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Presidente do TJ-BA é investigado por suspeita de favorecimento ao filho

Eserval Rocha assumiu em 2013 a presidência do TJ-BA após intervenção do CNJ - Margarida Neide/Agência A Tarde
Eserval Rocha assumiu em 2013 a presidência do TJ-BA após intervenção do CNJ Imagem: Margarida Neide/Agência A Tarde

Flávio Costa

Do UOL, em São Paulo

11/12/2015 06h00

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) investiga o presidente do TJ-BA (Tribunal de Justiça da Bahia), desembargador Eserval Rocha, por suposta interferência em um processo criminal em que seu filho, Eserval Rocha Júnior, foi absolvido da acusação de homicídio culposo. Júnior envolveu-se um acidente de trânsito em Salvador que resultou na morte de uma pessoa.

A corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi, decidiu averiguar essa e outras acusações feitas pela diretoria do Sinpojud (Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário da Bahia). Em sua decisão, ela afirma que “são apontados diversos fatos que evidentemente necessitam de apuração por parte desta corregedoria”.

"Eserval veio como moralizador, mas, no fim, ele não é moralizador coisa nenhuma. Ele é inimigo do servidor, ele é inimigo da sociedade", disse Maria José dos Santos Silva, presidente do Sinpojud. Ela declarou ao UOL que a ação criminal contra o filho de Eserval Rocha teve “tramitação célere”.

Entre o acidente e o arquivamento do processo passou-se pouco mais de um ano. Um tempo considerado "recorde", em termos de justiça baiana: o TJ-BA tem o pior índice de produtividade e a maior taxa de congestionamento de processos entre os tribunais brasileiros, de acordo com pesquisa divulgada pelo próprio CNJ no último mês de setembro.

A sindicalista entregou também ao CNJ uma série de outras acusações contra Rocha. Na extensa lista incluem-se a nomeação de servidores administrativos para que o mesmo filho obtenha o cargo de médico do tribunal e superfaturamento da reforma do plenário da corte estadual no valor de R$ 9 milhões. Ainda há a suposta construção irregular de um fórum no interior da Bahia que custou R$ 5,1 milhões, cuja fachada desabou em menos de um ano, além de contratações ilegais de empresas, benefícios irregulares a assessores e paralisação de processos administrativos. "Tenho provas de todas as denúncias que eu fiz", disse Maria José.

Eserval Rocha afirmou que as acusações "são todas sem fundamento e serão respondidas na forma e no momento adequados". Ele assumiu a presidência do TJ-BA em novembro de 2013, após uma intervenção do CNJ que afastou o então presidente Mário Alberto Hirs e sua antecessora, Telma Brito, por suspeita de irregularidades na gestão de precatórios (dívidas do Executivo com ordem judicial de pagamento) que teriam causado um prejuízo de R$ 448 milhões aos cofres públicos.

Meses depois, Rocha foi confirmado no cargo por seus pares em uma eleição interna. Com gestão a ser encerrada no próximo mês de fevereiro, ele evita receber representantes de classes. "A relação dele com os servidores é péssima. Ele vai a uma comarca e nem dá um bom dia", disse Maria José. 

O UOL conversou com funcionários do tribunal baiano e um desembargador que classificaram Eserval Rocha como homem “sério”, porém “autoritário” e de difícil trato com colegas e subordinados. "Ele é um homem carrancudo, não costuma ouvir as pessoas. Mas sua gestão cortou vários benefícios indevidos", disse Eliana Calmon, ministra aposentada do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Baiana, ela exerceu o cargo de corregedora nacional de justiça entre os anos de 2010 e 2012. "Eserval criou vários inimigos por conta de suas decisões de cortar gastos".

