Varíola dos macacos: o que se sabe sobre infecção que está deixando países em alerta
Autoridades de saúde ao redor do mundo estão em alerta com a disseminação da varíola dos macacos, uma rara infecção viral que ocorre principalmente na África Ocidental e Central.
Grã-Bretanha, Portugal, Espanha, Estados Unidos e Canadá estão entre os países com casos suspeitos ou já identificados.
A Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido (UKHSA, na sigla em inglês) detectou 2 novos casos da doença, um em Londres e outro no sudeste da Inglaterra, elevando o total para nove desde 6 de maio, quando o surto foi inicialmente notificado.
Cinco casos também foram confirmados em Portugal e mais de 20 estão sendo analisados na Espanha. Nos Estados Unidos, um caso foi confirmado no Estado de Massachusetts em um homem que recentemente viajou ao Canadá, mas ainda não se sabe se ele está ligado ao surto na Europa.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os casos mais recentes foram notificados predominantemente em gays, bissexuais ou homens que fazem sexo com homens (HSH).
Em Portugal, por exemplo, todos os casos confirmados são em homens, principalmente jovens.
Mas os Centros dos EUA para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) enfatizaram em um comunicado que "qualquer pessoa, independentemente da orientação sexual, pode espalhar a varíola dos macacos por contato com fluidos corporais, lesões ou itens compartilhados (como roupas e roupas de cama) contaminados".
Por que o surto está deixando autoridades em alerta?
Os surtos estão despertando alarme porque a doença viral, que se espalha por contato próximo e foi identificada pela primeira vez em macacos, ocorre principalmente na África Ocidental e Central, e apenas ocasionalmente se espalha em outros lugares.
"Historicamente, houve muito poucos casos exportados. Isso só aconteceu oito vezes no passado antes deste ano", disse à agência de notícias Reuters Jimmy Whitworth, professor de saúde pública internacional da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, descrevendo o surto como "altamente incomum".
A disseminação da doença dessa vez intriga especialistas, porque vários casos no Reino Unido não têm conexão conhecida entre si, levantando preocupações de que a infecção foi contraída por transmissão comunitária. Apenas o primeiro caso notificado em 6 de maio viajou recentemente para a Nigéria.
O vírus se espalha através de contato próximo e a UKHSA está aconselhando os indivíduos, particularmente aqueles que são gays, bissexuais ou HSH, a ficarem alertas a quaisquer erupções ou lesões incomuns em qualquer parte do corpo, especialmente na genitália, e entrar em contato com um serviço de saúde sexual em caso de preocupação.
A varíola dos macacos nunca foi descrita anteriormente como uma infecção sexualmente transmissível, embora possa ser transmitida por contato direto durante o sexo.
A maioria das pessoas se recupera em poucas semanas.
"A UKHSA está trabalhando em estreita colaboração com o NHS e outras partes interessadas para investigar com urgência onde e como os casos recentes de varíola dos macacos foram adquiridos, incluindo como eles podem estar ligados uns aos outros".
"O vírus geralmente não se espalha facilmente entre as pessoas. O risco para a população do Reino Unido permanece baixo".
"Esses casos mais recentes, juntamente com relatos de casos em países da Europa, confirmam nossas preocupações iniciais de que possa haver disseminação da varíola dos macacos em nossas comunidades", disse Susan Hopkins, consultora médica chefe da UKHSA.
"A UKHSA identificou casos rapidamente até agora e continuamos investigando rapidamente a fonte dessas infecções e aumentando a conscientização entre os profissionais de saúde", acrescentou.
"Estamos particularmente pedindo a homens gays e bissexuais que estejam cientes de quaisquer erupções ou lesões incomuns e entrem em contato com um serviço de saúde sexual sem demora se tiverem preocupações. Entre em contato com as clínicas antes de sua visita".
O que é a varíola dos macacos e quais são seus sintomas?
A varíola dos macacos é uma parente da varíola, doença que foi erradicada em 1980, mas menos transmissível, causa sintomas mais leves e é menos mortal.
Ela geralmente dura de duas a quatro semanas e os sintomas podem aparecer de cinco a 21 dias após a infecção.
Os sintomas da varíola dos macacos geralmente começam com uma mistura de febre, dores de cabeça, dores musculares, dores nas costas, calafrios, exaustão e linfonodos inchados.
Este último sintoma é normalmente o que ajuda os médicos a distinguir a varíola dos macacos da catapora ou da varíola, segundo a OMS.
Passada a febre, pode surgir uma erupção cutânea, que tende a se desenvolver de um a três dias depois, geralmente começando no rosto e depois se espalhando para outras partes do corpo, incluindo os órgãos genitais.
O número de lesões pode variar de algumas a milhares.
A erupção muda e passa por diferentes estágios, e pode parecer catapora ou sífilis, antes de finalmente formar uma crosta, que depois cai.
Por que se chama varíola dos macacos?
O vírus da varíola dos macacos pertence ao gênero Orthopoxvirus da família Poxviridae. Foi descoberto pela primeira vez em 1958, quando dois surtos de uma doença semelhante à varíola ocorreram em macacos de laboratório mantidos para pesquisa, daí seu nome.
