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Ex-presidente da OAS diz que Lula pediu reforma em sítio e detalha encontros

Bernardo Barbosa e Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

09/11/2018 21h12Atualizada em 09/11/2018 23h13

Léo Pinheiro, ex-presidente da construtora OAS, afirmou em interrogatório realizado nesta sexta-feira (9) em Curitiba que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediu a ele diretamente uma série de reformas em um sítio de Atibaia (SP). As obras são o assunto de um processo da Operação Lava Jato em que Pinheiro e Lula são réus.

A defesa do ex-presidente diz que Pinheiro "preferiu acusar Lula com afirmações mentirosas ao invés de se defender" para tentar um acordo de delação premiada. O ex-executivo da OAS, que cumpre prisão preventiva desde setembro de 2016, confirmou no interrogatório que seus advogados negociam um acordo.

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Segundo a denúncia do MPF (Ministério Público Federal), Lula recebeu cerca de R$ 1 milhão em propina por meio de reformas feitas no sítio e pagas pelas construtoras Odebrecht, OAS e Schahin. O dinheiro gasto nas obras teria origem no esquema de corrupção na Petrobras revelado pela Lava Jato, e o MPF cita contratos específicos da estatal em que Lula teria atuado para garantir benefícios à Odebrecht e à OAS.

A defesa de Lula alega que é falsa a vinculação das reformas no sítio com contratos com a Petrobras, e que não há provas dos crimes imputados ao ex-presidente.

Lula será o último interrogado desta ação penal. Seu depoimento está marcado para a próxima quarta-feira (14). Será a primeira vez que o ex-presidente sairá da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde está preso desde 7 de abril cumprindo 12 anos e um mês de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá (SP).

Há na Operação Lava Jato de Curitiba, ainda, mais um processo contra Lula, que investiga se ele foi beneficiado pela Odebrecht na compra de um terreno para sediar o Instituto Lula e de um apartamento vizinho ao que ele morava em São Bernardo do Campo (SP). O petista nega as acusações.

Três encontros

Pinheiro disse ter encontrado com Lula em três ocasiões para falar sobre a reforma.

Eu tive com ele e com dona Marisa no sítio e na casa, na residência dele em São Bernardo. Eles que determinaram tudo o que devia ser feito
Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS

Segundo ele, a primeira reunião foi no Instituto Lula, em fevereiro de 2014, onde o ex-presidente teria dito que queria fazer uma reforma em uma sala e em uma cozinha do sítio, além de um reparo em um lago da propriedade.

O segundo encontro teria acontecido uma semana depois, no próprio sítio, junto com Paulo Gordilho, que era diretor da OAS Empreendimentos e também réu neste caso. O processo inclui duas fotos da visita de Pinheiro e Gordilho ao sítio, e Lula aparece nas imagens.

O terceiro, na versão de Pinheiro, aconteceu na residência de Lula e da ex-primeira-dama Marisa Letícia, em São Bernardo do Campo (SP), "duas ou três semanas depois". Na ocasião, ele e Gordilho teriam mostrado o projeto de reforma do sítio ao casal, e Lula teria autorizado o início dos trabalhos. Marisa morreu em fevereiro de 2017.

Foto da investigação mostra Lula (dir.) no sítio de Atibaia com Léo Pinheiro Imagem: Polícia Federal

"Não podia negar"

Pinheiro disse ter aceitado fazer a reforma porque "não podia negar" o pedido feito, segundo ele, por Lula.

Eu não podia negar pelo nosso relacionamento, pelo que ele fez pela empresa, então eu tive que atender. Não era uma coisa comum
Léo Pinheiro

Segundo Pinheiro, sua relação com Lula vem do começo dos anos 1990, e partiu de uma "estratégia de longo prazo da OAS" para expandir o mercado da empreiteira para fora da Bahia.

"Dentro de um projeto estratégico de longo prazo da organização, a gente vislumbrava a possibilidade do PT vir, até porque já tinha ganho a prefeitura de São Paulo, a prefeita [Luiza] Erundina. Nós fizemos duas obras lá para a prefeitura [...] e tivemos que abrir essa relação de uma forma mais próxima", disse.

Léo Pinheiro diz que foi nessa época que conheceu o ex-presidente Lula e que esteve com ele "muitas vezes".

"Tive muita orientação dele do ponto de vista da visão estratégica dele. Quando ele assume a Presidência, ele nos ajudou, a mim pessoalmente, porque era eu que tinha uma relação com ele, em diversas coisas: em negócios nossos no exterior; na Petrobras", relatou.

