Lula frustra povos indígenas por promessas não cumpridas em demarcações
Promessas não cumpridas. É assim que povos indígenas resumem o governo Lula. O presidente assumiu o cargo anunciando que assinaria 14 demarcações nos primeiros 100 dias de governo. Sua gestão se aproxima dos 500 dias e a promessa não saiu do papel.
O que aconteceu
Até o momento, foram 10 demarcações de terras indígenas. "O que foi prometido deveria ter sido cumprido", ressalta Maria Helena Gavião, vice-coordenadora das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Estado do Maranhão.
A reincidência deixa os indígenas ainda mais descontentes. O anúncio de seis demarcações estava previsto para a última semana - foram só duas no final. "Esperava muito mais", reclama Maria Helena.
A letargia foi criticada em documento aberto. "Já estamos no segundo ano de Governo e as suas promessas sobre demarcações continuam pendentes", ressalta trecho da Carta dos Povos Indígenas do Brasil.
Procurado pelo UOL, o Ministério dos Povos Indígenas informou que "houve uma forte retomada" no governo Lula. Justificou que as 10 demarcações ocorridas se aproximam do número de demarcações da última década (11). Sobre as promessas não cumpridas, nenhuma palavra.
Tem um governo que a gente acreditava que era a favor [dos povos indígenas] e no momento [última semana] tem só duas terras que foi afirmado que vai ter demarcação.
Maria Helena Gavião
Consequências nocivas
Os povos indígenas reclamam que detalhes burocráticos, como publicação de portarias, travam demarcações. Também há queixas em relação a não destinar recursos para o Ministério dos Povos Indígenas. A leitura é de falta de comprometimento. "É lógico que quando você anuncia um número x [de demarcações] e, na prática, você tem um número inferior a isso, ele [Lula] deixa a desejar", diz Yanukula Kaiabi Suia, presidente da Terra Indígena Xingu (Mato Grosso).
A não demarcação faz madeireiros, mineradores e garimpeiros invadirem área indígena, dizem lideranças. "Eu sinto que o governo federal está faltando incidir mais na defesa dos povos indígenas", diz Auricelia Arapiuns, presidente do conselho deliberativo da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira.
A disputa causa violência, problemas ambientais, como contaminação da água e peixes por mercúrio, e fuga de grupos inteiros. Indígenas vivendo na beira de estradas e em barracos nas periferias é o resultado da falta de cumprir as promessas de demarcação, pondera Auricelia.
Proposta indecorosa
A ideia do governo federal de comprar terras para criar assentamentos foi considerada uma afronta. "Não queremos viver em fazenda", ressalta a Carta dos Povos Indígenas ao Brasil.
Também há críticas ao descumprimento de acordos por parte do governo federal. Janete Figueredo Alves, diretora executiva da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Amazonas), conta que os povos indígenas não são consultados em questões que lhes dizem respeito, como crédito de carbono.
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Quero receberA falta de discussão também aparece nas pequenas coisas. Presidente da Organização Geral dos Professores Ticuna (fronteira com o Peru), Silbinei Ovídio Rosindo reclama que não há consulta na construção de escolas. O resultado são colégios sem biblioteca, material escolar inadequado e tão distantes que são quase inascessíveis.
Longe do ideal, mas um avanço
Mesmo que não esteja entregado o esperado, o governo Lula é considerado um avanço. O presidente da Terra Indígena do Xingu ressalta que Jair Bolsonaro (PL) não queria conversa e fazia críticas ofensivas.
Cacique da etnia Xokleng de Santa Catarina, Setembrino Camlem pondera que há limitações para Lula agir. Ele fala que a não demarcação é resultado da pressão de deputados e senadores ligados ao agronegócio.
Setembrino avalia que a prova de boa vontade do governo federal é ter retomado diálogo. A nomeação de Sonia Guajajara como ministra dos Povos Indígenas é outro bom sinal. O cacique espera que a abertura se transforme em demarcações tão logo o contexto político permita. Mas ele admite que pode demorar.
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