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Conversa entre Obama e Rowhani foi política hábil para ambos os lados, diz analista iraniano

Barack Obama conversa com o presidente iraniano Hassan Rowhani no salão oval da Casa Branca - Pete House/Casa Branca
Barack Obama conversa com o presidente iraniano Hassan Rowhani no salão oval da Casa Branca Imagem: Pete House/Casa Branca

Peter Baker

Em Washington (EUA)

28/09/2013 06h00

O relacionamento há muito fraturado entre os Estados Unidos e o Irã deu uma guinada significativa na sexta-feira (27), quando o presidente Barack Obama e o presidente Hasan Rowhani se tornaram os primeiros líderes de seus países a conversarem desde a crise dos reféns em Teerã, mais de três décadas atrás.

Em um telefonema arranjado às pressas, Obama contatou Rowhani enquanto este estava sendo levado ao aeroporto para voltar ao Irã, após uma agitada blitz diplomática e de mídia em Nova York. Os dois concordaram em acelerar as negociações visando acabar com a disputa em torno do programa nuclear do Irã e posteriormente expressaram otimismo diante de uma reaproximação que transformaria o Oriente Médio.

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"Resolver essa questão, obviamente, também poderia servir como um grande passo à frente em um novo relacionamento entre os Estados Unidos e a República Islâmica do Irã, um baseado em interesses mútuos e respeito mútuo", disse Obama, referindo-se ao programa nuclear de Teerã, aos repórteres na Casa Branca após o telefonema de 15 minutos. "Isso também ajudaria a facilitar um melhor relacionamento entre o Irã e a comunidade internacional, assim como outros na região."

Pelo Twitter, após o telefonema, Rowhani escreveu: "Em relação à questão nuclear, com vontade política, há um modo de resolver rapidamente a questão". Ele acrescentou que disse a Obama: "Nós estamos esperançosos a respeito do que veremos" dos Estados Unidos e outras grandes potências "nas próximas semanas e meses".

A conversa foi a primeira entre líderes iranianos e americanos desde 1979, quando o presidente Jimmy Carter falou por telefone com o xá Mohammed Reza Pahlavi pouco antes do xá deixar o país, segundo especialistas em Irã.

A Revolução Islâmica que derrubou o governo do xá levou à tomada da embaixada americana e a uma crise de reféns que durou 444 dias e deixou os dois países em conflito desde então. Apesar de tanto presidentes republicanos quanto democratas terem tentado dialogar com Teerã nesse ínterim, o contato se limitava a cartas ou a funcionários de escalão mais baixo.

O telefonema ocorreu poucos dias após Obama esperar encontrar Rowhani em um almoço na ONU, onde foi amplamente especulado que elas apertariam as mãos. Rowhani compareceu ao almoço e posteriormente indicou que era prematuro encontrar Obama. Mas uma reunião subsequente, na quinta-feira (26), entre o secretário de Estado americano, John Kerry, e o ministro das Relações Exteriores do Irã, Mohammad Javad Zarif, foi descrita como construtiva e levou as autoridades iranianas a contatarem a Casa Branca na sexta-feira (27), para sugerir o telefonema, segundo autoridades americanas.

Um alto funcionário do governo Obama, que falou com os repórteres sob a condição de anonimato, disse que a Casa Branca expressou aos iranianos o interesse do presidente em se encontrar com Rowhani nesta semana, mas ficou surpresa quando eles contataram o lado americano na sexta-feira (27) para sugerir o telefonema. Obama fez a chamada do Escritório Oval por volta das 14h30, acompanhado por assessores e um tradutor.

Ele começou parabenizando Rowhani por sua eleição em junho e lembrou a história de desconfiança entre as duas nações, mas também do que chamou de declarações construtivas feitas por Rowhani durante sua estadia em Nova York, segundo o funcionário. Grande parte do telefonema se concentrou na disputa nuclear, mas Obama pediu desculpas pelo trânsito de Nova York.

A ligação terminou em um tom educado, segundo o funcionário e a conta de Rowhani no Twitter. "Tenha um bom dia", disse Rowhani em inglês. "Obrigado", respondeu Obama, que então tentou se despedir em persa. "Khodahafez."

Ao conversarem por telefone em vez de pessoalmente, Rowhani evitou uma foto politicamente problemática de si mesmo ao lado de Obama, que poderia ter inflamado os linhas-duras no Irã, que já desconfiam de sua abertura para os Estados Unidos. Do modo como ocorreu, os elementos conservadores em Teerã já tentaram reinterpretar suas declarações reconhecendo o Holocausto enquanto esteve em Nova York. O canal de notícias estatal, a "Rede de Notícias da República Islâmica do Irã", não mencionou a conversa por telefone com Obama, já que passava da meia-noite de sexta-feira (27) quando surgiu a notícia.

 Mas o gabinete de Rowhani anunciou o telefonema em uma declaração divulgada pela agência de notícias estatal iraniana e assessores disseram que a conversa foi um passo significativo.

"Este contato por voz substituiu por ora o aperto de mãos de fato, mas isto é claramente o início de um processo que pode, no futuro, levar a um encontro pessoal entre ambos os líderes", disse Amir Mohebbian, um assessor político ligado ao líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei.

Abbas Milani, um acadêmico iraniano na Universidade de Stanford, disse que Rowhani queria evitar parecer estar fazendo concessões.

"Os Estados Unidos e o Ocidente decidiram sabiamente permitir que o regime faça suas alegações de vitória em casa, desde que atuem seriamente nas reuniões no exterior", disse Milani.

Um telefonema para um líder a caminho do aeroporto pode não ser o protocolo normal, ele acrescentou, mas "neste caso, foi uma política hábil para ambos os lados".

Ao anunciar a conversa telefônica com Rowhani, Obama disse que apenas "ações significativas, transparentes e verificáveis" a respeito do programa nuclear podem "proporcionar alívio" das sanções.

"Um caminho para um acordo significativo será difícil, e a esta altura ambos os lados têm preocupações significativas que terão que ser superadas", ele disse. "Mas eu acredito que temos a responsabilidade de buscar a diplomacia, e que temos uma oportunidade única de conseguir progresso com a nova liderança em Teerã."

Reconhecendo o quanto o esforço de contato é delicado, Obama buscou tranquilizar Israel de que não colocaria em risco a segurança do país aliado.

"Ao longo de todo esse processo, nós estaremos em contato estreito com nossos amigos e aliados na região, incluindo Israel", ele disse.

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, deverá visitar Obama na Casa Branca na segunda-feira (30).

Antes de partir de Nova York, Rowhani disse que seu governo apresentaria um plano em três semanas sobre como resolver o impasse nuclear.

"Eu espero que esta viagem seja o primeiro passo e o início de relações construtivas com os países do mundo", ele disse em uma coletiva de imprensa.

Ele disse que espera que a visita também melhore as relações "entre duas grande nações, o Irã e os Estados Unidos", acrescentando que a viagem superou suas expectativas.