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Empresas de maconha legalizadas enfrentam outro obstáculo nos EUA: impostos altos

Ian C. Bates/The New York Times
Imagem: Ian C. Bates/The New York Times

Jack Healy

Denver (EUA)

18/05/2015 06h00

Estava chovendo dinheiro nas cinco lojas de maconha de Bruce Nassau no Colorado quando o contador telefonou para ele com más notícias: o ano fiscal de 2014 estava chegando, e Nassau não podia contar com a miríade de deduções que as outras empresas usam para reduzir seus impostos. Ele ficaria devendo uma pequena fortuna à Receita Federal.

"Eu tive que fazer um cheque de US$ 275 mil", disse Nassau. "Inacreditável."

O rápido crescimento da indústria de maconha do país tem um problema fiscal. Muito embora cada vez mais Estados adotem a legalização da maconha, as empresas dizem que estão sendo obrigadas a pagar impostos federais exorbitantes por causa de uma lei antiga destinada a impedir que traficantes declarassem os custos de contrabando e transporte como despesas comerciais em suas declarações de Imposto de Renda.

O Congresso aprovou essa lei em 1982 depois que um traficante de cocaína e metanfetamina de Minneapolis, que havia sido preso por acusações de porte de drogas, foi a um tribunal fiscal para argumentar que o dinheiro que ele gastava com viagens, telefonemas, embalagens e até mesmo com uma pequena balança deveria ser considerado para dedução no Imposto de Renda. A lei, ainda aplicada pela Receita Federal, proíbe todos os créditos fiscais e deduções do "tráfico ilegal de drogas".

Donos de empresas do setor da maconha dizem que isso os impede de deduzir o aluguel, os salários de funcionários ou contas de serviços, obrigando-os a pagar impostos sobre uma renda muito maior do que as empresas de outros setores com as mesmas receitas e despesas. Eles também dizem que os impostos, que se aplicam aos vendedores de maconha medicinal e recreativa, estão dificultando a contratação, e até mesmo ameaçando expulsá-los do negócio.

A questão revela um abismo crescente entre os 23 estados mais o Distrito de Columbia, que permitem a maconha medicinal ou recreativa, e a burocracia federal, que inclui florestas federais no Colorado onde a posse é um crime federal, bancos regulados pelo governo federal que recusam empresas de maconha e as salas da Receita Federal (IRS, nos EUA).

Embora o presidente Barack Obama e altos funcionários federais tenham permitido que os Estados buscassem a legalização, os defensores da maconha dizem que a dissonância entre as leis estaduais cada vez mais permissivas e as proibições federais está criando um emaranhado de complicações e incertezas.

A disposição fiscal, uma regra obscura conhecida como 280E, pega muitos empresários de maconha de surpresa, muitas vezes sob a forma de um aviso de auditoria do IRS. Algumas empresas de maconha do Colorado, Califórnia e outros Estados amigáveis à maconha têm desafiado o IRS em tribunais fiscais.

Neste ano, a Allgreens, uma loja de maconha no Colorado, teve sucesso ao desafiar na Justiça uma política do IRS que impôs cerca de US$ 30 mil em multas por pagar os impostos da folha de pagamento em dinheiro – algo comum em um setor em que as empresas usam guardas armados e têm cofres recheados com dinheiro porque não podem ter conta em banco.

"Estamos falando sobre empresas legalizadas, empresas licenciadas", disse Rachel Gillette, diretora executiva da filial do Colorado da Organização Nacional pela Reforma das Leis da Maconha e advogada que representou a Allgreens. "Não há motivo nenhum para elas serem taxadas até a falência pelo governo federal.”

Uma empresa normal, por exemplo, pode pagar uma taxa federal de 30% sobre seu rendimento tributável, o que representaria sua renda bruta menos as despesas comerciais dedutíveis. Uma empresa de maconha, por outro lado, pode pagar a mesma taxa federal sobre todos os seus rendimentos brutos, porque não pode fazer essas deduções. A diferença pode aumentar a taxa de uma empresa de maconha para 70% ou mais do seu lucro.

Gillette diz que representou um proprietário de uma distribuidora de maconha que tinha recebido US$ 1,7 milhão no ano passado antes das despesas e recebeu uma conta de impostos de US$ 866 mil. Eles estão negociando com funcionários da Receita, disse ela.

O Colorado e um punhado de outros Estados mudaram suas leis fiscais para permitir que as empresas legalizadas de maconha tenham deduções em seu imposto estadual. E este mês, o senador Ron Wyden e o deputado Earl Blumenauer, ambos democratas de Oregon, que legalizaram a maconha recreativa no ano passado, lançaram um projeto de lei que permite que os empresários de maconha que cumprem a lei de seus Estados tenham deduções em seus impostos federais.

"Isso está afetando milhares de empresas, e está duplicando, triplicando, quadruplicando seus impostos", disse Blumenauer. "Isso as está paralisando."

O sistema atual, disse ele, incentiva que os vendedores de maconha apresentem declarações de Imposto de Renda que não seguem a lei, esperando não serem pegos pelo IRS.

Mas Kevin Sabet, presidente da Smart Approaches to Marijuana, um dos principais críticos da legalização, disse que não faz sentido dar "isenções fiscais a empresas que violam abertamente a lei federal com a venda de balas de goma e pirulitos de maconha."

Contadores e advogados fiscais, atualmente inundados de telefonemas de empresas de maconha, dizem que as leis não são claras e fazem pouco sentido. Se os varejistas de maconha dedicam parte de suas lojas para aulas de ioga, educação sobre drogas ou venda de outras mercadorias que não contenham a droga, eles podem deduzir parte de seu aluguel? Se os funcionários dividem o tempo entre a limpeza da loja e a venda de maconha, o salário deles é em parte dedutível?

"Não há uma direção clara", disse Scott Levy, contador do Arizona, que disse que os vendedores de maconha representam cerca de um quinto dos seus clientes. "Você encontra todas essas pequenas estratégias estranhas que as pessoas usam para tentar entender as definições."

Os donos de lojas que antes temiam batidas de policiais dizem que se orgulham de pagar impostos como qualquer outra empresa. Eles dizem que isso os tira da sombra e os distingue do mercado negro. Os defensores da maconha alardeiam os números de arrecadação de impostos para mostrar que o setor está derramando milhões de dólares nos orçamentos estaduais.

"É o último dominó que precisa cair para que sejamos tratados como qualquer outra empresa do país”, disse Tim Cullen, sócio de cinco lojas de maconha no Colorado. "Nós não somos traficantes de cocaína no mercado negro. Estamos totalmente legalizados e honestos. E gostaríamos de ser tratados como tal."

Tradutora: Eloise De Vylder