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OPINIÃO

Mapa de Eduardo Bolsonaro leva zero em geografia e 10 em estratégia digital

O mapa distribuído por Eduardo Bolsonaro com as regiões de 1913 - Reprodução/Twitter
O mapa distribuído por Eduardo Bolsonaro com as regiões de 1913 Imagem: Reprodução/Twitter

Colunista do UOL

06/07/2023 12h00Atualizada em 06/07/2023 20h56

Eduardo Bolsonaro (PL-SP) divulgou em suas redes sociais uma conta literalmente de supermercado para projetar o possível aumento do preço da cesta básica caso seja aprovada a reforma tributária.

Como se sabe, a opinião do deputado a respeito da estrutura tributária do país tem o mesmo valor e interesse para o público do que a análise de uma iguana sobre o mundial de hóquei no gelo.

Sim, a reforma tributária é o grande assunto a ser debatido pela gente dita séria no país, mas por alguma razão só se fala de outra coisa por aí. Da nova propaganda da Kombi ao novo Teste de Fidelidade. Nem João Kleber conseguiria manter a atenção da plateia se, entre um teste e outro, começasse a falar dos impactos em nossa vida do novo Imposto sobre Valor Agregado. Os espectadores ferrariam no sono ou trocariam de canal.

Já devia ser assim desde os tempos das grandes decisões a respeito do Plano Real; só não havia Twitter para aferir.

Filho de uma atração de TV que virou presidente, Eduardo Bolsonaro provavelmente sabe que as chances de conseguir audiência falando sobre tributos e cesta básica já seriam baixas em condições normais de pressão e temperatura. Em tempos de redes sociais, é quase nula.

Mesmo assim, o deputado conseguiu viralizar. Como? Botando a projeção de aumento de impostos sobre a cesta básica em cada macrorregião do Brasil com um mapa das fronteiras geográficas vigentes em 1913. Sem disparar nenhuma bala de canhão, o parlamentar juntou novamente Mato Grosso do Sul ao Mato Grosso. Mais ao norte, as belezas naturais do Tocantins voltaram a ser território de Goiás. Nem Bolsonaro pai faria tanto pelo amigo Ronaldo Caiado.

Pior: na postagem de Bolsonarinho, São Paulo foi finalmente anexado pelos estados do Sul, e o Sudeste virou uma mancha azul que se estende ao que antes eram os estados da Bahia e de Sergipe.

O deputado queria gabaritar a prova de matemática e tomou zero de geografia. Uma demonstração gratuita e irrefutável de burrice, certo?

Veja bem.

O filho do ex-presidente inelegível provavelmente não sabe mais do que três nomes de capitais do seu país. Mas mesmo ele, que tem assessores, parece incapaz de pegar a primeira imagem que aparece no Google e cometer um erro tão primário. Porque talvez não seja erro, e sim estratégia.

A postagem só ganhou o alcance que ganhou fora da bolha de fanáticos devido às peculiaridades geográficas do mapa bolsonarista. É este o mapa que mobiliza as atenções de detratores da família quando divulgam o conteúdo em tom de deboche: "olha só que burro".

E, como se sabe, não tem nada mais saboroso ou viralizante do que instigar a plateia a tirar a sua casquinha da estupidez alheia.

E a estupidez alheia, desde que o primeiro ser humano tropeçou na primeira casca de banana, é muitas vezes o que nos faz sentir um pouco mais inteligentes do que de fato somos. Por isso gravamos cenas do tipo e assistimos em looping: para lembrar que não importa quantas decisões erradas tomamos na vida; sempre parece ter alguém pior do que nós.

Pois neste episódio tudo o que faltou foi inteligência a quem transformou uma postagem estúpida em um case de sucesso: fora da bolha, agora todo mundo, até a tia revoltada que andava desencantada e afastada dos arranca-rabos políticos da família, já viu uma hora dessas o mapa todo torto que atribuiu ao PT o aumento da cesta básica que sequer aconteceu. A postagem foi apagada pelo deputado, mas ganhou a eternidade em prints, memes e compartilhamento no WhatsApp.

Não importa o quanto os caciques da Câmara batam no peito para dizer que a reforma é do Congresso e caminha sem o envolvimento necessário do governo: na postagem do 03 o projeto é do PT e ponto.

Poucos vão desconfiar também dos números apocalípticos divulgados por uma associação que abraçou como poucas a candidatura de Bolsonaro pai à reeleição. O episódio não qualifica o debate (necessário) sobre impostos e tributos.

Parece uma aula, isso sim, de estratégia digital.

Como o jovem que viraliza em banheiras de Nutella e outros desafios que afrontam a sensatez, Eduardo Bolsonaro conseguiu o que queria. Se não foi realmente um atestado de burrice, deve estar rindo até agora.

No momento em que ele e sua família poderiam caminhar para a irrelevância, virou assunto com uma isca óbvia e é isso o que importa. O engajamento é um oferecimento de todos aqueles que o detestam.