Qual o poder de Lira para emparedar o governo Lula
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), subiu o tom nas críticas aos ministros de Lula. Governistas preveem maior dificuldade para aprovar propostas e a necessidade de o petista entrar em campo. Já líderes do centrão dão força a Lira e planejam mais união.
O que aconteceu
Lira tem nas mãos o comando do que vai para votação na Câmara. O governo quer prioridade nas pautas econômicas e nas que aumentem a arrecadação para fechar as contas públicas sem déficit. Nem tudo isso é de interesse de Lira, contudo.
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O alagoano quer emplacar neste ano os projetos que regulamentam a reforma tributária e a pauta verde. Ambas as agendas também são defendidas pelo governo e não estariam ameaçadas no plenário.
No entanto, Lira também está de olho na reforma administrativa. O tema tem resistência no governo.
A reoneração da folha salarial para 17 setores é outra que tem o caminho complicado. Falta acordo, e Lira deve cobrar alto essa fatura, apesar do bom trânsito com o ministro Fernando Haddad (Fazenda), que tem se empenhado na negociação com líderes parlamentares.
Um sucessor no caminho. Outra dificuldade nessa relação entre Lira e o governo é que sua chefia na Câmara termina no final do ano. Em 2025, a Casa será comandada por outro nome. Lira pressiona para que seu indicado seja o escolhido. A cobrança pública ao governo foi um "gesto de peso" para manter seu grupo unido. No discurso na abertura do ano legislativo, ele fez questão de salientar que isso não seria um tema, mas, desde já, não se fala de outra coisa nos corredores do Congresso.
O temor da perda de poder com o fim do comando na Câmara também endureceu o discurso. Líderes e deputados ouvidos pelo UOL chancelaram essa atitude.
Emendas e as indicações na Esplanada vêm como contrapartidas. Segundo relatos, Lira reforçou aos líderes que saiu em defesa do Parlamento, porque os deputados precisam estar unidos para manter força perante o Executivo. Após o encontro, Lira e colegas do centrão assinaram um requerimento de informação sobre os critérios para liberação de recursos do Ministério da Saúde.
Publicamente, Lira sempre negou querer ter o controle da pasta, atualmente sob a gestão de Nísia Trindade. No entanto, aliados dele reclamam, desde o ano passado, da lentidão no envio de dinheiro às bases eleitorais —esse tipo de coisa "caminhava" no governo de Jair Bolsonaro, apontam.
Ausência de Lula incomodou. Deputados próximos ao presidente ainda citaram que a ausência do presidente, que não enviou nem mesmo seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), para representá-lo na sessão solene de abertura do ano legislativo, mostraram "desprestígio". Rui Costa, ministro da Casa Civil, levou a mensagem de Lula ao Congresso.
Em reunião da bancada do PT, um dia depois do discurso, a fala de Lira esteve entre os assuntos discutidos. A avaliação é que Lira continua com o método de "esticar a corda" para conseguir o que quer.
Há, ainda, um temor sobre as escolhas para as presidências das comissões. A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), tida como a mais importante da Casa, deve ficar com o PL. Por enquanto, o nome mais cotado era o da bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC).
Governistas contavam com a boa vontade de Lira para barrar a indicação e escolher alguém de centro. Se acontecer, a medida seria um "gesto" de Lira ao Planalto, apesar das críticas à gestão palaciana.
No "baixo clero", o desejo é que Lira "banque" o que ameaçou. O grupo, conhecido por deputados que não têm cargos relevantes em comissões nem ocupam cadeiras de lideranças, também reclama da falta de pagamento dos recursos aos municípios.
Governistas torcem para que o líder na Câmara, José Guimarães (PT-CE), consiga emplacar um encontro entre Lira e Lula o mais rápido possível. Mas as agendas de viagens do presidente e o Carnaval podem atrapalhar o calendário. Além disso, acreditam que não tem clima para "discutir a relação".
Como foi a fala de Lira
Lira cobrou "respeito" e "compromisso" do governo. Ele tem criticado Padilha publicamente por ele supostamente não cumprir acordos negociados para a aprovação de propostas no Congresso.
[O destino de emendas] Não é nem pode ser de autoria exclusiva do Poder Executivo. Muito menos de uma burocracia técnica que, apesar do seu preparo, não foi eleita para escolher prioridades da nação e não gasta sola do sapato percorrendo pequenos municípios brasileiros, como nós, parlamentares.
Arthur Lira (PP-AL), em seu discurso
Lira afirmou ainda que os deputados não foram eleitos para ser "carimbadores" e que "o Orçamento é de todos os brasileiros". A crítica vem em meio à disputa com o governo pelo valor integral de R$ 16,6 bilhões para emendas de comissão.
Lula vetou R$ 5,6 bilhões do montante ao sancionar o Orçamento de 2024. Sobraram R$ 11 bilhões para a modalidade. Agora, o governo quer evitar a derrubada do veto e negocia com Lira e líderes do centrão uma maneira de recompor esse caixa.