Coronavírus: diplomata descreve 'alívio' de brasileiros que sairão de Wuhan
"Era uma cidade moderna e viva. Agora é uma cidade fantasma, deserta. O quadro é desolador", diz o diplomata brasileiro João Batista Magalhães sobre Wuhan, na China, onde está para acompanhar o resgate dos brasileiros isolados na cidade, epicentro do surto de coronavírus.
Sem poder tirar a máscara como medida de precaução, ele conversou nesta sexta-feira com a BBC News Brasil por chamada em vídeo, minutos antes de deixar o lobby do hotel para se deslocar ao aeroporto e embarcar com destino ao Brasil, numa operação envolvendo dois aviões da FAB (Força Aérea Brasileira).
"A máscara é obrigatória para todo mundo aqui em Wuhan. Estamos em um hotel onde é permitida a permanência das delegações estrangeiras. A circulação nas ruas é restrita. Além disso, é recomendado que a gente lave as mãos e evite o contato com outras pessoas sem máscara", diz.
Segundo Magalhães, além dos cerca de 30 brasileiros, cinco cidadãos poloneses também estarão no voo "de carona". Isso porque, diz o diplomata, no retorno ao Brasil, as aeronaves VC-2 (Embraer 190) vão fazer a primeira escala em Varsóvia.
Dali, ainda param nas Ilhas Canárias (território espanhol na África Ocidental) e em Fortaleza. O destino final será a Base Aérea de Anápolis, em Goiás, onde todo o grupo vai permanecer em quarentena por 18 dias em um hotel de trânsito das Forças Armadas.
Os aviões da FAB deveriam aterrissar em Wuhan na madrugada de hoje, mas houve um atraso no cronograma "por causa de um aumento no tráfego aéreo asiático, com missões de repatriação de diversos países", informou mais cedo o Ministério da Defesa, em nota.
De acordo com Magalhães, a previsão é que o voo com destino ao Brasil decole ainda na madrugada deste sábado (fim da tarde da sexta-feira no Brasil). A duração de todo o trajeto está estimada em cerca de 30 horas.
Magalhães e outros dois diplomatas brasileiros, que trabalham na embaixada em Pequim, foram mobilizados para coordenar a operação de resgate. Ele conta que o trio teve de dirigir por 16 horas da capital chinesa até Wuhan após receber uma autorização especial do governo daquele país.
Sem essa permissão, ninguém pode entrar ou sair da cidade, explica o diplomata.
"Somos três diplomatas brasileiros lotados na embaixada em Pequim. Viemos de carro. Wuhan está em quarentena. Ninguém pode entrar ou sair. Obtivemos uma autorização especial para vir até aqui. Mas não temos autorização para voltar para Pequim. Tivemos de deixar o carro aqui. Vamos embarcar com os brasileiros e vamos ter de nos submeter à quarentena em Anápolis (Goiás)", explica.
Obstáculos à operação
Segundo ele, a operação transcorreu com tranquilidade, mas não sem alguns obstáculos.
"Houve dificuldade no contato com os brasileiros e em encontrá-los. A chegada até aqui foi complicada, pois tivemos que dirigir o próprio carro. Motoristas chineses não poderiam ir conosco ao Brasil nem voltar para Pequim. Nossa viagem foi feita sob neve. A própria estrada é um cenário desolador. Foram 16 horas cruzando pouquíssimos carros. Quando parávamos para abastecer, os postos estavam todos isolados. As pessoas ficavam isoladas, não tinham contato conosco. Um cenário de fim de mundo", diz.
Questionado sobre o risco da operação, Magalhães diz que está "tomando as devidas precauções".
"Esperamos que nada aconteça. Todo diplomata está pronto para ajudar brasileiros no exterior quando necessário. Faz parte do nosso trabalho. É a nossa missão. Estamos cumprindo a nossa missão. Nessa hora, pensamos nesse apoio à comunidade brasileira no exterior e acreditamos que tudo vai dar certo, que não vamos enfrentar nenhum problema de saúde", diz.
'Aliviados'
"Todos os brasileiros estão calmos e aliviados de poder voltar ao Brasil. Ficaram assustados com o que viram nas últimas semanas, mas todos passam bem de saúde e estão animados com a volta", acrescenta.
Magalhães também falou sobre os procedimentos de segurança tomados para evitar que alguém contaminado com o coronavírus esteja no voo com destino ao Brasil.
"Em todo lugar que entramos aqui, há sempre alguém para medir a temperatura. No aeroporto, isso vai acontecer para poder entrar e embarcar no voo. Os dois aviões estão trazendo equipes médicas do Brasil. Imagino que para avaliar se há algum risco. Mas o que posso antecipar é que todos estão bem de saúde. Ninguém apresentou qualquer indício ou sintoma da doença. Acho que não haverá problema", diz.
Magalhães explica que a embaixada entrou em contato com os cerca de 40 brasileiros que vivem em Wuhan, mas apenas 31 decidiram voltar.
"Foi dada a oportunidade a todos os brasileiros de voltar, mas nove ou dez decidiram permanecer aqui por razões pessoais e profissionais. Vamos continuar monitorando e em contato permanente com eles para se for necessária alguma ajuda adicional nas próximas semanas, estamos à disposição", diz.
Sobre a quarentena a que terá de se submeter, Magalhães diz que "todos os que estão embarcando no voo assinaram um formulário encaminhado pelo Ministério da Saúde em que nos foi informado que teremos de passar por um período de quarentena por 18 dias".
"Nesse período, seremos acompanhados por médicos e passaremos por exames periódicos até que haja a constatação que não representamos risco de transmissão da doença para outros brasileiros. Estaremos isolados na base militar e se algum de nós apresentar sintomas, seremos encaminhados ao hospital", explica.
No domingo (02/02), como a BBC News Brasil antecipou, um grupo de brasileiros fez um apelo em vídeo ao governo de Jair Bolsonaro para retirá-los da China. Todos eram residentes no país.
Na mensagem, publicada no YouTube e datada de 30 de janeiro, eles lembraram as operações de evacuação já feitas por diversos países e disseram estar dispostos a passar pelo período de quarentena fora do território brasileiro.
Inicialmente, Bolsonaro descartou a possibilidade de repatriação dos brasileiros, mas mudou de ideia. Em caráter de urgência, o Congresso Nacional aprovou um projeto de lei enviado pelo governo com regras da quarentena para coronavírus. A operação de resgate pôde ser, então, viabilizada.
Últimos dados
Até a conclusão desta reportagem, a doença já havia infectado mais de 31 mil pessoas na China, com 636 mortes.
Fora da China, outros 270 casos foram confirmados em pelo menos 25 países, com uma morte, nas Filipinas.
Por enquanto, o Brasil não teve nenhum caso confirmado de coronavírus, mas investiga nove casos suspeitos.
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