Juiz culpou a vítima e absolveu filho do desembargador

Na manhã de 16 de junho de 2013, um domingo chuvoso, o autônomo Evilásio Ribeiro de Jesus, 55, parou seu furgão na avenida Caribé, em Salvador. O carro havia sofrido uma pane e Evilásio saiu do carro para tentar consertá-lo. Minutos depois, um jipe dirigido pelo médico Eserval Rocha Júnior acertou o furgão que atropelou seu dono. Evilásio morreu no local antes da chegada da equipe da Samu.

O promotor de justiça Danilo Monteiro denunciou Júnior por homicídio culposo, mas o juiz da 17ª Vara Criminal de Salvador, Francisco de Oliveira Bispo, rejeitou a acusação: “não restou suficientemente comprovado nos autos que o acusado tenha agido com culpa para a consumação do trágico evento”, escreveu o juiz em sua sentença.

O juiz acrescentou que “ao contrário, o conjunto probatório inserto nos autos é no sentido de que o acidente aconteceu por culpa exclusiva da vítima que, desrespeitando as normas gerais de segurança para o trânsito, parou seu veículo na pista de rolamento, tomando uma das faixas de tráfego, impedindo que houvesse distância razoável para a percepção de outros veículos que viessem no mesmo sentido, já que se tratava de uma curva, sem sinalização adequada.”

A sentença de Bispo foi expedida em 28 de janeiro de 2014. Em abril, ele foi indicado pelo TJ-BA para a vaga de juiz substituto do TRE-BA (Tribunal Regional Eleitoral). A indicação representou um aumento na remuneração recebida pelo juiz, aponta a denúncia do Sinpojud.

A promotoria recorreu da decisão do juiz que foi confirmada, em segunda instância, pela 1ª Câmara Criminal do TJ-BA. Relator do processo, o desembargador Nilson Castelo Branco nega que tenha havido qualquer interferência de Eserval Rocha e disse que vai interpelar judicialmente a presidente do Sinpojud. “Inclusive, à época, ele era meu desafeto. Nós tínhamos discutido em sessão plenária. Eserval pode ter muitos defeitos. Mas esse ele não tem”.

Castelo Branco afirmou ainda o processo do filho do presidente do TJ-BA teve tramitação normal, pelo menos na segunda instância “Julguei um recurso em sentido estrito que é um dos mais simples. Outros processos tiveram tramitação ainda mais rápida. Sou o desembargador com maior índice de produtividade do tribunal”. Ele diz estar coletando dados de todos os processos que julgou em 2014 "para demonstrar que não houve julgamento em tempo recorde".

Caso conclua que há indícios para abertura de um processo administrativo disciplinar, a ministra Nancy Andrighi pode pedir o afastamento de Rocha em sessão plenária do CNJ. Não há prazo para que ela tome uma decisão. A apuração começou no dia 12 de novembro.

Outro Lado

O presidente do TJ-BA, desembargador Eserval Rocha afirmou ainda, em nota, que sua gestão não responde a qualquer sindicância e que quem fez as acusações ao CNJ "estava envolvido em uma eleição para a diretoria de um sindicato, no mês de novembro". Ele acrescenta que "que continuará administrando o Tribunal de Justiça da Bahia com base exclusivamente nos princípios da legalidade e no respeito à coisa pública.

O promotor Danilo Monteiro declarou, por meio da assessoria do Ministério Público da Bahia, que prefere não se pronunciar sobre o caso em razão do tempo transcorrido e do processo já ter sido julgado e arquivado. Ele afirmou ainda que "fez tudo que estava dentro de sua atribuição como promotor de Justiça".

UOL procurou o advogado Joseval Brito Carneiro, que defendeu o médico Eserval Rocha Júnior, no processo por homicídio culposo, mas ele não retornou as ligações. O UOL tentou entrevistar o juiz Francisco de Oliveira Bispo na 17ª Vara Criminal, onde recebeu a informação de que ele tinha sido designado como desembargador substituto. A reportagem solicitou contato com ele à assessoria de comunicação do TJ-BA, mas até o fechamento da matéria, o UOL não obteve resposta.