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MPF e PF identificaram vazamentos antes de operação citada por Marinho

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

18/05/2020 16h21Atualizada em 18/05/2020 21h08

O MPF (Ministério Público Federal) no Rio de Janeiro e a PF (Polícia Federal) tinham indícios de vazamentos a deputados da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) alvos da Operação Furna da Onça —citada pelo empresário Paulo Marinho em entrevista à Folha— antes mesmo de a ação ter sido deflagrada em novembro de 2018.

Em seu relato, Marinho afirmou que Flávio Bolsonaro, então deputado na Alerj, teria conhecimento prévio da operação. Relatório do antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), tornado público a partir da Furna da Onça, mostrou movimentação atípica nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor do filho mais velho de Jair Bolsonaro, e indícios da prática de rachadinha no gabinete de Flávio. O então deputado estadual não era, contudo, alvo da Furna da Onça.

A operação foi deflagrada no dia 8 de novembro de 2018 e prendeu 22 pessoas, entre elas, dez deputados estaduais. Sete deputados foram detidos temporariamente: André Correa, Chiquinho da Mangueira, Coronel Jairo, Luiz Martins, Marcelo Simão, Marcos Abrahão e Marcus Vinicius "Neskau"; outros três parlamentares foram presos preventivamente, pois já estavam detidos no âmbito da operação Cadeia Velha (Edson Albertassi, Jorge Picciani e Paulo Melo, todos do MDB).

Para converter as prisões temporárias em preventivas, o MPF argumentou aos desembargadores do TRF-2 (Tribunal Regional da 2ª Região) que "houve indícios de que alguns investigados tiveram acesso a informações da operação antes de ela ser deflagrada, o que provocou perdas no cumprimento dos mandados de busca e apreensão que eram considerados úteis para o melhor andamento das investigações".

No julgamento, os desembargadores concordaram com a posição do MPF. O relator da ação, desembargador Abel Gomes, afirmou que havia indícios documentais de que os deputados "tinham conhecimento prévio das ações policiais, não só se 'preparando', mas atuando para o impedimento da arrecadação, alteração ou destruição de elementos de convicção".

Abel Gomes citou também que a PF, no dia 1º de novembro, portanto 7 dias antes da operação, passou informações a ele "de que havia conversas entre deputados de que essas ações [operações] seriam executadas na Alerj" e que "havia fortes indícios de vazamento" mesmo antes do cumprimento dos mandados de prisão.

Em um primeiro momento, o desembargador decidiu de forma monocrática pela conversão em preventiva de seis dos deputados presos, e a sua posição foi referendada pelos outros magistrados da 1ª seção especializada do TRF-2.

As declarações de Marinho remontam às indicações do MPF, do TRF e da PF de que deputados da Alerj sabiam da operação. Flávio Bolsonaro inicialmente não era alvo das autoridades. Só depois da deflagração da Furna da Onça vieram à tona as movimentações incompatíveis com a renda de Queiroz, registradas por relatórios do Coaf, hoje rebatizado de UIF (Unidade de Inteligência Financeira).

Ao todo, a UIF identificou movimentação de R$ 7 milhões entre 2014 e 2017 na conta bancária de Queiroz, conforme reportado pelo jornal O Globo à época.

A partir dos relatórios de inteligência financeira, o Ministério Público passou a apurar as rachadinhas —esquema em que os funcionários de gabinete devolvem parte de seus salários aos parlamentares.

Segundo o empresário Paulo Marinho, um delegado da PF teria informado a interlocutores de Flávio sobre a operação —segundo relato do próprio Flávio—, incluindo as suspeitas sobre Queiroz. Ele foi exonerado do gabinete de Flávio no dia 15 de outubro, 24 dias antes da deflagração da Furna da Onça. Na mesma data, foi publicada a exoneração da filha dele Nathália Queiroz do gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados.

Tanto Queiroz quanto Flávio alegam inocência quanto à suspeita da rachadinha e afirmam que houve ilegalidades na condução da investigação.

Flávio negou as acusações de Marinho e disse que ele tem interesse em sua vaga no Senado —o empresário é suplente do filho de Bolsonaro na Casa.

MPF investigará relato de Paulo Marinho

O UOL questionou a PF se houve investigação aos vazamentos à época. A corporação afirmou que o "suposto vazamento de informações na operação 'Furna da Onça' foi regularmente investigado pela PF através do Inquérito Policial n° 01/2019, que encontra-se relatado".

Em nota, o MPF informou que vai investigar os supostos vazamentos no âmbito da Furna da Onça e que irá ouvir o depoimento do empresário Paulo Marinho. O órgão também pediu desarquivamento do inquérito conduzido pela PF à época.

"O Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público Federal (MPF) instaurou procedimento investigatório criminal (PIC) para apurar supostos vazamentos da Policia Federal na Operação Furna da Onça, deflagrada em 2018. Além disso, o MPF requer à Justiça Federal o desarquivamento de inquérito policial (IPL) que apurou, à época, suspeitas de que informações privilegiadas foram vazadas. Na época, o caso foi arquivado após a própria PF ter relatado sem evidências de crime o IPL", diz o comunicado do MPF.

PF investiga, TRF rechaça e PGR quer oitiva de Marinho

Entre as falas de Marinho à Folha, consta ainda que Flávio teria dito a ele que a PF segurou a deflagração da operação para depois das eleições, para não prejudicar a candidatura de Bolsonaro à Presidência e dele ao Senado. A PF afirmou ontem que abriria nova investigação sobre os vazamentos e as supostas mudanças na deflagração da Furna da Onça.

O desembargador Abel Gomes, relator do caso no TRF-2, rechaçou ontem a afirmação de que a PF teria adiado a operação para resguardar a família Bolsonaro durante as eleições. Em nota, ele afirmou que a ação foi "deflagrada no momento que se concluiu mais oportuno, conforme entendimento conjunto entre o Ministério Público Federal (MPF), a Polícia Federal e o Judiciário".

Segundo Abel Gomes, a decisão considerou que "uma operação dirigida a ocupantes de cargos eletivos, deputados em vias de reeleição não deveria ser deflagrada em período eleitoral, visto que poderia suscitar a ideia de uso político de uma situação que era exclusivamente jurídico-criminal".

Na noite de ontem, a PGR (Procuradoria-Geral da República) pediu à PF que tome o depoimento de Marinho no inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal e apura, baseado em denúncias do ex-ministro Sergio Moro, se o presidente tentou interferir na PF.