Sinal de fraqueza, 2024 e Bolsa Família empacam reforma ministerial de Lula

A reforma ministerial que vai incluir o centrão de vez no governo Lula (PT) foi adiada para depois da viagem do presidente à África, que acontece na semana que vem. Sob pressão de diferentes lados, o petista tem quebrado a cabeça para desagradar menos aos aliados.

O que está em jogo?

Havia a expectativa de que Lula completasse nesta semana a entrada de PP e Republicanos no governo, anunciada em julho. Os deputados André Fufuca (PP-MA) e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) foram indicados pelas respectivas bancadas. Mas ainda falta decidir em que ministérios o presidente irá encaixá-los.

Sem querer tirar aliados de primeira hora, Lula tem tentado resolver o quebra-cabeça há mais de um mês. O centrão já mostra sinais de irritação. De um lado, os partidos da ex-base bolsonarista pedem pastas robustas, com acesso a obras e emendas e visibilidade eleitoral. Do outro, aliados não querem perder espaço e têm resistido às mudanças.

Na Câmara, além do arcabouço fiscal, o governo tem medidas provisórias importantes a serem votadas, como a do salário mínimo, que caduca no final deste mês, e ter essa situação resolvida era o primeiro passo para não haver surpresas indesejadas.

Lula tem articulado diretamente com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e ouvido os partidos. Segundo aliados, os últimos arranjos do desenho serão feitos durante a viagem, que acaba no dia 28. Governistas dizem que nada impede que o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) faça o anúncio dos novos ministros, mas isso é considerado improvável.

Briga pelo ministério do Bolsa Família

O Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), responsável pelo Bolsa Família, é o mais cobiçado pelo PP, com ou sem o programa. Além de concentrar todas as ações sociais relevantes do governo, com ótima entrada em prefeituras (situação-chave para 2024), o ministério também está com Wellington Dias (PT), rival político do presidente nacional do partido, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), no Piauí.

A saída de Wellington chegou a ser dada como certa no meio da semana, considerando a transferência do Bolsa Família para Casa Civil ou Gestão e Inovação, mas voltou a subir no telhado por ordem do próprio Lula.

Embora a atuação do ministro seja considerada "tímida", o presidente insiste que os programas sociais fiquem unidos e sob o guarda-chuva do PT. Na quinta (17), o ministro Rui Costa deu este recado publicamente.

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Nova pasta entra nas negociações

Sem nomes a tirar, já está consolidado no Planalto —e repassado aos ministérios— que haverá a criação de uma 38ª pasta: o Ministério de Micro e Pequenas Empresas, que acomodaria o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas).

O problema é que, aparentemente, nenhum dos dois partidos demonstraram interesse na iniciativa nem os atuais ministros parecem dispostos a trocar de ministério para "tirar um do zero".

Dobradinha entre Alckmin e França

Outra possibilidade veiculada no Planalto seria entregar Portos e Aeroportos, de Márcio França (PSB), ao Republicanos, depois de ter negado Esportes. Com isso, França poderia assumir o MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), do vice Geraldo Alckmin (PSB), ou fatiá-lo.

Por força do vice, ambas as ideias foram abandonadas. Alckmin demonstrou insatisfação ao deixar o ministério e o PSB, por parte do presidente Carlos Siqueira, passou a fazer pressão publicamente.

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Do lado de França, também há uma razão regional para querer se manter no cargo e rejeitar ir a um novo ministério: em Portos, ele segue influente em seu reduto eleitoral, a Baixada Santista.

Demora usada como cálculo político

Segundo fontes ligadas ao Planalto, há ainda um cálculo político por trás da demora: não parecer que o governo está refém do Congresso. Como Lula já prometeu as pastas aos dois partidos — "acordo no fio do bigode", como gosta de repetir —, ele argumenta não ver pressa para as indicações.

Isso mostra uma intenção do governo em não se mostrar fragilizado tanto em relação à oposição quanto à opinião pública. Segundo interlocutores, é mais uma questão de imagem do que política: segurar as mudanças, mas executá-las, tenta passar a mensagem de que Lula cumpre acordos, só que no seu tempo, não no tempo dos outros.

Janja segura mulheres

Com a negativa inicial da Saúde e, agora, do MDS, o PP passou a vislumbrar Ciência e Tecnologia, de Luciana Santos (PCdoB). Para não perder a aliada, ela poderia ser transferida para o Ministério das Mulheres, de Cida Gonçalves. Mas essa ideia perdeu força pela influência da primeira-dama.

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Lula tem insistido em manter um corpo ministerial com mulheres como marca da gestão e Cida é tida como a ministra mais próxima de Janja. Tirar mais uma mulher para colocar outro homem é visto como inaceitável por ela.

Na prática, já funcionou com a presidência da Caixa, quando o PP trocou sua indicação para a ex-deputada Margarete Coelho após um pedido de Lula.

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