Por crime de R$ 50 mil, réus do núcleo publicitário são condenados a multas de R$ 2,4 milhões
Os réus do núcleo publicitário do esquema do mensalão – Marcos Valério, seus ex-sócios Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, e sua ex-funcionária Simone de Vasconcelos – foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal pelos crimes de corrupção ativa e peculato (apropriação de dinheiro por funcionário público em troca de oferecer vantagens) por terem pago R$ 50 mil ao deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) em troca de favorecimento à agência SMP&B, de Valério, em uma licitação para contratos com a Câmara, quando Cunha era presidente da Casa.
Agora, na fase da dosimetria das penas no julgamento do mensalão, os ministros do STF votaram por multar os quatro réus em R$ 2,465 milhões, valor quase 50 vezes maior que o montante de R$ 50 mil que originou a corrupção e o peculato.
Penas relativas à corrupção e peculato da Câmara dos Deputados
Marcos Valério | Corrupção ativa: 4 anos e 1 mês de prisão + multa de R$ 432 mil Peculato: 4 anos e 8 meses de prisão + multa de R$ 546 mil |
Ramon Hollerbach | Corrupção ativa: 2 anos e 6 meses de prisão + multa R$ 240 mil Peculato: 3 anos de prisão + multa de R$ 432 mil |
Cristiano Paz | Corrupção ativa: 2 anos e 6 meses de prisão + multa R$ 240 mil Peculato: 3 anos de prisão + multa de R$ 432 mil |
Simone Vasconcelos | Corrupção ativa: 4 anos e 2 meses de prisão + multa de R$ 143 mil |
TOTAL DAS MULTAS | R$ 2,465 milhões |
- * Para calcular a multa, foi usado o salário mínimo em 2003 (R$ 240)
O cálculo foi feito considerando os dias-multa impostos como pena pelos ministros do Supremo. Cada dia-multa equivale a 10 salários mínimos da época dos fatos; em 2003, quando houve o contato entre Joao Paulo e Valério, o salário mínimo era de R$ 240. O valor total das multas ainda será reajustado de acordo com a correção monetária.
As multas aplicadas aos réus são destinadas ao Fundo Penitenciário Nacional.
Além de ter sido condenado por ter recebido R$ 50 mil do grupo do publicitário Marcos Valério, João Paulo Cunha foi condenado por peculato por conta da subcontratação nos contratos da empresa de Valério com a Câmara, mas sua pena ainda não foi definida pelos ministros do Supremo Tribunal Federal.
O valor do contrato da SMP&B com a Câmara dos Deputados era de R$ 10,7 milhões, dos quais, segundo a Procuradoria Geral da República, somente R$ 17.091 foram pagos por serviços prestados diretamente pela agência de Marcos Valério.
Os desvios ocorreram no início de 2003, quando João Paulo Cunha candidatou-se a presidente da Câmara dos Deputados – e saiu vitorioso. “Uma vez eleito para o cargo, em fevereiro de 2033, tem início em maio de 2003 a fase interna do procedimento licitatório objetivando a contratação de agência de publicidade”.
Fase dos votos
Durante a fase dos votos, em que os ministros decidiram pela culpa dos réus, o ministro-relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, destacou o que segundo ele seriam as evidências de corrupção e peculato.
“Corrupção passiva e ativa ficam evidentes entre João Paulo Cunha, Marcos Valério e seus sócios”, afirmou o relator em agosto.
Ao votar, Barbosa citou os R$ 50 mil recebidos por Cunha logo após ele assinar um contrato de R$ 11 milhões entre a Casa e a SMP&B. O dinheiro foi retirado pela mulher de Cunha em uma agência do Banco Rural em Brasília.
Barbosa ratificou a versão da acusação, de que o montante recebido era propina paga por Valério em razão de a agência SMP&B ter vencido uma licitação na Câmara. "A vantagem indevida de R$ 50 mil oferecida pelo sócio da agência foi um claro favorecimento privado (...) em benefício próprio de João Paulo Cunha", alegou.
Segundo o ministro, uma auditoria apontou que a agência não cumpria os requisitos mínimos exigidos pelo edital de uma licitação anterior. O relator afirma ainda que o retorno de trabalho da agência foi "ínfimo" em comparação com o valor do contrato.
Sobre o peculato, Barbosa disse que o crime se consumou pelo fato da SMP&B, durante o período que serviu à Câmara dos Deputados, “foi em essência mera recebedora de honorários”, dado às inúmeras subcontratações que realizou para fazer os serviços.
"Vejam a natureza fraudulenta da licitação que resultou na contratação da SMP&B pela Câmara dos Deputados depois de o deputado João Paulo Cunha ter recebido R$ 50 mil", disse Barbosa.
O ministro ressalta que a agência de publicidade recebeu dinheiro público por 14 meses, até a saída de João Paulo Cunha da presidência da Câmara, "não obstante a sua participação quase nula na execução do contrato". Barbosa afirma ainda que os contratos com a Câmara dos Deputados "produziram o enriquecimento ilícito" de Marcos Valério e seus sócios.
Entenda o mensalão
O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus --um deles, contudo, foi excluído do julgamento no STF, o que fez o número cair para 37—e, entre eles, há membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil).
Ao final da fase dos votos no julgamento pelo Supremo, foram condenados 25 dos 37 réus.
Os parlamentares, publicitários e réus ligados a bancos e corretoras são acusados de ter mantido um esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula.
O esquema, segundo concluiu o STF, foi operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.
Foram analisadas acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta. Agora, o Supremo está na fase de definir as penas dos 25 condenados.
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