Fora da cadeia, acusados pelo 8/1 tentam se eleger... democraticamente

"Fora ex-presidiário". Foi o que postou, no Instagram, o pastor e então assessor da Câmara Municipal de Blumenau (SP) Dirlei Paiz, em 10 de agosto de 2023.

O protesto era uma montagem sobre uma placa em que ele aparecia com a camisa verde da Havan, rede varejista de Luciano Hang, e uma multidão de verde e amarelo ao fundo. Recebeu 166 curtidas, 129 comentários e 31 compartilhamentos.

Seguida de uma série de vídeos com inverdades sobre as eleições de 2022, pedidos de intervenção federal e memes contra a esquerda — como o desenho de uma xícara em que um cachorro defeca a estrela do PT — a postagem contra o presidente Lula mirou no que viu e acertou no que não viu. Paiz seria preso uma semana depois sob a suspeita de financiar os ataques de extremistas à sede dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro de 2023.

A aventura saiu cara. O pastor foi exonerado do cargo de coordenador político do então presidente da Câmara de Blumenau, Almir Vieira, e perdeu o salário de R$ 5.075.

Deixou a prisão em dezembro do mesmo ano. E se tornou, ele também, um ex-presidiário com um processo nas costas em que é acusado de pagar e incitar manifestantes a irem até Brasília retomar o poder à força.

Mas nem a prisão nem o processo impediram Dirlei Paiz de promover um auto rebranding e se candidatar, nas eleições municipais de 2024, a uma vaga de vereador na mesma Câmara de onde foi exonerado um ano antes. (Ele, que é branco, mudou até a autodeclaração para negro na tentativa de, suspeita-se, obter nacos maiores do fundo eleitoral).

O pastor não é o único envolvido no 8 de janeiro que tenta agora a sorte na política. Segundo um levantamento do portal "Metrópoles", os atos golpistas viraram trampolim político para ao menos 16 manifestantes acusados ou punidos pelos ataques antidemocráticos. O número só não é maior porque boa parte da turma fugiu para a Argentina.

Um dos postulantes tenta a sorte como prefeito de Itajaí, município portuário e estratégico de Santa Catarina. O candidato é Fabiano Silva, filiado ao partido Democracia Cristã, do folclórico José Maria Eymael.

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Fora das redes, ele afirmou, em uma entrevista ao site NSC Total, que não quebrou nenhum vaso dos prédios invadidos em Brasília. Passou o tempo todo apenas acampado na frente do QG do Exército na capital, segundo a versão.

Avó diz que acusado é bom menino

Há um pouco de tudo entre os ex-detidos no 8 de Janeiro que entraram de cabeça na eleição municipal. Tem trabalhador rural, sargento, vigilante e até um influencer de 21 anos que concorre em João Pessoa (PB).

A prisão, claro, não é citada por Marinaldo Adriano na campanha em que até a avó foi escalada como cabo eleitoral. Em um vídeo, ela diz que o neto era chamado de "doido" quando pequeno, mas agora está "grande e sabido". Ah, bom.

Quando o filho saiu com os amigos para depredar prédios públicos em Brasília, a mãe do rapaz pensou que ele estava desaparecido. Soube pela imprensa que ele, na verdade, estava detido.

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"Ele não trabalha", lamentou a mãe na ocasião. "Os amigos que foram com ele e pagaram as passagens".

O blogueiro está solto desde março de 2023 e aguarda o julgamento. Acusado de incitação ao crime e associação criminosa, ele está proibido de dormir fora da sua cidade e de usar armas de fogo. Nada que o impeça de concorrer à Câmara Municipal.

Para isso, ele abandonou o tom agressivo dos antigos posts, estourados em verde e amarelo, e adotou um fundo azul, com camisa branca e mensagens mais serenas e sem as velhas ameaças. Vai que cola.

A turma do barulho tem em quem se inspirar. O maior arquiteto dos atos golpistas só está inelegível porque, ainda em campanha, usou estrutura oficial da Presidência para espalhar mentiras sobre as urnas eletrônicas em reunião com embaixadores. Segue ainda como o grande cabo eleitoral na campanha de parlamentares, ex-ministros e até o ex-chefe da Abin acusado de espionagem ilegal e que agora quer ser prefeito do Rio.

Aos que foram presos por ele, que contem com a boa sorte.

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