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CGU vê risco de facilitação em contrato de estatal com ex-mulher de Wassef

Empresa ligada da Cristina Boner diz desconhecer auditoria feita após reportagens do UOL - UOL
Empresa ligada da Cristina Boner diz desconhecer auditoria feita após reportagens do UOL Imagem: UOL

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

10/04/2021 04h00

Uma auditoria da CGU (Controladoria Geral da União), realizada após reportagens do UOL, identificou cinco "fragilidades" no contrato da empresa Globalweb, da ex-mulher do advogado do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), com a estatal Telebrás. O relatório foi concluído na semana passada.

O UOL revelou que, em um ano e meio da gestão de Bolsonaro, a Globalweb recebeu pagamentos do governo superiores aos R$ 42 milhões nos quatro anos da gestão compartilhada de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB). O maior cliente era a Telebrás. Entre janeiro de 2019 e julho de 2020, a firma recebeu R$ 55 milhões da gestão Bolsonaro.

A Globalweb é ligada a Cristina Boner, ex-mulher do advogado Frederick Wassef, que já atuou para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e acompanha o primogênito dele, o senador Flávio Bolsonaro. A assessoria da empresa disse que desconhece a auditoria e que enviou certidão da Controladoria mostrando que ela não tem nenhuma punição vigente nos cadastros da CGU.

Não há qualquer irregularidade junto à Globalweb"
Assessoria da Globalweb

O órgão de controle fez sete recomendações à estatal, como uma renegociação de contrato, e a abertura de um processo disciplinar (veja todas elas no fim da reportagem). Os problemas encontrados incluíam a falta de "pesquisa ampla" de preços, riscos de direcionamento de contratação e pagamentos sem a comprovação da prestação de serviços.

A auditoria da CGU foi pedida pela própria Telebrás depois de reportagens e questionamentos feitos pelo UOL em junho e julho passado.

Segundo a assessoria da CGU, "as recomendações já estão em monitoramento e em consequente tratamento pela Telebrás". "A CGU acompanha as recomendações, analisa e valida as eventuais justificativas apresentadas pelo gestor, e adota providências de sua competência, se for o caso", completou. A reportagem apurou que o cumprimento não é obrigatório, mas isso significa aumentar riscos de possível punição pela Corregedoria da CGU ou pelo TCU (Tribunal de Contas da União).

Por telefone, a assessoria da Telebrás disse que cumpriria recomendações, mas não deu detalhes sobre quais orientações específicas tratava. A estatal disse que já prestou esclarecimentos à CGU. Frederick Wassef preferiu não comentar o assunto.

Contratos previam operação de redes

Em 2017 e 2019, a Telebrás assinou dois contratos com a Globalweb. O primeiro era para a operação do centro integrado da rede da estatal. O segundo, para operar a central de suporte técnico. Os dois negócios somam R$ 119 milhões durante um período de cinco anos.

Aspectos técnicos de um dos editais, porém, não foram cumpridos pela Telebrás, segundo os auditores da CGU. Isso aumentou a "exposição a riscos de direcionamento, de facilitação" à empresa ligada a Cristina Boner, e "nulidade da contratação", segundo eles.

Sistemas operacionais diferentes dos exigidos no edital foram apresentados à estatal. E houve alerta sobre isso.

Agrava mais a situação o informe do gestor de que foi alertado pelas empresas concorrentes sobre esta irregularidade"
Relatório da CGU

A lista de fragilidades foi:

  • Quantidades genéricas. "Definição genérica" da quantidade de unidades de serviço demandadas.
  • Faltou pesquisa. "Ausência de ampla pesquisa de preços para capacitação". "A pesquisa de preços para orçamento de licitação promovida por empresa estatal não deve se restringir a cotações realizadas junto a outros órgãos ou entidades, como ocorreu neste caso."
  • Risco de direcionamento. "Ausência de observação a requisitos técnicos estabelecidos no edital". "A Telebrás não justificou a ausência de atendimento dos requisitos exigidos pelo edital e referência da contratação, fato que aumenta a exposição aos riscos de direcionamento, de facilitação à empresa qualificada indevidamente."
  • Fornecedor definia o serviço. "Demandas referentes à prestação de serviços definidas pela contratada e não pela Telebrás". "A Globalweb realizava os serviços com a quantidade de USUs [unidades de serviço] por ela definida, em desconformidade com o TR [termo de referência] e os critérios de avaliação apresentados, denotando fragilidades na fiscalização, bem como riscos em relação à qualidade e adequada volumetria dos serviços prestados".
  • Resultados sem avaliação. "Pagamento referente ao mês de janeiro de 2020 realizado sem a emissão do ateste de recebimento dos serviços prestados". "Risco aqui se materializa na forma de dispêndio de recursos sem a devida aferição dos resultados alcançados."

As recomendações feitas pela CGU foram:

  • Avaliar a renegociação de um contrato de 2019, retirando a possibilidade de contratação de 2 mil unidades de serviço "caso se comprove que não serão de fato necessárias".
  • Avaliar possível "abertura de processo disciplinar para apuração de responsabilidade sobre a não observação dos requisitos técnicos da contratação".
  • "Estimar detalhadamente" as necessidades da empresa ao realizar novas compras
  • Fazer "ampla pesquisa de preços", com a adoção de mais de uma fonte de referência
  • Fazer ordem de serviço para todo trabalho de tecnologia da informação a ser fornecido.
  • Atestar que um serviço prestado no prazo, ou seja, antes do pagamento ser feito.
  • Criar regra para a Telebrás não exigir requisitos que importem despesas anteriores ao contrato "ou frustrem o caráter competitivo" da licitação.