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Jurista: Centrão decidirá se Bolsonaro vai responder por crimes após a CPI

Do UOL, em São Paulo

15/09/2021 13h08Atualizada em 22/09/2021 21h01

O ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior, que coordenou um grupo de juristas em um parecer entregue à CPI da Covid, disse achar que o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), só será responsabilizado por crimes após o relatório final da CPI se o "centrão" optar por isso.

"O Brasil depende do centrão. Ou não é? Depende do centrão avaliar o custo-benefício. Se carregar esse caixão sem alça que é Bolsonaro vale a pena", disse o jurista ao UOL News.

Para Reale, a decisão do centrão em responsabilizar Bolsonaro por crimes deverá ser bem ponderada entre o grupo visto que todos eles almejam se reeleger em seus cargos.

"Se não vai ter repercussões negativas eleitorais porque o centrão tem interesse em verbas, cargos, prestígios, mas, ao mesmo tempo, tem outro interesse entre todos eles que é se reeleger."

Questionado pelo colunista do UOL Kennedy Alencar, Reale apontou como importante uma modificação da lei do impeachment, no entanto, ponderou que essa alteração deveria ser realizada através de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) e questionou se teria a aprovação necessária na Câmara e no Senado.

"Eu estou envolvido nos impeachments que aconteceram nesse país exatamente por causa da crise que o presidencialismo tem trazido à vida brasileira. É um processo doloroso. O impeachment [previsto] na Constituição e também na lei 1079 é realmente difícil de operacionalizar. A alteração do impeachment deveria passar por uma Emenda Constitucional, para passar por uma PEC que tem que ter 3/5 da Câmara e 3/5 do Senado. Tem isso?", argumentou.

Bolsonaro potencializou perigo da pandemia

Reale comentou que Bolsonaro desconstituiu os elementos científicos apontados por especialistas como necessários para evitar a contaminação pela covid-19 que foram indicados pelo ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta. A destruição desses aparatos, para o jurista, ocorreu através de palavras, atos, decisões normativas do chefe do Executivo e conflitos com governadores.

Na entrevista, Reale apontou que o crime comum mais grave cometido por Bolsonaro e apontado no documento foi o de causar epidemia ao desrespeitar normas regulamentares.

Causar epidemia não quer dizer causar inicialmente. É encontrar uma situação que já existe a situação de perigo e aumentar esse perigo. E ele [Bolsonaro] potencializou esse perigo. O perigo foi potencializado. Não comprar vacinas, foi tudo potencializado. Nós poderíamos ter vacina antes. Eles [Governo Federal] vieram a ter interesse na vacina para fazer concorrência com o Butantan. É um crime de epidemia", explicou.

Ao UOL, o jurista explicou que o parecer enviado à Comissão apontou que o presidente da República tinha um plano e as mais de 587.847 mil mortes no país não ocorreram apenas por negligência ou descaso do Governo Federal.

"O conjunto da obra mostra claramente que havia um plano, toda a conduta não foi orientada por uma negligência, um descaso. Não. Havia uma ideia pressuposta que era a de que alcançaria a imunização por via da contaminação de 60 a 70% da população e só nesse momento haveria a possibilidade de superação da pandemia."

De acordo com o ex-ministro da Justiça, o plano do Palácio do Planalto era "valorizar a economia em prejuízo da vida e da saúde. A vida e a saúde eram indiferentes", destacou.

Por isso, ressalta o jurista, o crime de responsabilidade de Bolsonaro apontado no relatório enviado à CPI decorre da posição de "indiferença, afronta aos direitos fundamentais, o direito à vida e saúde" infringidos pelo mandatário.

Há um crime de responsabilidade gravíssimo decorrente dessa posição de desvalorização da vida e da saúde".

O relatório

O relatório de mais de 200 páginas é dividido em crimes de responsabilidade, crimes contra a saúde pública, crimes contra a paz pública, crimes contra a administração pública e crimes contra a humanidade. O parecer será analisado pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), que pode se basear nos apontamentos dos juristas ao formular o relatório final da comissão.

Na avaliação dos juristas, as investigações comandadas pela CPI apontam que Bolsonaro cometeu ao menos um crime em todas divisões propostas, incluindo charlatanismo e prevaricação (veja o resumo).

Vale lembrar que os possíveis crimes de responsabilidade são analisados pela Câmara de Deputados e podem resultar em processos de impeachment, enquanto o indiciamento de crimes comuns do presidente dependem da análise da PGR (procuradoria-geral da República).

O relatório também lista outros crimes que podem ter sido cometidos por outros agentes públicos, como corrupção passiva e estelionato, e também responsabiliza o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e o ex-secretário Executivo da pasta Élcio Franco por diversas práticas.

As conclusões serão avaliadas por Renan Calheiros, responsável por apresentar o parecer final da CPI com as conclusões da investigação. Após ter o período inicial prorrogado em julho, a comissão tem até o dia 5 de novembro para concluir os trabalhos. O relator, no entanto, planeja entregar a conclusão ainda neste mês.