Mas os macacos podem não ser os culpados, e o hospedeiro natural da varíola dos macacos permanece desconhecido, embora a OMS diga que os roedores são os mais prováveis.
"Na África, evidências de infecção pelo vírus da varíola dos macacos foram encontradas em muitos animais, incluindo esquilos de corda, esquilos de árvore, ratos caçados na Gâmbia, arganazes e diferentes espécies de macacos", diz a OMS.
Há duas cepas principais: a cepa do Congo, que é a mais grave —com até 10% de mortalidade— e a cepa da África Ocidental, que tem uma taxa de mortalidade em cerca de 1% dos casos. Os casos do Reino Unido foram notificados como pertencentes à cepa da África Ocidental.
Onde a varíola dos macacos é normalmente encontrada?
A varíola dos macacos humana causa principalmente surtos nas regiões de floresta tropical da África Central e Ocidental e normalmente não é observada na Europa.
A República Democrática do Congo (RDC) teve o primeiro caso humano registrado de varíola dos macacos em 1970.
Desde então, foram registrados casos em 11 países africanos: Benin, Camarões, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Gabão, Costa do Marfim, Libéria, Nigéria, República do Congo, Serra Leoa e Sudão do Sul.
O primeiro surto de varíola dos macacos notificado fora da África estava ligado à importação de mamíferos infectados em 2003 nos Estados Unidos, segundo o CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças).
Mais recentemente, em 2018 e 2019, dois viajantes do Reino Unido, um de Israel e um de Cingapura, todos com histórico de viagens à Nigéria, foram diagnosticados com a doença após um grande surto no país, segundo a agência de saúde da Europa, o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC, na sigla em inglês).
Como a varíola dos macacos é transmitida?
É possível contrair o vírus por meio da mordida ou arranhão de um animal infectado, comendo carne de caça, estando em contato direto com um humano infectado ou tocando roupas de cama ou roupas contaminadas.
O vírus entra no corpo através de lesões na pele, no trato respiratório ou nas membranas mucosas (olhos, nariz ou boca).
Acredita-se que a transmissão entre humanos ocorra principalmente por meio de grandes gotículas respiratórias, que geralmente não podem viajar mais do que alguns metros, portanto, seria necessário um contato pessoal prolongado.
"Os casos recentes sugerem um meio potencialmente novo de disseminação", disse Neil Mabbott, especialista em doenças da Universidade de Edimburgo, na Escócia, à agência de notícias AP.
Keith Neal, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Nottingham, na Inglaterra, aventou a possibilidade de que a transmissão pode não ocorrer por meio do sexo, mas apenas "o contato próximo associado à relação sexual".
Devo me preocupar?
A varíola dos macacos "geralmente é uma doença leve e autolimitada e a maioria das pessoas se recupera em algumas semanas", disse a UKHSA em seu comunicado.
"É importante enfatizar que a varíola dos macacos não se espalha facilmente entre as pessoas e o risco geral para o público em geral é muito baixo", disse Colin Brown, diretor de infecções clínicas e emergentes da agência de saúde britânica.
A mortalidade é maior entre crianças e adultos jovens, e indivíduos imunocomprometidos estão especialmente em risco de desenvolver a forma mais grave da doença.
A varíola dos macacos durante a gravidez também pode levar a complicações como varíola congênita ou natimorto, alertou a OMS na segunda-feira (16/5).
"Casos mais leves de varíola podem passar despercebidos e representar um risco de transmissão de pessoa para pessoa", afirmou a agência da ONU em comunicado.
Existe tratamento? Qual é a melhor forma de se prevenir?
Atualmente, não há tratamento específico recomendado para a varíola dos macacos e geralmente ela desaparece por conta própria.
Desinfetantes domésticos comuns podem matar o vírus da varíola dos macacos, segundo o CDC.
Acredita-se que a vacinação contra a varíola seja altamente eficaz na prevenção da varíola dos macacos, mas como a varíola foi declarada erradicada há mais de 40 anos, as vacinas contra a varíola de primeira geração não estão mais disponíveis para o público em geral.
Uma vacina mais recente desenvolvida pela Bavarian Nordic para a prevenção da varíola e da varíola dos macacos foi aprovada na União Europeia, Estados Unidos e Canadá (sob os nomes comerciais Imvanex, Jynneos e Imvamune), e antivirais também estão em desenvolvimento.
Por que agora?
Um cenário possível por trás do aumento de casos é o aumento das viagens à medida que as restrições da covid-19 são suspensas.
"Minha teoria de trabalho seria que há muito disso na África Ocidental e Central, as viagens foram retomadas e é por isso que estamos vendo mais casos", disse Whitworth à Reuters.
Anne Rimoin, professora de Epidemiologia da UCLA, na Califórnia, lembrou à Reuters que, como a varíola foi erradicada, o encerramento das campanhas de vacinação levou a um salto nos casos da doença em áreas onde a doença é endêmica.
Ela acrescentou que a investigação urgente dos novos casos é importante, pois "eles podem sugerir um novo meio de propagação ou uma mudança no vírus, mas tudo isso deve ser determinado".
Especialistas pediram que as pessoas não entrem em pânico.
"Isso não causará uma epidemia nacional como a covid, mas é um surto sério de uma doença grave —e devemos levar isso a sério", concluiu Whitworth.
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