A 'PEC Fórmula 1' e os gastos públicos do sistema eleitoral do Brasil

No Brasil, quem estuda, trabalha ou simplesmente gosta de Direito Eleitoral já deve ter percebido que, a cada intervalo entre as eleições, sempre nos anos ímpares, a legislação eleitoral sofre significativas alterações.

Duvida?

Numa listinha rápida, só nos últimos 10 anos, a Lei 9.504/97 (Lei das Eleições) foi alterada pelas leis 12.891/2013, 13.165/2015, 13.488/2017, 13.877/2019, e 14.192, 14.208 e 14.211 de 2021.

Em 2023, não está sendo diferente. De novo, vê-se uma correria legislativa para "corrigir distorções do sistema eleitoral" (segundo consta no relatório da PEC 9/2023). Tanto que quase não foi oportunizado à sociedade discutir o seu teor.

Em verdade, esse fenômeno consiste numa tentativa tipicamente "jabuticaba" de se insurgir contra decisões da Justiça Eleitoral com as quais a classe política não concorda.

Basta uma análise simplória para constatar essa pretensão.

Entre as alterações propostas, volta-se o olhar, aqui, ao art. 3º da PEC, que pretende anistiar "sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução e recolhimento de valores, multa ou suspensão do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, nas prestações de contas de exercício financeiro e eleitorais dos partidos políticos que se derem anteriormente a promulgação desta Emenda Constitucional, salvo se restar comprovado o uso de recursos públicos em benefício de dirigentes partidários".

A PEC, assim, pretende liberar o campo político de sanções político-eleitorais, anistiando as punições na esfera da elegibilidade e da organização partidária.

Ocorre que todo dinheiro público, por princípio, precisa se sujeitar a fiscalização e controle, razão pela qual se propõe que as PC's "anistiadas" migrem para o TCU, a quem a CF/88 atribuiu o ônus de julgar as contas de quaisquer responsáveis por valores públicos. Basta dar uma olhadinha no art. 71, II da Carta para confirmar.

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Assim, não se imagina uma argumentação com suporte constitucional que admita o "libera geral" pretendido nesta "PEC Fórmula 1".
Então, já que a ideia é tornar sem efeito decisões tomadas com base em "critérios subjetivos", alguém avisa ao TCU que ele receberá de presente o ônus de julgar as contas relativas aos bilhões de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

Preparem-se!

*Luciana Ádria Viana de Andrade é servidora da Justiça Eleitoral desde 2004, pós-graduada em direito penal e processual penal e membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político).

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