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Ação de operadoras de cartão de crédito dificulta vida de cafetões nos EUA

Alexander Zemlianichenko/AP
Imagem: Alexander Zemlianichenko/AP

Nicholas Kristof

07/08/2015 06h00

Na longa luta contra o tráfico sexual, finalmente tivemos um grande avanço!

Ele não veio do Congresso, ou da Casa Branca, da Justiça ou da polícia. Pelo contrário, veio de empresas de cartão de crédito: os cafetões não podem mais usar facilmente os cartões American Express, Visa ou MasterCard para pagar por anúncios de prostituição nos quais vendem meninas de 15 anos de idade como se fossem pizzas. 

Isso prejudicou o modelo de negócio do tráfico de sexo. Os proxenetes em todo o país estão tentando descobrir como pagar para promover seus anúncios com bitcoins! 

O tráfico de pessoas é um dos abusos dos direitos humanos mais insidiosos dos Estados Unidos -cerca de 100 mil menores são traficados para o comércio sexual a cada ano nos EUA. Então, permita-me explicar como chegamos a este triunfo sobre os traficantes. 

Há anos que o site chamado Backpage.com domina o ramo de publicidade do comércio sexual. Só em abril, ele publicou mais de 1,4 milhão de anúncios em sua seção de serviços para adultos nos Estados Unidos. Quase toda vez que uma garota é resgatada dos traficantes, verifica-se que ela era vendida no Backpage. 

No ano passado eu escrevi sobre uma menina de 15 anos desaparecida em Boston cujos pais estavam fora de si de tanta preocupação. Na sala de estar deles, peguei meu laptop, abri o site Backpage e rapidamente encontrei anúncios da menina seminua, mais tarde encontrada em um quarto de hotel com um cafetão armado. 

O Backpage está autorizado a operar por causa de uma brecha na Lei de Decência nas Comunicações. Procuradores gerais de 48 Estados imploraram ao Backpage para que parasse com esta exploração, sem efeito. Meninas vendidas no Backpage quando eram tão jovens quanto 13 anos processaram a empresa, mas perderam por causa da brecha. 

Então, de repente neste verão, aconteceu o milagre do mercado. 

O delegado Tom Dart, do Condado de Cook, Illinois, escreveu cartas duras para os cartões Visa e MasterCard, exortando-os a parar de permitir que seus cartões fossem usados para pagar por anúncios de sexo no Backpage. Ambas as empresas efetivamente concordaram. Para seu grande crédito, em abril a American Express parou de trabalhar com anúncios adultos do Backpage, de modo que, desde o início de julho, os cafetões estão sem uma maneira fácil de pagar pelos anúncios. 

Desconcertado, o Backpage respondeu oferecendo gratuitamente seus anúncios básicos de sexo, mas, mesmo com uma taxa para promover um anúncio gratuito, este não é um modelo de negócio que é sustentável. O Backpage está processando Dart, mas o meu sentimento é que os proxenetas não vão poder usar seus cartões de crédito novamente no site tão cedo. 

“Se ficar fora do ar por seis meses, são seis meses de crianças que não são estupradas”, diz Yiota Souras do Centro Nacional para Crianças Desaparecidas e Exploradas. 

Então, palmas para o American Express, MasterCard e Visa -e Dart- por obterem resultados onde o Congresso falhou. 

Ainda haverá tráfico de seres humanos, é claro, e proxenetas vão encontrar outras maneiras de vender crianças. Mas talvez não seja tão fácil para os traficantes quanto antes. 

“Eu fui anunciada no Backpage da mesma forma que um carro ou um telefone, mas com menos valor do que uma bicicleta”, me disse uma garota no ano passado. Ela contou que foi anunciada com 15 e 16 anos e estuprada 1.000 vezes como resultado. 

Meu palpite é que a maioria dos anúncios de sexo que aparecem no Backpage é de adultos que estão consentindo com a propaganda. Mas uma minoria significativa é de sexo com crianças ou com mulheres coagidas -representando uma das maiores e mais maltratadas classes de vítimas de direitos humanos nos EUA. Não temos autoridade moral para dizer a outros países para acabarem com as formas modernas de escravidão enquanto não limparmos nosso próprio quintal. 

Houve progresso em outras áreas também. A polícia nos Estados Unidos está perseguindo mais os cafetões, e às vezes também os clientes (o que ainda precisa acontecer mais). 

O modelo nórdico de combate ao tráfico e exploração, iniciado na Suécia, também tem ganhado terreno. Ele prevê a detenção dos clientes enquanto oferece ajuda para reconstruir as vidas das mulheres que estavam vendendo sexo. Nada funciona muito bem nas políticas para coibir o tráfico sexual, mas este modelo teve mais sucesso do que outras abordagens. 

No entanto, em alguns setores, ainda há uma miopia sobre o grau em que esta é uma questão de direitos humanos. Nos próximos dias, a Anistia Internacional vai considerar uma proposta que propõe a descriminalização total do comércio do sexo, inclusive para os clientes, seguindo a teoria de que isso iria beneficiar os trabalhadores do sexo. Bela teoria, mas errada. Ela foi tentada várias vezes e, invariavelmente, beneficiou os clientes enquanto exacerbou o abuso de mulheres e meninas: estimula o surgimento de um mercado clandestino paralelo para meninas menores de idade. 

Vamos torcer para que a Anistia Internacional recupere seus sentidos e, como diz Swanee Hunt, de Harvard, evite “endossar um dos maiores abusos de direitos humanos do nosso tempo”. Então poderemos voltar a celebrar as dificuldades dos traficantes sexuais nos Estados Unidos com o abalo em seu modelo de negócio. 

Tradução: Deborah Weinberg