Pinheiro reafirmou que a OAS tinha uma "conta corrente" de propinas para o PT que era abastecida com recursos oriundos de contratos da empresa com a Petrobras. O empresário classificou as reformas em Atibaia como "despesas extras" que foram incluídas nos "encontros de contas" que a OAS fazia com o partido.

Sigilo sobre obras

Em diversos momentos do interrogatório, Pinheiro destacou que as obras deveriam correr sob sigilo. Este teria sido um dos motivos para que Paulo Gordilho participasse dos trabalhos.

"Ele já tinha conhecimento dos serviços que vínhamos fazendo no tríplex do Guarujá, então preferi que Paulo continuasse para que a coisa não ficasse muito divulgada dentro da organização", contou.

Segundo Pinheiro, o próprio Lula pediu que os funcionários da OAS na obra não usassem uniformes ou qualquer identificação da empresa, nem mesmo circulassem por Atibaia. O ex-presidente da construtora afirmou ter deslocado uma equipe de Salvador, que ficou morando na propriedade, "exatamente para a gente manter isso em sigilo".

A mesma preocupação com o segredo dos trabalhos ocorreu, segundo ele, no pagamento da nova cozinha do sítio. O pagamento de R$ 170 mil foi feito em espécie por Gordilho, e a nota fiscal, emitida em nome de Fernando Bittar, um dos donos da propriedade e cuja família é amiga da de Lula há décadas.

A denúncia do MPF (Ministério Público Federal) diz que a OAS pagou apenas a reforma da cozinha, mas Pinheiro afirma que a empresa realizou outros trabalhos no sítio, como os reparos nas infiltrações de um lago da propriedade. O ex-presidente da construtora estimou os gastos com as reformas em "R$ 350.000 a R$ 450.000", acima dos R$ 170.000 que constam na acusação no trecho que diz respeito à OAS.

Pinheiro reiterou a versão que deu no interrogatório do caso do tríplex de que Lula o orientou a destruir qualquer registro que indicasse a realização das reformas em Atibaia e no apartamento do Guarujá. 

Agenor Medeiros, ex-executivo da OAS, também foi interrogado hoje. Réu por corrupção ativa, ele reiterou declarações anteriores sobre a existência de propinas derivadas de contratos com a Petrobras, mas afirmou que tratava apenas dos pagamentos a executivos da estatal, e que nunca teve relacionamento com Lula. Segundo Medeiros, Léo Pinheiro era quem cuidava dos repasses a políticos e partidos.

Medeiros disse não ter envolvimento com as obras no sítio, mas relatou ter ouvido de Léo Pinheiro que o então presidente da OAS iria "abater" do "caixa geral" de propinas para o PT -- alimentado com recursos de contratos com a Petrobras, entre outras fontes  -- os valores gastos com as reformas na propriedade.

Paulo Gordilho, que foi ao sítio com Léo Pinheiro, também foi interrogado hoje. Ele disse ter sido encarregado por Léo Pinheiro para comandar a execução das reformas. Gordilho também relatou ter recebido de Fernando Bittar o projeto de reforma da cozinha, e afirmou que "quem estava resolvendo tudo era dona Marisa".

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Outro lado

Segundo Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula, Léo Pinheiro "preferiu acusar Lula com afirmações mentirosas ao invés de se defender."

"A estratégia faz parte de uma tentativa de convencer o Ministério Público Federal a lhe conceder benefícios, inclusive para sair da prisão, por meio de um acordo de delação que negocia há quase 2 anos", afirmou Zanin Martins.

Ainda de acordo com o advogado, Agenor Medeiros "reconheceu que é falsa a acusação do Ministério Público ao afirmar que ele teria prometido e oferecido vantagens indevidas a Lula por meio da reforma de um sítio em Atibaia." 

Segundo Luiza Oliver, advogada de Fernando Bittar, os interrogatórios corroboraram que seu cliente "é de fato o proprietário do sítio, tendo uma relação familiar e extremamente próxima à família do ex-presidente." 

"Todas as testemunhas e os próprios réus (inclusive os delatores), confirmaram que a propriedade era usada conjuntamente pelas famílias Bittar e Silva. A questão atinente à reforma da cozinha, apesar de iniciada com um projeto pago e contratado por Fernando, ficou sob responsabilidade da família Silva", afirmou a advogada.

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