previamente a Rússia sobre o projeto. "Só soubemos depois de publicado", disse. "Isso mostra que esses países não são manipulados por ninguém, nem pela Rússia", disse, lembrando que ambos são "muito próximos" de Moscou.
Zelensky já criticou Lula
Presidente da Ucrânia disse, em agosto, que Lula "vive narrativas da União Soviética" sobre guerra. Zelensky afirmou que o presidente do Brasil adotou postura de "retórica política". Em entrevista a Luciano Huck, para o jornal O Globo, o ucraniano também declarou ser grato pelo diálogo que teve com Lula em 2023.
Zelensky criticou o Brasil por ter assinado, ao lado da China, a proposta para negociações de paz no conflito. O líder ucraniano comentou que o conteúdo não tem efeitos práticos para solucionar a guerra.
Presidente da Ucrânia ressaltou que o Brasil é uma democracia, ao contrário de outros países que assinam a carta. "A China é um país democrático? Não. E o que dizer sobre o Irã? É um país democrático? Não. E o que dizer da Coreia do Norte? Eles não são países democráticos. Então, o que o Brasil, um grande país democrático, faz nessa companhia? Eu não consigo entender esse círculo de países. É normal quando você tem relações econômicas, mas estamos falando sobre uma guerra, não é sobre relações econômicas", afirmou.
Ele também se referiu ao que chamou de "plano chinês" como "apenas uma declaração política" restrita ao papel, sem efeitos concretos. "Eu entendo apenas propostas concretas e honestas. Eu falo pelas nossas vítimas, pelos nossos mortos. Então, se você quer nos ajudar a parar a guerra, ou nos ajudar a fazer com que o [Vladimir] Putin pare com a guerra, nós temos que nos unir", declarou, ressaltando que pretende apresentar em breve um plano de paz para pôr fim à guerra.